sábado, 10 de setembro de 2011

valter hugo mãe quase, quase a chegar... Let's look at the trailer

Por esta e outras razões é que sinto que este senhor vai rebentar nos top's de venda...



A 23/09.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

E assim concluo mais um livro do mês... Afonso Cruz

«A boneca de Kokoschka» tem tiradas assim:

"(...) Os médicos são uns ladrões. Não curam. Inventaram a cirurgia para nos roubarem coisas. Quando há uma doença, extraem. Isso não é curar é roubar. Vamos ficando mais pequeninos e eles mais ricos. O que não falta por aí são doenças para encherem os bolsos. Há mais doenças a afectar a humanidade do que a humanidade a afectar pessoas. É este o estado das coisas. Um médico ganha que se farta e nós vamos ficando sem órgãos. Uma pessoa pode contabilizar assim a decadência: quantos órgãos tens a menos?"

Ou esta:

"A HORIZONTALIDADE é um dos maiores sintomas da morte, lugar onde tudo se mistura. A verticalidade mostra exactamente o oposto. É por isso que nos impressiona uma flor a nascer, a despontar, e ficamos desiludidos com as abóboras, os melões, as cobras e os lagartos, que se estendem pelo chão, na modorra, em vez de crescerem para o alto, como os espíritos mais ousados. Uma árvore deitada está morta, não está a dormir, e os animais, quando dormem, experimentam o sabor do acabamento. A horizontalidade é o triunfo da morte, e o universo, apesar de redondo, é horizontal. A Terra é mais ou menos esférica, mas o que se vê, quando se olha, é o horizonte. Talvez por isso, o sexo esteja sempre tão próximo da morte, por ser tão horizontal na sua maneira de estar. Santo Agostinho, ao juntar a morte ao sexo, ao pecado original, vislumbrava a morte a ser transmitida pelo ADN, a ser misturada na cama que é onde se dorme e onde se morre com grande frequência. Porque no nosso ADN há uma ordem que diz para morrermos. E isso é comunicado, preferentemente, na horizontal."


Não vou acrescentar muito à opinião que o Fábio Ventura deixou da leitura que fez. Resta-me dizer que Afonso Cruz tem talento e escreve acima da média. Foi o primeiro livro que li dele e despertou a curiosidade para ler mais qualquer coisa.

No entanto, creio que a história acaba por ter personagens a mais. São, realmente, vários livros dentro de um livro. A parte em que Oskar Kokoschka "manda construir uma boneca de tamanho real criada à imagem de Alma Mahler, a mulher que o rejeitou", a meu ver, fica pouco explorada. Estava à espera de um livro com mais fantasia, mais pormenor baseado nesta parte da narrativa - não fosse ter este título. Em vez disso, somos levados a conhecer várias vidas, muitas personagens que se vão ligando entre si. No entanto, acho que Afonso Cruz exagera, podendo o leitor correr o risco de, ao fazer uma leitura menos atenta, perder-se com facilidade.

Quanto à escrita, nada a dizer. Tem pensamentos que me deixaram muito satisfeito e que se reflectiram em muitas análises pessoais. Um livro para ler. De preferência, devagar.

Revista Ler n.º 104

Julho / Agosto trouxe, a meu ver, uma Revista Ler desinspirada. Desde logo pela capa. "24 livros sem desculpas para não ler nas férias." Quanto a mim, é um pouco cliché falar-se de livros para ler na praia, por melhor que esta lista seja ou os livros sugeridos. Não creio que uma revista com este peso na crítica literária necessitasse de fazer assim uma coisa tão óbvia. É quase como se entrasse numa campanha publicitária.

Bem mais interessante e em vez de listas, é o artigo que Rogério Casanova assina sobre "estratégias a usar na praia" para ler. O diálogo que mantém com Renato Diogo, um menino de cinco anos, e que 'inferniza' o Rogério; é soberbo. O pequeno bem tenta travar toda a paz possível do adulto, dificultando ao máximo a tarefa do leitor. Quem será que ganha?


Entrevista central a Maria Filomena Molder, muito interessante. Conduzida, como é habitual, por Carlos Vaz Marques. Deixo convosco um pensamento:

- 'Está em exegese permanente?'

