sábado, 4 de janeiro de 2014

Ciclo Pessoa: «Fúria nas Trevas o Vento»

Fúria nas Trevas o Vento

Fúria nas trevas o vento
Num grande som de alongar,
Não há no meu pensamento
Senão não poder parar.

Parece que a alma tem
Treva onde sopre a crescer
Uma loucura que vem
De querer compreender.

Raiva nas trevas o vento
Sem se poder libertar.
Estou preso ao meu pensamento
Como o vento preso ao ar.


*Fernando Pessoa, in Cancioneiro

Tiago na toca e os Poetas: Afonso Lopes Vieira e Tiago Bettencourt


Saudades eu não as quero

Bateram fui abrir era a saudade
vinha para falar-me a teu respeito
entrou com um sorriso de maldade
depois sentou-se à beira do meu leito
e quis que eu lhe contasse só a metade
das dores que trago dentro do meu peito

Não mandes mais esta saudade
ouve os meus ais por caridade
ou eu então deixo esfriar esta paixão
amor podes mandar se for sincero
saudades isso não pois não as quero

Bateram novamente era o ciúme
e eu mal me apercebi de que batera
trazia o mesmo ódio do costume
e todas as intrigas que lhe deram
e vinha sem um pranto ou um queixume
saber o que as saudades me fizeram

Não mandes mais esta saudade,
ouve os meus ais por caridade,
ou eu então deixo esfriar esta paixão,
amor podes mandar se for sincero,
saudades isso não pois não as quero

*Afonso Lopes Vieira


MANIFESTO:

[...são os poetas que me fizeram começar a escrever. Eram no fundo os livros que tinha lá em casa e versões de fados que oiço desde que comecei a ouvir fado.Fui lendo o que tinha lá por casa. Fui roubar uns livros à biblioteca do meu pai. E depois fui marcando nos livros os vários poemas que gostava até ficarem dez. Depois mais duas ou três versões...] (Tiago Bettencourt).
NOTA: As receitas da venda do disco revertem para a associação solidária "Ajuda-me a Ajudar", por tal,se gostam,comprem o disco...

Jordan Belfort é «O lobo de Wall Street» - dia 9 nos cinemas


Esta é a autobiografia de Jordan Belfort, o jovem corretor de Wall Street que nos anos 90 se sobrepôs à lógica da economia, manipulou o mercado bolsista e ganhou uma fortuna incalculável. Uma história verídica e fulgurante, escrita num registo confessional mas com muito humor, onde Belfort relata ao pormenor a sua ascensão prodigiosa e a inevitável queda. Ganhou largas dezenas de milhões de dólares, mas o seu estilo de vida absurdamente megalómano levava-o a gastar à noite os milhares que ganhava de dia. Chamavam-lhe «O Lobo de Wall Street», e a própria máfia colocou operacionais na sua empresa para aprenderem com os seus métodos. Uma leitura atual e aliciante, que nos dá a conhecer os meandros do universo da bolsa nova-iorquina, agora adaptada ao cinema pelo realizador Martin Scorsese, com Leonardo Di Capprio como protagonista.

O Lobo de Wall Street é a história verídica da ascensão e queda de um dos mais polémicos e mediáticos corretores da bolsa de Nova Iorque.


*Compre o livro no site da Editorial Presença: O lobo de Wall Street

O Bicho, poema de Manuel Bandeira

O Bicho 
Manuel Bandeira


VI ONTEM um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.




sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Final de tarde com Manuel António Pina «A mensagem do teu»

A mensagem do teu lábio superior
salta bip o parapeito que nos separa
e habita urgentemente nos meus olhos
e repetidamente e urgentemente convoca os meus olhos
para a saudade publicada na tua cara
com slogans de néon interior

Sei que sabes uma palavra indecente
e que tens vergonha dela como se essa palavra fosse
a tua roupa de dentro

Sei o que pensas sei o que fazes
sei coisas que tu mesma não sabes
Sabes, por exemplo, que estás noiva? E que o malandrim
afinal de contas é sargento de infantaria?
Mas deixa lá, homens é o que há mais
E (sabes?) os oficiais

O morse lábio bip bip noticia:
ATENÇÃO, ATENÇÃO, ESTOU QUASE SOZINHA
E sei pormenores da tua respiração
concretos, fotografias

in Todas as Palavras


Ciclo Pessoa: «É Brando o Dia, Brando o Vento»

É Brando o Dia, Brando o Vento

É brando o dia, brando o vento
É brando o sol e brando o céu.
Assim fosse meu pensamento!
Assim fosse eu, assim fosse eu!

