sábado, 22 de agosto de 2015

High Five

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A minha vida - a carta de despedida de Oliver Sacks

Oliver Sacks, conhecido escritor e neurologista, escreveu uma emocionante carta de despedida, ao saber que tem um cancro terminal.

A tradução baseia-se num site brasileiro com ajustes e adaptações minhas, a partir da carta no site do New York Times - http://www.nytimes.com/2015/02/19/opinion/oliver-sacks-on-learning-he-has-terminal-cancer.html?_r=0

foto tirada daqui.

Há um mês atrás, sentia que estava em boas condições de saúde, robusto até. Aos 81 anos ainda nado uma milha por dia. Mas a minha sorte acabou – há algumas semanas descobri que tenho diversas metástases no fígado. Há nove anos encontraram um tumor raro no meu olho, um melanoma ocular. A radiação e o laser para removê-lo deixaram-me cego desse olho. Apesar dos melanomas oculares metastizarem em cerca de 50% dos casos, dadas as particularidades do meu diagnóstico, as probabilidades eram bem mais baixas. Faço parte do grupo dos azarados.

Sinto-me grato por ter recebido nove anos de boa saúde e produtividade desde o diagnóstico original, mas agora estou cara-a-cara com a morte. O cancro ocupa um terço do meu fígado e, apesar de ser possível desacelerar o seu avanço, este tipo específico não pode ser destruído.
 
Agora depende de mim escolher como levar os meses que me restam. Tenho de viver da maneira mais rica, profunda e produtiva que conseguir. Para isso, sou encorajado pelas palavras de um dos meus filósofos favoritos, David Hume, que, ao saber que estava irremediavelmente doente aos 65 anos, escreveu uma curta autobiografia num único dia de abril de 1776. Chamou-lhe “A minha Própria Vida”.

“Reconheço agora que estou numa rápida deterioração", escreveu. Sofro muito pouco com a minha doença; e, o que é mais estranho, agora que assisto ao grande declínio da minha pessoa, nunca senti  um desânimo do meu espírito. Trago o mesmo ardor de sempre no estudo, e a mesma boa disposição.”

Tive a sorte de passar dos oitenta anos. Os 15 anos que me foram dados além da idade de Hume foram igualmente ricos em trabalho e amor. Nesse tempo, publiquei cinco livros e completei uma autobiografia (um pouco mais longa do que as poucas páginas de Hume) que será publicada nesta primavera; tenho diversos livros quase terminados.

Hume continuou dizendo: “Eu sou… um homem de disposição moderada, de temperamento controlado, de um humor alegre, social e aberto, afeito a relacionamentos, mas muito pouco propenso a inimizades, e de grande moderação em todas as minhas paixões.”

Aqui distancio-me de Hume. Apesar de desfrutar de óptimas relações e amizades e não ter verdadeiros inimigos, não posso dizer (e ninguém que me conhece diria) que sou um homem de disposições moderadas. Pelo contrário, sou um homem de disposições veementes, com entusiasmos violentos e extrema imoderação em todas as minhas paixões.

E ainda assim, uma linha do ensaio de Hume toca-me especialmente, pela sua verdade: “É difícil”, escreveu, “estar mais separado da vida do que estou no presente.”

No decorrer dos últimos dias, consegui ver a minha vida como se estivesse a grande altitude, como um tipo de paisagem, e com a sensação cada vez mais profunda de conexão entre todas as suas partes. Isto não significa que terminei de viver.

Pelo contrário, sinto-me intensamente vivo e quero (e espero), neste tempo que me resta, aprofundar as minhas amizades, dizer adeus àqueles que amo, escrever mais, viajar se tiver força, alcançar novos níveis de entendimento e discernimento.

Isso vai envolver audácia, clareza e, dizendo sinceramente: tentar ajustar contas com o mundo. Mas vai haver tempo, também, para um pouco de diversão (e até um pouco de tolice).

Sinto um repentino e claro foco e perspectiva. Não há tempo para nada que não seja essencial. Preciso focar em mim, no meu trabalho e nos meus amigos. Não devo assistir todas as noites ao telejornal. Não posso mais prestar atenção à política ou às discussões sobre o aquecimento global.

