Foto: Sebastião Cappelle
"Tive a grande honra de ser convidada pelo “poeta” para apresentar o seu
livro. O que com todo o gosto o faço, não só porque fiquei fascinada com os
seus poemas quando os li, como por ser dedicado à memória do nosso querido avô
Vitorino, que foi uma pessoa espectacular, médico de clínica geral e pai de 10
filhos, com quem o Rodrigo teve a sorte de conviver muito mais tempo do que eu.
O nosso avô morreu em 2002, quando eu tinha 10 anos e o Rodrigo 19, e as
memórias que tenho dele, não sendo tão claras como as do Rodrigo (por força das
circunstâncias), foram totalmente reavivadas no poema dedicado ao nosso avô,
que está escrito de forma tão pormenorizada.
Dos 10 filhos vieram 23
netos e portanto, no meio de tantos primos, e dado que o Rodrigo e eu temos 9
anos de diferença de idade, quando era mais nova não costumava estar tanto com
ele. Enquanto eu ainda brincava às casinhas (por exemplo), o Rodrigo já fazia
viagens e escrevia crónicas. Só nos últimos anos, em que a diferença de idades
começou a ser mais irrelevante, é que o comecei a conhecer melhor. E agora as
visitas a casa um do outro são constantes, assim como passeatas e conversas que
não acabam. O Rodrigo é uma das pessoas mais divertidas e descontraídas que conheço,
quase sempre que estou com ele há gargalhadas à mistura. E ao mesmo tempo é
também uma pessoa que sabe ter conversas mais sérias e dar muito bons conselhos.
Ainda assim, não consegui
deixar de ficar bastante admirada ao ler estes poemas, não só pela óbvia
capacidade de escrita (o que lhe advém de muita leitura, esta influenciada
também pelo facto de ser filho de um coleccionador de livros) mas como, e
principalmente, pela profundidade dos temas e a maneira como são encarados e
expostos.
Li algures um texto que
dizia que a poesia é uma criação da alma
poética que todos temos no nosso interior, basta que a deixemos fluir
livremente. E que existem muitos poetas que guardam poemas maravilhosos a
sete chaves, simplesmente por revelarem alguma intimidade e terem receio do
julgamento ou crítica, ou até de serem considerados lamechas. Por este motivo,
não posso deixar de pensar que foi preciso muita coragem por parte do Rodrigo
para escrever estes poemas, para além de uma grande interioridade.
“Todos os Tempos Verbais”
deve o seu título ao facto de o livro não ter sido pensado. A ideia de o criar
surgiu após o Rodrigo ter escrito vários poemas sobre vários temas, e por isso,
segundo o poeta, o nome advém do facto de o livro retratar todos os tempos
verbais da alma. A ideia deste nome também teve como inspiração o último poema,
que curiosamente se chama “No Princípio” e faz referência a vários tempos
verbais. No entanto, apesar de o livro ser uma colectânea de poemas soltos,
conseguimos apercebermo-nos da existência de um fio condutor entre eles. Alguns
referem-se a memórias de infância do poeta, outros aos temas da existência e da
morte, outros ao amor.
Um pormenor que também
reparei foi o facto de, ao longo dos poemas, estar muito presente a mistura de
um mundo realista com aquele a que o poeta chama de mágico. O Rodrigo conta histórias
nos poemas, misturando muitas vezes os sentidos com os pensamentos. Como uma
pessoa que passeia sozinha e vai observando o caminho à sua frente enquanto, ao
mesmo tempo, se abstrai nos seus pensamentos. Nós conseguimos acompanhar
facilmente o poeta em todos estes passeios que faz. Há uma ideia de movimento
muitas vezes associada ao longo do livro.
Normalmente quando pensamos
em escrever poemas, temos a tendência de pensar em rimas ou nos preocuparmos
demasiado com a métrica. Quando o essencial é a mensagem, aquilo que se quer
passar, o que se tem a dizer. E o poeta tem muito para dizer, como podemos
reparar ao longo do livro, sem se prender tanto à forma do poema.
Por
fim, queria acrescentar que, do mesmo modo que cada poeta tem a sua própria maneira
de sentir e escrever, os leitores têm a sua maneira de ler e sentir. Isto é: quem
escreve, primeiro sente o que lhe vai na alma e posteriormente transpõe esse
sentimento para o papel. Quem lê, percorre o caminho contrário, ou seja,
primeiro lê o que tem diante dos olhos, e depois vai analisar o efeito que isso
produz na sua alma. E aí está a diferença. Nem todos têm o mesmo sentir. Por
esta razão não me vou alongar mais, vou passar a palavra à pessoa que todos nós
queremos ouvir, mas convido-vos a descobrir este livro lendo com calma cada
poema e tentando perceber qual a mensagem que o autor quer transmitir.
Acreditem que, tal como eu, também se vão surpreender muito!"
*Rita Leão, no dia da apresentação de «Todos os tempos verbais», no Clube de Viseu