Mas entre mim e as brandas glórias
Deste céu limpo e este ar sem mim
Intervêm sonhos e memórias...
Ser eu assim ser eu assim!

Ah, o mundo é quanto nós trazemos.
Existe tudo porque existo.
Há porque vemos.
E tudo é isto, tudo é isto! 

*Fernando Pessoa, in Cancioneiro


Snobidando: regresso de Sharon Olds

Acompanhe a página da Livraria Snob no Facebook. Abre brevemente, em Guimarães. Pode lá encontrar este e muitos outros textos.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Ciclo Pessoa: «Feliz Dia para Quem É»

Feliz Dia para Quem É

Feliz dia para quem é
O igual do dia,
E no exterior azul que vê
Simples confia!

Azul do céu faz pena a quem
Não pode ser
Na alma um azul do céu também
Com que viver

Ah, e se o verde com que estão
Os montes quedos
Pudesse haver no coração
E em seus segredos!

Mas vejo quem devia estar
Igual do dia
Insciente e sem querer passar.
Ah, a ironia

De só sentir a terra e o céu
Tão belo ser
Quem de si sente que perdeu
A alma p’ra os ter!


*Fernando Pessoa, in Cancioneiro

ALA ...que é poesia IV

Na minha aventura pela recolha dos poemas de António Lobo Antunes cruzei-me com a Kátia Guerreiro. Conhecem-na? Pois ela pegou neste poema de ALA - "Valsa" - e canta-o aqui sobre um fado tradicional, o Fado Margaridas. 
Fica absolutamente perfeito. ALA ... que é poesia.

Ana Almeida



Valsa

Ficámos finalmente, meu amor
Na praia dos lençois, amarrotada
O mal que venha sempre, é um mar menor
... Sorriso de vazante na almofada

Se chamo som das ondas ao rumor
Dos passos dos vizinhos, pela escada
É porque á noite, acordo de terror
De me encontrar sem ti de madrugada

Qual a côr desta noite e de que medos
São feitas essas mãos que não me dás
Ó meu amor... a noite tem segredos
Que dizem coisas que não sou capaz


António Lobo Antunes

* para ver este video siga o link
http://www.youtube.com/watch?v=YbenXLa47WI

a-ver-livros: à chuva com L.C. Neill

Chove lá fora
e tenho a mala feita para partir
meia dúzia de livros
um coração à estreia
e uma sede de estrada
que dói

Chove cá dentro
e vou-me
mesmo que não volte
antes que o sol expluda
em mil lembranças
do futuro

Ana Almeida

* para saber mais sobre a pintora americana L.C. Neill
siga o link www.lcneill.com

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

mini-poema em jeito de Bom Ano

Chove, e
é tão bom ter a alma vazia pela manhã
para que nada se tenha a lavar.



Marcos Foz

ALA ... que é poesia III

Fiquei ontem com a ideia nos nomes - e Lobo Antunes tem outro poema sobre eles. Escolho-o para estrear o ano novo.

Chama-se "Os Nomes do Amor" e é Vitorino mais uma vez quem canta estas letras, numa versão afadistada. O teu nome está lá?


Ana Almeida




Os Nomes do Amor

Nome de Joana é prece
nome de Rita é paixão
digo Teresa se anoitece
e Ana quando acontece
prender a lua na mão

Patrícia se é noite alta
Isabel quando é mar chão
Francisca quando me falta
a fadista que me mata
nome de Rita é paixão

Filipa se a espuma tece
lençol que as águas me dão
meu amor quando escurece
nome de Joana é prece
nome de Rita é paixão


António Lobo Antunes

para ver o video siga o link
http://www.youtube.com/watch?v=rm9JX1k2u1s



As estantes vaca


Estas e outras estantes para conhecer no blog househoneys.com

Ciclo Pessoa: «Dizem?»

Pintura a óleo: Jacob Porat


Dizem?

Dizem?
Esquecem.
Não dizem?
Disseram.

Fazem?
Fatal.
Não fazem?
Igual.

Por quê
Esperar?
Tudo é
Sonhar.

*Fernando Pessoa, in Cancioneiro

Pensamentos de Mariene Hildebrando - ANO NOVO VIDA???