- 'Sempre. Isso parece impedir o pensamento. Para haver pensamento é preciso distância. Aqui não; é tudo em cima da hora. Quando há declarações dos políticos, quase ao mesmo tempo já se está a fazer o comentário. Às vezes nem se deixa acabar o discurso. Há nisso uma impossibilidade de criar distância, uma condição para nós pensarmos. (...)'

Por fim, uma constatação assinada por Nuno Costa Santos, na rubrica 'Provedor do leitor ou como fazer amigos na literatura'.

Festivais contra a solidão

"Tenho pensado no assunto e procurado encontrar uma reposta para a pergunta: porque é que os escritores que vão a festivais literários falam dos momentos que por lá passaram de uma maneira, digamos assim, tão romântica? Penso ter encontrado a resposta: é por causa da solidão. Da solidão subitamente quebrada em dias convivais. Nunca como agora se partilhou tão pouco a escrita. Nunca como agora se conversou tão pouco sobre os avanços e recuos de cada um. Dantes havia encontros de café e correspondência entre escritores. Agora há no máximo SMS para «ir tomar um copo» ou comentar a intervenção de um iluminado economista no «Prós e contras» com um «Quem é este patego?». Num festival, os escribas, seres reclusos, encontram-se e falam. Acho que é daí que vem a felicidade."

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Código do Processo Pessoal...

Colocado estrategicamente no balcão das lojas Almedina, afinal o que trata um Código do Processo Pessoal?

Bem, esta é a pergunta que a maioria dos clientes põe. E a surpresa é enorme! Este Código é um simples bloco de notas, imitando o estilo e a imagem dos códigos "mais sérios".


É apenas assim descrito:

Caderno de Apontamentos Liso

• Notas
• Apontamentos
• Actas de reunião
• Rascunhos
• Listas de compras
• Etc.

Não é uma ideia super original do Grupo Almedina? Comprem-no. Sendo juristas ou não. Quem sabe se daqui não sai um futuro livro?

Poemas que dão música - Álvaro de Campos



Ai, Margarida,

Se eu te desse a minha vida,

Que farias tu com ela?

— Tirava os brincos do prego,

Casava c'um homem cego

E ia morar para a Estrela.

Mas, Margarida,

Se eu te desse a minha vida,

Que diria tua mãe?

— (Ela conhece-me a fundo.)

Que há muito parvo no mundo,

E que eras parvo também.

E, Margarida,

Se eu te desse a minha vida

No sentido de morrer?

— Eu iria ao teu enterro,

Mas achava que era um erro

Querer amar sem viver.

Mas, Margarida,

Se este dar-te a minha vida

Não fosse senão poesia?

— Então, filho, nada feito.

Fica tudo sem efeito.

Nesta casa não se fia.

Comunicado pelo Engenheiro Naval

Sr. Álvaro de Campos em estado

de inconsciência

alcoólica.

Poemas que dão música - Chico Buarque e Caetano Veloso

Canta Caetano Veloso. À viola, Chico Buarque. Num belíssimo poema.



"Quero ficar no teu corpo
Feito tatuagem
Que é pra te dar coragem
Prá seguir viagem
Quando a noite vem...

E também pra me perpetuar
Em tua escrava
Que você pega, esfrega
Nega, mas não lava...

Quero brincar no teu corpo
Feito bailarina
Que logo se alucina
Salta e te ilumina
Quando a noite vem...

E nos músculos exaustos
Do teu braço
Repousar frouxa, murcha
Farta, morta de cansaço...

Quero pesar feito cruz
Nas tuas costas
Que te retalha em postas
Mas no fundo gostas
Quando a noite vem...

Quero ser a cicatriz
Risonha e corrosiva
Marcada a frio
Ferro e fogo
Em carne viva...

Corações de mãe, arpões
Sereias e serpentes
Que te rabiscam
O corpo todo
Mas não sentes..."

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Do filme África Minha

O amigo José Santos partilhou connosco estas palavras, do filme 'África Minha', uma adaptação do romance de Karen Blixen


"He has got lovely books.
- Does he lend them?
- We had a friend...
Hopworth, he'd got a book
from Denys and didn't return it.
Denys was furious.
I said to Denys...
"You wouldn't lose a friend
for the sake of a book."
He said, "No, but he has."