Isto não é indiferença, mas desprendimento – ainda me importo profundamente com o Médio Oriente, com o aquecimento global, com a crescente desigualdade social, mas já não sou para aí chamado; são assuntos que pertencem ao futuro. Alegro-me quando encontro jovens talentosos – até mesmo aquele que me fez a biópsia e chegou ao diagnóstico da metástase. Sinto que o futuro está em boas mãos.

Tenho estado cada vez mais consciente, por volta dos últimos 10 anos, das mortes entre os meus contemporâneos. A minha geração está na porta de saída, e sinto cada morte como uma ruptura - como se dilacerasse um pedaço de mim. Não vai haver ninguém igual a nós quando partirmos, assim como nunca há ninguém igual a nenhuma outra pessoa. Quando as pessoas morrem, não podem ser substituídas. Elas deixam buracos que não podem ser preenchidos, porque isso é o destino – o destino genético e neural – de cada ser humano como indivíduo único, que procura o seu próprio caminho, vive a sua própria vida, morre a sua própria morte.

Não posso fingir que não estou com medo. Mas o meu sentimento predominante é o de gratidão. Amei e fui amado; recebi muito e dei algo em troca; li, viajei, pensei e escrevi. Tive uma relação com o mundo, a interacção especial entre escritores e leitores.

Acima de tudo, fui um ser senciente, um animal pensante neste bonito planeta e isso, por si só, tem sido um enorme privilégio e aventura.

*Oliver Sacks

Bibliófilo

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Estantes de sonho: apetecia-me tomar algo

Foi você que pediu?
 
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Foto poema: Alberto Caeiro


Foto poema: Eugénio de Andrade


Foto poema: Francisco Brines


quinta-feira, 20 de agosto de 2015

No tempo em que os animais falavam


Do Verão, as tardes infinitas.

O silêncio das cigarras.

Os pés descalços pelo soalho da casa.

A casa na penumbra, a sala, os quartos, o silêncio dos móveis, o barulho dos cheiros, cera, sabão, naftalina, alfazema, cidreira, tabaco, tinta, papel, pele, licores de várias cores, pêssegos, maças, flores a murchar, em regra rosas brancas, as flores preferidas da avó.

A casa uma floresta, crepuscular, e o terraço a arder apesar da sombra, mantenham as portas fechadas, ordenava a avó, não fossem as chamas atrever-se a entrar em casa.

Os meus pés descalços, inteiros sobre o soalho, em pontas aos saltos curtos pelo chão do terraço que, apesar da sombra, amarelo e apesar de amarelo, os meus pés descalços cinzentos, castanhos, pardos quase negros.

Calça os chinelos. – A avó dizia até que desistiu, se cansou, de dizer.

Pelo chão do terraço a sombra a dançar, toalha bordada a flores, flores quase secas, quase papéis perfumados, mensagens de namorados, belas e efémeras.

Pelo chão do terraço a sombra feita de buganvílias, roxa de cor.

Buganvílias em vigília.

O chão do terraço em granito.

Pedra grão. Pedra pão.

Numa terra em que tão pouco medra, porque tudo infinito.

Inverno e Verão infinitos.

Fora da sombra a pedra a arder.

Dentro da sombra a pedra em brasa e uma rede baiana.

Um tio-avô mandou embarcar a rede no porão de um avião.

Par avion, metálico pombo-correio, que aparentemente falava francês.

O avião tinha nome.

O tio-avô também tinha nome.

Só o avô sabia o nome do irmão e do avião.

Só o avô guardava memórias do irmão.

E todos os Verões, como eu, chegava uma encomenda embrulhada em papel pardo e, aos meus olhos, decorada com selos tropicais, papagaios, tucanos, onças, araras e com a encomenda uma carta de poucas linhas, poucas as palavras alinhadas.

E as palavras repetidas, como se copiadas da carta do Verão anterior, como se sempre e mesma carta.

Que esperava encontrar-nos, a carta, bem e com saúde.

Que saudades das cerejas de Junho, dos pêssegos e alperces de Julho, das uvas de Agosto, dos dióspiros de Setembro, todos frutos que não encontrava no Brasil.

Que saudades do irmão.

Que sempre e também saudades da Adosinda.

Da Adosinda que foi o seu amor de juventude, que não há amor como o primeiro.

