quarta-feira, 21 de março de 2012

Poesia - divina música da alma!

Hoje comemora-se a Poesia - a divina música da alma!

Não haverá melhor forma de passar este dia senão na companhia de um bom livro de poesia. Escolhê-lo é que não foi fácil, pois para uma leitora compulsiva de poesia, parecia-me algo impossível: "Que poeta? E que livro?"

Estas duvidas pareciam incontornáveis, mas quando alguém hoje me colocou a questão: "Filipa, quem vais ler hoje?" - respondi celeremente: "Ruy Belo!". O meu interlocutor surpreendeu-se e questionou-me: "Porquê, Belo?", ao que retorqui: "Porque... sim!". Fui repreendida com a sua exclamação: "Isso não é resposta!", ao que apenas murmurei: "E porque não?!"

Emprego e Desemprego do Poeta

"Deixai que em suas mãos cresça o poema
como o som do avião no céu sem nuvens
ou no surdo verão as manhãs de domingo
Não lhe digais que é mão-de-obra a mais
que o tempo não está para a poesia

Publicar versos em jornais que tiram milhares
talvez até alguns milhões de exemplares
haverá coisa que se lhe compare?
Grandes mulheres como semiramis
públia hortênsia de castro ou vitória colonna
todas aquelas que mais íntimo morreram
não fizeram tanto por se imortalizar

Oh que agradável não é ver um poeta em exercício
chegar mesmo a fazer versos a pedido
versos que ao lê-los o mais arguto crítico em vão procuraria
quem evitasse a guerra maiúsculas-minúsculas melhor
Bem mais do que a harmonia entre os irmãos
o poeta em exercício é como azeite precioso derramado
na cabeça e na barba de aarão

Chorai profissionais da caridade
pelo pobre poeta aposentado
que já nem sabe onde ir buscar os versos
Abandonado pela poesia
oh como são compridos para ele os dias
nem mesmo sabe aonde pôr as mãos"

Ruy Belo, in "Aquele Grande Rio Eufrates"

Poeta e ensaísta português ( 1933-1977), natural de São João da Ribeira, Rio Maior.

Licenciou-se em Filologia Romana e em Direito pela Universidade de Lisboa. Entra para a Opus Dei; que abandonará mais tarde. Em 1971, vai para Madrid como Leitor de Português, de onde regressa em 1976 para se tornar professor do ensino secundário no ano que antecede a sua morte.




Foi chefe da redacção da revista Rumo. Ruy Belo traz à poesia portuguesa uma respiração rítmica que, mais do que da inspiração bíblica (a forma do salmo ou do versículo), visível no seu primeiro livro e, subterraneamente, nos seguintes, lhe vem do pano de fundo «filosófico» à luz do qual se projecta o universo imaginário do poeta. Não se trata de filosofia no sentido abstracto, teórico, do termo, mas na linha de uma fenomenologia que determina a passagem de cada dado particular de existência, culminando com o próprio facto da condição humana do poeta – que desse modo se vai expor até ao limite «dramático», ou trágico, da sua vida –, a sintoma de um absoluto que as palavras procuram traduzir. Daqui decorre que tanto se possa falar do jogo do pião, de heróis do efémero real (José Maria Nicolau, Marilyn Monroe) ou mítico (Billy the Kid), como de pintura, da passagem das estações, do amor e da morte. Todos estes temas são, finalmente, a expressão de um relacionamento único, na sua natureza, do poeta com o tempo e com a linguagem que o procura exorcizar, no que ele tem de relativo, conferindo ao ser essa duração – e dureza – da pedra (da estátua) susceptível de um desafio ao destino, emblematizado, entre outros, no exemplo de Pedro e Inês de A Margem da Alegria.

E são certamente a mesma sensibilidade e a mesma consciência poética que lhe informam os ensaios, também eles preferencialmente dedicados à poesia. Autor de traduções no âmbito da História - Marc Ferro e H.-I. Marrou – e de traduções literárias, designadamente obras de Saint-Exupéry, Federico García Lorca e Blaise Cendrars, prefaciou Pelo Sonho É Que Vamos, de Sebastião da Gama.

Colaborou em várias publicações periódicas, nomeadamente em O Tempo e o Modo e Ocidente.
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. VI, Lisboa, 1999

Hoje é também o Dia Mundial da Árvore e, para comemorá-lo num blogue dedicado à leitura, deixo aqui este poema visual , também de Ruy Belo


"Para mim, o maior poeta dos anos 60 (e não só) é Ruy Belo, e mais tarde ou mais cedo a imagem histórica desta época será revista em função de uma axiologia menos comprometida com as partes interessadas, porque o que marca cada época, no futuro, são os seus maiores vultos."

in Arquivo Digital de Literatura Experimental, A Poesia Experimental Portuguesa

Entrevista a Luís Adriano Carlos (Poeta, Professor da Faculdade de Letras da Universidade do Porto), por Raquel Monteiro (bolseira de Investigação do projecto)
Poesia nova (ensaio), 1961
Boca bilingue, 1966 ; 1997
Homem de palavra(s), 1969 ; 1997
Na senda da poesia (ensaio), 1969 ; 2002
País possível, 1973 ; 1998
Transporte no tempo, 1973 ; 1997
A margem da alegria, 1974 ; 2004
Toda a terra, 1976 ; 2000
Obra poética , 1981 ; 1984
Poemas, 1993
Todos os poemas, 2000 ; 2004

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