'África Minha' é assim contado:

'Quando era rapariguinha estava bem longe de pensar ir um dia para África, e nem sonhava sequer que uma quinta em África fosse um lugar em que poderia sentir-me perfeitamente feliz', Karen Blixen. Karen Blixen partiu para o Quénia, em 1914, para dirigir uma plantação de café. Em 1931, a falência do projecto, levou-a a regressar à Dinamarca onde escreveu um livro relatando as suas experiências.‘‘África Minha’’ é uma celebração da sua vida no Quénia, dos amores que aí teve, da sua solícita amizade com os povos da região e da relação com a paisagem e os animais. Uma obra que termina com uma enorme sensação de perda e que é uma das mais belas narrativas sobre África.'

Kokoschka(ndo) mais um pouco...


"(...) Muita gente julga que ser pedinte não dá trabalho, mas a verdade é que mendigar dá muito mais trabalho do que trabalhar. Prostrar-se de joelhos cansa muito, mas humilhar-se cansa muito mais. E nada é mais fatigante do que pedir, implorar para viver. (...)"

in 'A boneca de Kokoschka', Afonso Cruz

Poemas que dão música - Tom Jobim, João Gilberto

Aqui, Tom ao piano, acompanhado à viola por João Gilberto. "Desafinado" música de 1959, vencedora de três Grammy. Que se canta assim e se lê neste poema de Jobim...



"Se você disser que eu desafino amor
Saiba que isto em mim provoca imensa dor
Só privilegiados têm o ouvido igual ao seu
Eu possuo apenas o que deus me deu

Se você insiste em classificar
Meu comportamento de anti-musical
Eu mesmo mentindo devo argumentar
Que isto é Bossa Nova, isto é muito natural
O que você não sabe nem sequer pressente
É que os desafinados também têm um coração


Fotografei você na minha Rolley-Flex
Revelou-se a sua enorme ingratidão
Só não poderá falar assim do meu amor
Ele é o maior que você pode encontrar

Você com a sua música esqueceu o principal
Que no peito dos desafinados
No fundo do peito
Bate calado, que no peito dos desafinados
Também Bate um Coração"

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Fábio Ventura e o livro do mês de Julho: "A Boneca de Kokoschka", de Afonso Cruz

[Apenas uma nota: por motivos técnicos alheios ao Fábio, não foi possível ser ele a publicar o texto que redigiu para o nosso blogue. Por isso mesmo, deixo convosco o que ele escreveu.]

"Escritor, músico, cineasta e ilustrador, Afonso Cruz é um dos autores portugueses mais criativos e multifacetados da actualidade. Depois de nos maravilhar com obras como Os Livros que Devoraram o meu Pai (Caminho), A Carne de Deus (Bertrand), Enciclopédia da História Universal (Quetzal) e, mais recentemente, O Pintor Debaixo do Lava-Loiças (Caminho), decidimos focar a leitura conjunta de Julho no romance A Boneca de Kokoschka, publicado em 2010 pela Quetzal.

O livro tem como base a história verídica de Oskar Kokoschka, um pintor austríaco que manda construir uma boneca de tamanho real criada à imagem de Alma Mahler, a mulher que o rejeitou. Kokoschka tratava a boneca como se fosse real, até ao dia em que a destrói, desiludido e enfurecido.

Enquanto avançamos na história, percebemos que Afonso Cruz não foca a história de Kokoschka (o que pode induzir em erro alguns leitores depois da análise da sinopse). Este romance é antes uma multiplicidade de histórias que se interligam. No fundo, é um livro (ou vários) dentro de um livro. A história da boneca de Kokoschka surge aqui como o elo de ligação entre as várias personagens apresentadas (o escritor falhado Mathias Popa, o dono de uma loja de pássaros, Bonifaz Vogel, o rapaz judeu, Isaac Dresner, que se esconde nessa loja em plena 2ª Guerra Mundial, entre outros). Mais do que isso, os devaneios e excentricidades do pintor austríaco são uma metáfora, presente nas várias histórias, para a dificuldade que se tem em distinguir o real e do irreal ou ficção, a obsessão, a desilusão ou os desencontros.


