sábado, 1 de junho de 2013

Reinaldo Ferreira: a cavalo do arco-íris

Era miúda. E fui. Encontrei já não sei onde uma ilustração linda para um poema lindo. "Quero um cavalo de várias cores", dizia. E eu repetia, lendo para mim o resto dos versos enquanto perdia o olhar no desenho do cavalinho.

 Hoje já não sei onde anda esse recorte que guardei carinhosamente. Talvez numa das caixas cheias de diários e recuerdos que escondi na prateleira mais alta da arrecadação. Mas o poema continua a repetir-se, baixinho, cá dentro. "Quero-o depressa que vou partir".  

 
Não partia nem chegava, apenas estava, quando tropecei de novo no poema bonito de Reinaldo Ferreira. Agora com voz, agora com música, numa versão cantada por Filipa Pais no CD "À Porta do Mundo" (2004). 

E, de repente, era menina de novo. O mundo um portão aberto para todos os sonhos. A poesia o meu porto seguro. 



Quero um cavalo de várias cores

"Quero um cavalo de várias cores,
Quero-o depressa, que vou partir.
Esperam-me prados com tantas flores,
Que só cavalos de várias cores
Podem servir.

Quero uma sela feita de restos
Dalguma nuvem que ande no céu.
Quero-a evasiva - nimbos e cerros -
Sobre os valados, sobre os aterros,
Que o mundo é meu.

Quero que as rédeas façam prodígios:
Voa, cavalo, galopa mais,
Trepa às camadas do céu sem fundo,
Rumo àquele ponto, exterior ao mundo,
Para onde tendem as catedrais.

Deixem que eu parta, agora, já,
Antes que murchem todas as flores.
Tenho a loucura, sei o caminho,
Mas como posso partir sozinho
Sem um cavalo de várias cores?
"