Da Adosinda dos olhos verdes, os únicos olhos verdes da aldeia, olhos que mesmo cheios de lágrimas não o conseguiram prender, fracos anzóis, para mais num tempo em que fome era coisa que não faltava nas bocas, ou dito com poesia, porque o mar tem dias, muitos, em que verde também, olhos sem serventia como farol, porque o perderam para o mar, para outra terra.

Da Adosinda que teve tão fraco fim, mau casamento e morte de nova, sucessos, insucessos, que o avô não contou ao irmão, nem do casamento, nem do funeral, omissões com vocação para mentiras, devidamente inocentes por não mais que com o fito de preservar no irmão a vontade de regresso, que sem vontade não vamos a lado nenhum, e que faziam com que, do lado de lá do Atlântico, a Adosinda continuasse, olhos cheios de água, solteira e quase menina.

Depois, tanto tempo depois, cinquenta anos depois na certeza que não voltaria a ver o irmão, já não fazia sentido matar a Adosinda.

Assim a história de uma rede da Baía, de duas redes da Baía, inéditas nos terraços de uma aldeia em Trás-os-Montes, porque à Adosinda, no mesmo Verão chegou encomenda igual.

Do Verão, as tardes infinitas e embaladas numa rede.

Se a rede um búzio, se encostasse ao ouvido o búzio, os meus pensamentos, o meu sono seco, a minha respiração, o barulho de ondas, o som do vento e do mar.

Na rede o meu corpo marinheiro embalado pelo mar.

Na rede o meu corpo de menina, um corpo que já não é meu, mais livros, revistas e um gato, que nas caravelas havia sempre um gato.

Um gato que copiava todos os meus passos e o sono da sesta.

Na casa havia oito gatos mas apenas um, como um monge copista, copiava o meu sono, imitava os meus passos.

Na casa havia oito gatos à solta e dois coloridos pintassilgos dentro de uma gaiola, pássaros que apesar de presos não se inibiam de cantar e encantar quando o calor do pino da tarde esmorecia.

Como se com hora marcada para o espectáculo, separavam-se as cortinas e os pintassilgos começavam a cantar, celebrando o alívio dos corpos e da terra, o facto de terem sobrevivido incólumes a mais uma tarde de calor de incêndio, docemente acordando a casa, como se madrugada fosse.

O meu corpo na rede a acordar também.

A desembaraçar-se do livro aberto por ler, a separar-se do gato, o gato primeiro contrariado, depois, sem ressentimentos, a esquecer as contrariedades, a espreguiçar-se no chão, copiando o meu corpo a espreguiçar-se na rede, e as ondas de volta ao mar.

A avó a desenrolar o corpo, tronco e cabeça outra vez verticais, com o dedo indicador a expulsar os óculos da ponta do nariz, as agulhas do crochet como pauzinhos chineses de novo no regaço em movimento, movimentos brancos não de arroz mas de lã, linho ou algodão.

E os gatos, espevitados, atenazados, pelo canto, apesar de fartos, em respeito pela felina natureza, corpos em sentido, olhos amarelos postos na gaiola, em turbulento desejo, em adoração, quase religião. Porque só quando cantavam, quando em homilia, em provocação, na língua que só os animais falam e entendem, os presos pássaros prendiam a atenção dos gatos.

Há quem diga que o desejo é melhor do que o prazer, como se a fome fosse melhor do que comer, e os gatos, sentados na primeira fila da plateia, uma lista de desejos como uma lista de supermercado, por favor, embrulhe-me dois passarinhos para levar, diziam dezasseis olhos, que os olhos também falam, que os olhos também comem.

Vidrados nos corpos alados para lá das grades.

Indecisos quanto a como agir.

És um gato ou és um rato?

Sem nenhum, felino suficiente apesar da leonina linhagem, se atrever a enfrentar a fúria do meu avô se por má ventura encontrasse a gaiola vazia.

Cuidados e sementes de cardo guardava o meu avô para os pintassilgos.

E a cada noite de Verão, o meu avô fumava sozinho sentado no terraço os dois últimos cigarros do dia, e não sozinho, porque a buganvília, os pintassilgos, a lua, as estrelas, o vento, o barulho dos cheiros.

O meu avô que, como uma personagem do Bellow, dizia que as palavras eram para os velhos ou para jovens de coração velho, assobiava baixinho pensamentos e os pintassilgos respondiam, conversavam animadamente numa língua que só os animais entendiam, até que os pássaros sem fôlego desistiam e um silêncio de mar, se o mar tivesse dentro grilos e cigarras, inundava tudo.