ANO NOVO VIDA???

 A que queremos para nós!

Essa é uma das frases mais ouvidas quando se aproxima o final de ano. Alguns podem pensar que isso é lugar comum, é chavão, e nada muda. Tudo permanece do mesmo jeito. Acredito que não é assim. Acho que o simbolismo de terminar um ano e começar outro, nos dá a esperança de que podemos fazer diferente, podemos mudar coisas que não gostamos em nós ou nas nossas vidas. É mais um rito de passagem que faz parte da nossa vida e nos estimula a querer mudar. Vamos atrás desse raio de esperança que surge  iluminado por novos sonhos e quereres.

 Encerrar ciclos, começar outros, novas amizades, novos amores, quem sabe um novo trabalho, uma viagem há muito sonhada, uma mudança na carreira, um novo curso, um trabalho voluntário, percorrer novos caminhos, se abrir para o novo. É tudo muito mental, está na nossa cabeça. São as nossas esperanças renascendo. Queremos uma vida melhor para nós e para aqueles que amamos, queremos um mundo melhor para todos. Fazemos um balanço do que temos feito até agora e, principalmente, revisamos tudo que nos aconteceu no ano que finda. Às vezes tentamos achar culpados pelo que de ruim nos aconteceu ou por aquilo que não realizamos, isso é desgastante e não leva a lugar algum.. Quando é para ser é!

O universo trabalha assim, cabe a nós descobrirmos se estamos no rumo certo, se estamos seguindo o fluxo da vida. Quando isso não acontece, sofremos, as coisas se tornam mais difíceis, normalmente não percebemos que estamos a dificultar a nossa vida. Ao contrário, quando facilitamos o curso da vida, as coisas acontecem. Então, fazer promessas de ano novo é bom, renovam as nossas esperanças de fazer melhor, de querer ser melhor, de traçar novos projetos de vida, ou então continuar e melhorar o que está bom.


 Uma coisa é certa, temos que focar e mentalizar o que queremos, nos encher de pensamentos positivos, pensamentos bons, para nós e para a humanidade. Temos que nos abrir para atrairmos aquilo que mais desejamos.         É inevitável que nessa época do ano a gente faça uma reflexão do ano que passou, não é que uma virada no calendário vá mudar alguma coisa, literalmente falando, mas simbolicamente, pode me influenciar para que eu repense algumas coisas.. O tempo é imutável, quem faz as coisas acontecerem somos nós, com nossos desejos e vontades. Não vamos ser mais felizes apenas porque entramos em um novo ano, isso vai depender das nossas atitudes, da nossa vontade em querer mudar. Não dependemos de rituais, mas se você acha que eles podem ajudar nessa sua decisão de mudar, então vá lá, que seja!  Pule as sete ondas, coma lentilha em cima da cadeira, 12 grãos de uva, sementes de romã, carne de porco,  entre de branco, use as cores dos orixás do ano (Xangô e Iansã em 2014) que vai iniciar, tome champagne para brindar a vida e as resoluções que você tomou, mal não vai fazer, e ainda pode servir de incentivo para que você abandone de vez velhos hábitos que já não fazem mais sentido, pessoas que já não acrescentam nada, atitudes negativas, pensamentos e crenças que já não correspondem ao que você é. Deixe a sua vida mais colorida, use e abuse da ousadia, se arrisque mais, se preocupe menos com a opinião dos outros, pratique a compaixão, comece aquele curso, faça a dieta,  vá fazer aquela viagem tão sonhada, AME mais, e diga EU TE AMO mais vezes.

Nós é que temos que mudar, a mudança  no calendário serve como uma mola propulsora, que nos impulsiona e nos faz ir adiante. É um processo simbólico, que nos enche de esperança  renovada na vida, recomeçar, reciclar. Sem dúvida as festas de ano novo mexem com a gente, nos deixam emotivos e sensíveis, e num minuto fugaz, a meia noite do último dia do ano, nossos corações  se inundam com pensamentos de paz e amor, e com um abraço fraterno desejamos a todos um FELIZ ANO NOVO, e essa onda de amor se espalha pelo universo. Com certeza o primeiro dia do ano se torna mais especial por conta disso. Então desejo a todos vocês que nos acompanham que  sejam felizes. Que seja um ano repleto de paz, amor, saúde muita luz e prosperidade para todos nós. Ahhh... e força de vontade para realizarmos os nossos sonhos !