O estilo de Afonso Cruz baseia-se nisso mesmo, como podemos observar nas outras obras. As suas histórias são jogos, labirintos, códigos repletos de metáforas que saltam das páginas dos livros e se tornam algo de muito maior na mente dos leitores mais atentos. E enquanto isso pode afastar um leitor mais casual, acaba por se tornar bastante especial e grandioso para os apreciadores deste género.

A escrita do autor surge melhor que nunca e é talvez um dos seus pontos mais fortes. Afonso Cruz brinca com as palavras e expressões, cria frases cheias de imagens, cheiros e sons que nos fazem sonhar e nos aproximam ainda mais das vidas tristes, mas apaixonadas das personagens e dos cenários desoladores, mas cheios de esperança que vão percorrendo. O seu estilo é tão original que me arrisco a afirmar que Cruz é um dos autores mais criativos da actualidade.

Embora A Boneca de Kokoschka não seja tão especial e envolvente como Os Livros que Devoraram o meu Pai e o Pintor Debaixo do Lava-Loiças, há algo que o distingue dessas obras. O romance surge como um autêntico jogo que obriga o leitor a entrar e intervir na história e fá-lo reflectir sobre o que é real e todas as suas dimensões desde as mais filosóficas às mais pessoais. A juntar às múltiplas actividades de Afonso Cruz referidas no início, talvez possamos acrescentar “criador de sonhos”. É esse o efeito dos seus livros depois de fechá-los."

Fábio Ventura

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Alexandre O'Neill in 'Aqui na Terra'


'Aqui na Terra' é um livro de Miguel Carvalho publicado pela Deriva em 2009.

E o Miguel escolheu este pensamento para dar início às suas próprias palavras:

"O padreca, o diabo, a criadita,
o tarata, a velha alcoviteira, o galã
e, às vezes, um verdadeiro rato branco trapezista,
tramavam para nós a estafada estória
da nossa própria vida."

Alexandre O'Neill

domingo, 4 de setembro de 2011

Primeiras impressões do livro de Yoko Ogawa

Comprei há pouco o livro do mês de Setembro, 'A magia dos números' da Japonesa Yoko Ogawa.

Leio as críticas:

"Ogawa explora de forma desarmante um relacionamento que se lê como uma fábula, e em que o insólito se combina harmoniosamente com o sofrimento.", Kirkus Reviews

"O brilhantismo de Ogawa consiste na sua capacidade de moldar uma estrutura aparentemente tão dura a um trabalho tão belo e envolvente.", The Times


Abri as primeiras páginas e não vi prefácio. Mas, logo a abrir, este convite à leitura:

"Nesse instante tive pela primeira vez na minha vida a experiência de um momento milagroso. Num deserto cruelmente calcado, uma rajada de vento revelou aos meus olhos um caminho a direito. No fim do caminho brilhava uma luz que me guiava. Uma luz que me dava vontade de ir pelo caminho fora e de nela me envolver."

Necrológio dos Desiludidos do Amor


"Os desiludidos do amor
estão desfechando tiros no peito.
Do meu quarto ouço a fuzilaria.
As amadas torcem-se de gozo.
Oh quanta matéria para os jornais.

Desiludidos mas fotografados,
escreveram cartas explicativas,
tomaram todas as providências
para o remorso das amadas.

Pum pum pum adeus, enjoada.
Eu vou, tu ficas, mas nos veremos
seja no claro céu ou turvo inferno.

Os médicos estão fazendo a autópsia
dos desiludidos que se mataram.
Que grandes corações eles possuíam.
Vísceras imensas, tripas sentimentais
e um estômago cheio de poesia...


Agora vamos para o cemitério
levar os corpos dos desiludidos
encaixotados competentemente
(paixões de primeira e de segunda classe).

Os desiludidos seguem iludidos,
sem coração, sem tripas, sem amor.
Única fortuna, os seus dentes de ouro
não servirão de lastro financeiro
e cobertos de terra perderão o brilho
enquanto as amadas dançarão um samba
bravo, violento, sobre a tumba deles."