E isto era tudo que agora é nada.

Porque a casa vazia de gente, cheia de pó, do cheiro a humidade e a bafio, habitada por aranhas e traças, e no terraço, a gaiola vazia, a buganvília seca, a rede da Baía a apodrecer,

Porque tudo se pode perder até a memória.

Porque hoje o meu avô faz 113 anos dentro de mim.
 
Raquel Serejo Martins
 

Gonçalo Viana de Sousa - O Flâneur das Sensações



Meu querido José


Por cá continuo eu, em Celorico, neste recanto de verdes folhagens de vinho e broa, recanto de águas e de céu ao qual me atrevo a chamar casa.
Como já lhe havia contado no domingo passado (…), (…) é sempre interessante observar Efraim por entre as botoeiras das rosas, regando os canteiros de flores e de ervas aromáticas. De mangas de camisa arregaçadas, de galochas e calças de ganga, Efraim assemelha-se a um daqueles Jacintos que Eça tão bem descreve por terras de Tormes. Com a dourada idade dos cinquenta e cinco anos, Efraim, o formidável judeu rejuvenesce por entre estas alamedas de tílias, vinhedos e castanheiros. O semita supercitadino rende-se ao silêncio dos sulcos de terra molhada pelas águas dos tanques matutinos. Enquanto Efraim se dedica a esta vida campestre, sólida, saudável e robusta, vou caminhando pelos largos que me viram menino e moço. São os adros de granito cinzento que ressoam um sino que teima a dobrar, é o pequeno passeio entre a casa do adro da igreja; são os largos portões ante-enferrujados, negros ou verdes, que estendem os seus braços de ramadas e de heras labirínticas que abrem caminhos a casas caiadas de branco, de janelas abertas e de meninas que corriam com fitas no cabelo. São as longas salas de minha casa, o piano de cauda onde minha tia tocava algumas peças de Debussy e de Schumann enquanto o velho padre Serafim, no seu sofá coberto de rendas, dormia beatificamente, ou rilhava uma bailarina ou pão-de-ló com um cálice daquele vinho do Porto tratado, que vinha das terras de meu pai, em Alijó. Ainda hoje consigo escutar as notas de uma rêverie, de um träumerei. E tantas outras memórias, jovem das aventuras de papel! Lembra-se daquilo que lhe disse, na tarde de domingo, a propósito das biografias de Fradique e de Veiga? Não se esqueça! As palavras consomem-nos por dentro, tanto quanto o silêncio que a música proporciona. É a realidade, jovem frenético, mas não hoje. Se a literatura é a arte da palavra e da voz, não é menos verdade que também seja a arte do silêncio, do olhar e do recolhimento. Música e Literatura são filhas do silêncio e do silêncio precisam para que consigamos alcançar os segredos mais absolutos, mas sempre aquém do Absoluto. A Arte trata-se de pequenos absolutos que guardam em si um Absoluto maior, o Absoluto. Cada obra de arte, cada escultura, cada pintura, cada composição, cada soneto, cada romance, cada edifício, cada tragédia, cada mulher é a centelha do absoluto, do divino e do indefinido. E veja bem aonde me levaram as portas e as salas da minha casa de Celorico: ao Indefinido, ao Absoluto!
Tudo por conta de minha tia que tocava aquela peça tão bela e tão íntima e tão feminina de Claude Debussy. Eram cinco minutos que continham em si todo o Universo…
Agora Efraim colhe as flores com a Zulmira, a Ti Zulmira, caseira e zeladora dos mais belos arranjos florais que vi em toda a minha vida.
O passeio termina, querido José, e a vida, como sempre, continua.
Agradeço a sua visita e o seu convite para jantar no próximo domingo, ao qual não acedo por inconveniência de Efraim, que recebe seus primos de Israel. Ficará, pois, para outro momento, esse tal anho no forno com arroz de calda e açafrão.
Quando o seu Barreirinhos terminar não hesite em pedir mais umas quantas caixas deste verde néctar, tão fresco e jovial. Em Celorico é o verde branco, a água fresca, a broa e a vida!
Um abraço do rosado Efraim, outro do
Seu


Gonçalo V. de Sousa.