FELIZ ANO NOVO!

Mariene Hildebrando

Email: marihfreitas@hotmail.com

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

ALA ...que é poesia II



O poema tem o meu nome e não é para mim. Pena, porque é lindo.
Cruzei-me talvez duas ou três vezes com António Lobo Antunes, creio até que sempre nas feiras do livro. Olhei-o, troquei talvez duas meias palavras. Sei que uma vez o vi sorrir. Nunca o entrevistei, creio que não calhou. Talvez um dia. Talvez não.

É assim que continua a aventura de juntar aqui todos os poemas de ALA, que andam dispersos por aí, em discos. Principalmente em discos. Como este "Ana", a que Vitorino dá música no disco "Eu Que Me Comovo Por Tudo e Por Nada". É dedicado a Jorge de Sena. Porquê não sei. Sabem? Afinal, a mulher da vida de Sena chamava-se Mécia.

É com ele que atravessamos a noite longa entre 2013 e 2014. Que a vossa travessia seja doce. Encontramos-nos amanhã, do lado de lá. 

Ana Almeida

 
Ana (dedicado a Jorge de Sena)

O mar não é tão fundo que me tire a vida
Nem há tão larga rua que me leve a morte
Sabe-me a boca ao sal da despedida
Meu lenço de gaivota ao vento norte
Meus lábios de água, meu limão de amor
Meu corpo de pinhal à ventania
Meu cedro à lua, minha acácia em flor
Minha laranja a arder na noite fria


António Lobo Antunes

Para verem o video sigam o link
http://www.youtube.com/watch?v=Vy3tktctOPQ

Bom ano, amigos

JORGE LUIS BORGES FIM DE ANO
Nem o pormenor simbólico de substituir um dois por um três nem essa vã metáfora que convoca um lapso que morre e outro que surge, nem o cumprimento de um processo astronómico atordoam ou minam o planalto desta noite e obrigam-nos a esperar as doze irreparáveis badaladas, A causa verdadeira é a suspeita geral e confusa do enigma do Tempo; é o assombro em face do milagre de que apesar de todos os acasos, de que apesar de sermos as gotas do rio de Heraclito, perdure em nós alguma coisa: imóvel, alguma coisa que não encontrou o que procurava.

*Obrigado Ana Ribeiro

Ciclo Pessoa: «Dorme Sobre o Meu Seio»

Caricatura: Hugo Enio Braz

Dorme Sobre o Meu Seio

Dorme sobre o meu seio,
Sonhando de sonhar...
No teu olhar eu leio
Um lúbrico vagar.
Dorme no sonho de existir
E na ilusão de amar.

Tudo é nada, e tudo
Um sonho finge ser.
O ‘spaço negro é mudo.
Dorme, e, ao adormecer,
Saibas do coração sorrir
Sorrisos de esquecer.

Dorme sobre o meu seio,
Sem mágoa nem amor...

No teu olhar eu leio
O íntimo torpor
De quem conhece o nada-ser
De vida e gozo e dor.


*Fernando Pessoa, in Cancioneiro

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Ciclo Pessoa: «Grandes Mistérios Habitam»


Grandes Mistérios Habitam

Grandes mistérios habitam
O limiar do meu ser,
O limiar onde hesitam
Grandes pássaros que fitam
Meu transpor tardo de os ver.

São aves cheias de abismo,
Como nos sonhos as há.
Hesito se sondo e cismo,
E à minha alma é cataclismo
O limiar onde está.

Então desperto do sonho
E sou alegre da luz,
Inda que em dia tristonho;
Porque o limiar é medonho
E todo passo é uma cruz.


*Fernando Pessoa, in Cancioneiro

ALA... que é poesia I

Não é que eu ame António Lobo Antunes acima de qualquer outro. Não é isso. Longe disso. É apenas que o redescubro a cada esquina, ora numa crónica que podia ser poema, ora num poema que alguém cantou. Sim, poesia. 

Que ALA também é poesia - embora nem um livro para o provar.

Há dias em que diria que ele é apenas poesia. Dura, cheia de esquinas e calçadas íngremes, horas de chuva e uma nesga de sol, folhas caídas de um plátano longevo e um cardo.

Decidi juntar aqui - sob o lema ALA ... que é poesia - os poemas que andam espalhados e cantados por aí por nomes como Vitorino, Carlos do Carmo e Cristina Branco.. De alguns só encontrei letras e nada de vídeos. Uma aventura de recolha que só 2014 saberá onde me vai levar. Um bom projecto para começar o novo ano, não acham?

Ana Almeida

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Para começar, o Bolero do Coronel Sensível Que Fez Amor em Monsanto.
Vitorino gravou-o em 1992 no disco "Eu Que Me Comovo Por Tudo e Por Nada". Mas destaco aqui uma versão mais recente, uma cover da banda A Naifa, surgida agora em Novembro último, no disco "As Canções d'A Naifa". Disponível fica ainda uma outra versão, pela banda Boitezuleika.

Bolero do Coronel Sensível Que Fez Amor em Monsanto

"Eu que me comovo
Por tudo e por nada
Deixei-te parada
Na berma da estrada
Usei o teu corpo
Paguei o teu preço
Esqueci o teu nome
Limpei-me com o lenço
Olhei-te a cintura
De pé no alcatrão
Levantei-te as saias
Deitei-te no banco
Num bosque de faias
De mala na mão
Nem sequer falaste
Nem sequer beijaste
Nem sequer gemeste,
Mordeste, abraçaste
Quinhentos escudos
Foi o que disseste
Tinhas quinze anos
Dezasseis, dezassete
Cheiravas a mato
À sopa dos pobres
A infância sem quarto
A suor, a chiclete
Saíste do carro
Alisando a blusa
Espiei da janela
Rosto de aguarela
Coxa em semifusa
Soltei o travão
Voltei para casa
De chaves na mão
Sobrancelha em asa
Disse: fiz serão
Ao filho e à mulher
Repeti a fruta
Acabei a ceia
Larguei o talher
Estendi-me na cama
De ouvido à escuta
E perna cruzada
Que de olhos em chama
Só tinha na ideia
Teu corpo parado
Na berma da estrada
Eu que me comovo
Por tudo e por nada
"

António Lobo Antunes



Para ver este video siga o link http://www.youtube.com/watch?v=fnkLU5f9cSU



Missa Erudita - Marcos Foz

Dita a missa o padre em latim
os abecedarianos acenam que sim,
contentes por não assimilarem enfim,
uma única afirmação da oração.

Ouvidos que não escutam
são mais amigos da canção
dos que entendem e sofrem perigo
que na sua fé haja circuncisão.

Engarrafam-se palavras vis,
atiram-se às águas sagradas de superior sapiência
purificadora e dotada de paciência
característica singular dos deuses.

Exércitos atravessam rios a pé
com as águas acima do joelho,
sem calma aparente ou ponderado conselho
atiram no fedelho e seu evangelho,
que sangra.

Na guerra de nada vale música ou poesia
a memória recalca a heresia,
só sabem os dedos o sabor monstruoso
de premir e suprimir
a condição do ser,
independentemente do que se era.

O padre que mude de idioma
para aquando do anúncio de infortúnio,
haja menos passeios matinais.

*Marcos Foz


a-ver-livros: som, silêncio e Meghan Stratman

Há um pássaro 
que estala 
na manhã fria
não sabe outro cantar
há um homem
que espera a morte
em silêncio
dentro de um carro parado
falta-lhe a voz
para apressar a ida
para junto dos que ama

Ana Almeida

* para saber mais sobre a ilustradora americana Meghan Stratman
siga o link http://bunnypirates.carbonmade.com/

domingo, 29 de dezembro de 2013

Visita ao mundo do Nobel da literatura, Churchill

Como sabem, Winston Churchill ganhou o prémio Nobel da literatura, corria o ano de 1953.

Londres tem vários museus de guerra e o Churchill War Rooms foi alvo de uma das minhas visitas. Além das salas onde o governo reunia durante a II Grande Guerra, os quartos dos ministros, as salas de comunicação e estratégia... o museu dedica o seu espaço à figura de Churchill.

Podemos ver algumas das suas pinturas, retratos de quando era criança, vários discursos e viagens, os principais marcos históricos do líder, entre tantos outros aspectos. E, claro está, uma secção com os livros que produziu, com destaque óbvio para as suas Memórias da II Guerra Mundial.

As fotografias não são as melhores, mas abro-vos o apetite com os livros e as frases que me ficaram. Espero que gostem!








Rodrigo Ferrão