Foto poema: Ingeborg Bachmann


quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Corre o rio, corro eu

Da varanda da minha casa vejo um rio que corre sem margens. Há o rio e não há mais nada, o que importam as margens quando no rio todas as cores do arco-íris arrumadas ao acaso. Hoje compreendo que o rio é fruto das tardes que todos os dias se constroem apenas de um cristal muito fino. Esse mesmo cristal, sempre em silêncio, sobre o rio se vai estendendo e então os gemidos das estrelas tão bem refletidos numa porção de vida que aparenta nunca poder acabar.
Vive o rio e existo eu, longe, íntimo, ao rio tenho-o mas ignoro se alguma coisa me tem a mim. Tenho várias coisas fora do mundo, o rio corre e tento acompanhá-lo, deixo-me ir ao ritmo de um silêncio que se revela o mais completo que conheço. Afinal de contas prolongo-me nos membros da minha imaginação. Só por isso te tenho, rio, tão perto e ao mesmo tempo tão longe.
Vejo-te rio e compreendo que para ti não há idades. Talvez o tempo seja uma invenção minha porque não consigo compreender a tranquilidade e a imutabilidade com que todos os dias te vejo, sempre igual, próximo de tudo e distante de nada, tão pouco igual a mim.
Diz-me rio se também tu me vês, eu que existo cá em cima abrigado dos poderes do céu, tu que vives aí em baixo comandando os poderes da terra. Inventas a saudade que nunca consegui conhecer, na mão tens todos os desejos do mundo, no peito todas as vidas.
Diz-me rio se para ti a eternidade é uma opção ou se também tu acabarás dormindo sobre um mar de chamas, entre castanheiras e plátanos, procurando entre espaços o que até hoje ninguém encontrou.
Um dia a indecisão do que se é e no outro a certeza que o único passo é fazer. Mais te pareces com um diamante infinito, por suaves linhas passas as palmas das mãos e então corres num padrão perfeito. Ignoro se dormes sozinho rio. De uma forma ou de outra hás de permanecer brilhante e cristalino, luminoso, isto enquanto eu me alimento da luz que me emprestas, não podendo dar nada em troca.

Gonçalo Naves

Foto tirada daqui: http://www.joaoanatalino.recantodasletras.com.br/visualizar.php?idt=4444653

a-ver-livros: variações de A Leitora, de Fragonard

O quadro "A leitora", de Jean Honoré Fragonard, é um clássico. Surge no século XVIII, quando a "febre de ler" se instala na Europa graças ao advento da tipografia. A jovem dama francesa surge absorta na leitura e alegre na cor do vestido, em contraste com a penumbra que a rodeia. Uma simbologia clássica. 

Original de Jean Honoré Fragonard

Para mim, o que se torna curioso é, na verdade, a influência que este quadro tem em outros artistas - que têm vindo a replicá-lo de formas mais ou menos criativas. Porque hoje é quarta-feira e a poesia tem andado arredia, ofereço-vos outros olhares sobre este quadro, variações de autores vários. Querem pintar também o vosso?

Ana Almeida

de Natasha Koneva
para saber mais: http://www.artwanted.com/artist.cfm?ArtID=22039&Display=Med&SGID=0&Page=0

de Yamila Jorge
de Schigolev Oleg
para saber mais: http://painting-by-schigolev.jimdo.com/
da israelita Hanna Watts
para saber mais: https://www.facebook.com/HannaWattsHnhWts?fref=ts
da boliviana Celina Avril Tito Garrido
para saber mais: http://pintura-ceramica-escultura.artelista.com/en/
de Kamra
para saber mais: http://www.farea.com/artists_createurs/kamra_figuratif/kamra_figuratif.php















de Kamra (2)
de Kamra (3)

Foto poema: William Carlos Williams


terça-feira, 18 de agosto de 2015

tessitura


uma nota
em suspenso
percorre
o espaço do chão
aos calcanhares
na brancura
do enlace
mora o corpo
do bailado.

Helder Magalhães


Monia Merlo Photographer

É do borogodó: Quintalzinho, de Penélope Martins e Tati Móes

quintalzinho
 
O quintal da minha infância tinha besouro, lagartixa, joaninha, e formigueiros mágicos que cresciam de um dia para o outro.
Quando o grupo de crianças de juntava era para morar no olho da rua, onde os quintais se uniam em um grande espaço mundo.
Corríamos no pega-pega, pulávamos amarelinha, cabra-cega não faltava, banho de mangueira quando o calor aparecia, todos os disparates poderiam ser inventados naqueles dias em que brincávamos no quintal.
E quando não estava em casa, na casa da avó era o mesmo: areia peneirada, panelinha de lata, chuva de folhas e canto de pássaros, bolas de gude pintando o chão.
Era tão bom quando vovó desenhava no caderno um novo modelo de casaco, buscava as agulhas e me fazia escolher a cor do fio para tricotar o passo a passo da nossa conversa na varanda da casa. Uma varanda encarnada com lustro de cera também servia para patinar vestindo grossas meias. Não para todos os dias, mas sempre que podia, meu avô vinha com sorvetes de palito com sabor de fruta.
O quintal da minha infância crescia para dentro de mim e eu nunca mais me separaria dele.
Tornei-me escritora, talvez poeta eu já fosse desde aqueles dias, e reuni um conjunto de poesias para o qual dei o nome QUINTALZINHO, memórias dos dias em que mais valia uma bacia de areia peneirada do que qualquer outro tesouro de valor mensurável. Não deixei de fora os dias de agora, meu olhar sobre as crianças que despertam a criança que ainda existe (resiste) em mim.
Para minha sorte e felicidade, a amiga Tatiana Móes que já era parceria na obra Poemas do Jardim, acolheu os poemas com seus desenhos, intervenções na disposição do texto, elaboração estética do livro todo.
Juntamos nossos quintais ao selo da Bolacha Maria Editora e pronto! temos aqui um grande passo para a brincadeira de ler o mundo com os olhos de criança sempre aptos a experimentar o novo num tempo que é o único que nos importa: o tempo de agora.
Afinal…
– Um pedaço de quintal hoje,
amanhã conquistamos o mundo!
 
quintal3
Quintalzinho, de Penélope Martins e Tati Móes, tem o selo da Bolacha Maria Editora e pode ser encontrado nas Livrarias, também na página Quintalzinho.

The Botanist, por Rodrigo Ferrão

The Botanist

Junto zimbro a tons de menta.
Procuro no insólito
e inóspito da ilha, 
os sabores da minha infância.
Sabugueiro, melissa, camomila.
Bétula, espinheiro, cardo e urze.
Ulmária, cecília, atanásia…
E também tojo ou coalha-leite.
Mãe pátria que me protege, local que me viu nascer.
Mãe Escócia que resiste e mantém-se de pé, pedaço de terra que carrega homens orgulhosos.
Batalhas e muitas vidas derramadas, alguém tem de proteger os filhos que são trazidos no ventre.
Porque são eles os futuros guerreiros,
porque são eles os defensores das lendas e das belas canções,
porque são eles os guardiões dos longos Invernos que pintam a tundra de branco.
Vejo lagos sem fim,
monstros que saem dos sonhos e fogem para o fundo dos lagos.
Vi erguer muralhas em forma de castelos,
velhas destilarias,
Whisky e Gin.


Na memória carrego longos momentos de felicidade,
condensados neste preciso minuto.
Que bom seria agarrar-te pela mão
e ir para esse lugar que parece ter ficado para trás.
Corpo que não sou,
menino que não volta,
pessoas que me fugiram
e nunca mais regressam.
 
Rodrigo Ferrão

Porque aqui vai nascer um projecto diferente de gin, não perca os nossos poemas.


segunda-feira, 17 de agosto de 2015

a-ver-outras-coisas: Sá de Miranda em azulejo

Poema de Sá de Miranda em azulejos na Casa do Barreiro, Gemieira, Ponte de Lima. 

* Francisco de Sá de Miranda (Coimbra, 28 de agosto de 1481 - Amares, 15 de março de 1558 (76 anos)) foi um poeta português, introdutor do soneto e do Dolce Stil Nuovo na nossa língua. (...) Para Sá de Miranda, a poesia não é uma ocupação para ócios de intelectual ou de salões, como para os poetas que o antecederam, mas uma missão sagrada. O poeta é como um profeta, deve denunciar os vícios da sociedade.
 in wikipedia


Less is more?

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