Reinaldo Ferreira

~~~~~~~~~~~~~~

Se tiverem curiosidade, apreciem também estas duas outras formas de dizer/ouvir o poema de Reinaldo Ferreira:
A primeira, uma versão de João Maria Tudella, no disco "Tudella Canta Música de Pedro Jordão", com direcção musical e orquestra de Jorge Machado.
A segunda, apenas voz. A de Luís Gaspar.


Cronicando pela Ásia... Adeus Phi-Phi!

Ko Phi-Phi, 
27 de Abril 2009

O dia é passado na praia, sem grande pressa. Vou saltando de livro em livro - trouxe uns quatro nesta viagem. Tiro algumas citações que fazem sentido. Depois relaxo e descanso... Tomo uma dezena de banhos naquele mar quente e deixo-me flutuar.

O ritmo é lento e estou a despedir-me calmamente das ilhas. Entre uma Coca-cola e outra, vou apreciando a paisagem e os meus olhos percorrem as últimas impressões. Sinto que estou a fotografar com a memória - anoto na retina o postal que quero escrever a alguém. 

A manhã traz de volta um pequeno amigo do Sudão. É filho de um casal que fugiu para a Arábia Saudita. Fizeram comigo a viagem de barco ontem, pelas ilhas desertas em redor das Phi-Phi. Aproveitei para saber um pouco do Sudão, pois certamente não será fácil voltar a encontrar pessoas de lá. Sento-me e tomo o pequeno almoço. Como devem calcular, a conversa não é muito animadora. Falo com pessoas fugidas da guerra há muitos anos. E que não pretendem voltar.


A tarde é passada a ver gente. Entre eles, um pequeno grupo de turistas gay da Índia. Estão bem à minha frente e parecem estar muito descontraídos. Fazem curiosas poses junto ao mar e riem com alegria. O Hinduísmo não deve permitir tamanha liberdade na Índia, pelo que estes homens tiram fotos e riem ruidosamente.

O fim de tarde é dedicado à escrita. Desenrolo os meus endereços e começo a dizer em voz alta as palavras à família e aos amigos. Não divergem muito do "está tudo bem", "estou a adorar". Bebo qualquer coisa na esplanada da livraria. Tiro umas últimas fotos - desta vez à lua que começa a nascer.

Custa abandonar o paraíso... mas a esperança é partir em busca de outros. A noite é passada a fazer malas e a organizar o trajecto. Chega o jantar e bebo um café fraco e quente antes de deitar. Pelo caminho, uma deliciosa trinca nas panquecas. Dou um abraço à menina pequenina que está ali perto e tiro-lhe uma foto. Depois saio a cantarolar pela praia.

Despedi-me do Bungalow, a casa mais extraordinária que habitei. Amanhã já não estou aqui. Sigo para Pukhet, quero ver como está o mar...


Rodrigo Ferrão

Enrique Vila-Matas e Mathias Énard passaram pela feira do Livro.

Veja a reportagem da RTP:



sexta-feira, 31 de maio de 2013

Histórias de Amor - a censura vista pelo autor


Cardoso Pires por Cardoso Pires,
entrev. de Artur Portela,
1ª edição, Publicações D. Quixote, 1991,
124 p., pp. 33 - 35

"- O seu segundo livro, Histórias de Amor, foi apreendido...

- Um dos contos descrevia a prisão de uma estudante antifascista mas a Censura fingiu ignorar o pormenor. A PIDE é que não: prendeu-me sem mais aquelas...

 - Como foi tratado pela PIDE?

- Não me interrogaram, não me deixaram dormir durante três dias e depois puseram-me na rua sem interrogatório, sem nada. Apenas, a privação do sono e algumas provocações. Era um aviso da polícia a um jovem que começava a escrever, nada mais.

 - Foi longo o seu conflito com a Censura...

- Em todo o caso, muito menor do que o de alguns escritores. Torga esteve preso não sei quanto tempo por ter escrito Os Bichos. Redol foi proibido de publicar fosse o que fosse durante dois anos... A polícia política e a polícia da escrita trabalhavam de mãos dadas, como aconteceu no meu caso, mas nunca se comprometiam com qualquer declaração documentada. Veja, a PIDE teve-me detido e dessa reclusão não ficou um auto de captura, um interrogatório. Uma semana depois foi a vez de a Censura me chamar por uma contrafé. O director, um major sinuoso que dava pelo nome de David dos Santos, propôs-me que eu fizesse emendas ao texto das Histórias de Amor para lhe levantar a interdição.

 - Que emendas?

- Substituir as passagens censuradas, pura e simplesmente. Num livro de Jacinto Baptista * há uma referência a esse episódio com bastante exactidão. Para os censores o que na altura estava em causa já não era o livro, era o jovem escritor que eu era. Era esse principiante que aquele major de merda estava a humilhar convictamente, procurando comprometê-lo ali mesmo, logo à nascença. O próprio facto de eu ter de recusar uma negociação tão suja foi, lembro-me bem, uma segunda humilhação para mim porque uma proposta de colaboracionismo, mesmo que em termos de rotina burocrática, pressupõe que o carrasco tem uma imagem desdenhosa da vítima. Claro que da tentativa de aliciamento não ficou o menor registo, como era costume. Ou, antes, ficou; neste caso ficou, porque o major aliciador insistiu em que eu reconsiderasse e entregou-me o exemplar censurado para que eu o corrigisse. O exemplar censurado, imagine! As anotações, as passagens, as páginas cortadas pelo célebre lápis azul da censura, tudo ali na minha mão!

- Por exemplo ...?

- Por exemplo, a palavra nu cortada logo ao abrir do livro. «O homem estava nu em cima da cama ...» e, zás, o lápis azul atacou logo. Por exemplo, certas expressões do género filho da mãe, dor de corno, catano e outras assim, tudo abaixo, tudo excomungado. A simples referência a Maiakovski, ao Éluard e ao Pessoa (ao Pessoa, veja bem!) levantou prontamente a suspeita do bem-pensante e foi abatida antes que se fizesse tarde, e isto para não falar já das páginas eliminadas por inteiro nem das interrogações e de certos sinais enigmáticos que aparecem à margem doutras. Numa delas está anotado a tinta «Deixar passar?» Como vê, os caprichos da Censura eram largos e insondáveis... e eu tinha-os ali na mão! Desse por onde desse, não estava disposto a perder um testemunho daqueles. Como e de que maneira, não sabia. Por sorte minha, pouco tempo depois houve uma remodelação dos Serviços de Censura e nunca mais devolvi o exemplar. Guardo-o como um apontamento precioso da minha vida de escritor porque ‚ uma comprovação da prepotência e da análise supersticiosa daquilo a que o Salazar chamava a Política do Espírito. Senti a mão da Censura logo ao primeiro texto que publiquei em livro, uma antologia universitária intitulada Bloco. Morte imediata, livro apreendido sem demora porque a polícia da escrita estava atenta aos candidatos a escritor. Os que havia já chegavam e sobravam, para essa praga de inquisidores, o escritor português vivo era a besta inconveniente, o alvo maldito. Mesmo assim, ele não se calava, não desistia de escrever. E os editores publicavam-no, os editores, que imprudência, assumiam esse risco. E os livreiros protegiam-no, faziam malabarismos para lhe venderem o livro clandestinamente se por acaso fosse proibido."

* Jacinto Baptista, Caminhos para uma Revolução, Ed. Bertrand, Lisboa, 1975.

1º Parágrafo: As Sirenes de Bagdade


Beirute reencontra a sua noite, com que vela o rosto. Se os motins da véspera não a despertaram, é a prova de que dorme ao caminhar. De acordo com a tradição ancestral, não se incomoda um sonâmbulo mesmo quando vai por mau caminho.



* Tradução de Carlos Correia Monteiro de Oliveira
* Yasmina Khandra é o pseudónimo de Mohammed Moulesshoul

Adeus Nuno Guimarães. «uma palavra tua»

uma palavra tua

Bastava uma palavra tua
E o inverno se esconderia envergonhado
Na primeira esquina da rua
Que pressinto gelada ainda
Uma palavra tua
E a noite que não me larga a janela, fugiria atarantada
Perdendo gotas de estrelas
No parapeito da alma

Bastava uma palavra tua
E deixava-me adormecer, sossegado
Imaginando os teus braços
A velar-me os desejos

Se tivesse
Dissolvia uma palavra tua
Em copo cheio de saudade
Bebia-a em golos demorados
Conforme bula
Sarando a ferida que tenho
Por falta de uma palavra tua

Nuno Guimarães


a-ver-livros: bagagem e Tomasz Pietrzyk

Fui de mãos vazias
volto plena

Há bagagem que não pesa
senão na balança
da alma

* para saber mais sobre o ilustrador polaco Tomasz Pietrzyk
siga o link www.freeart.pl

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Adeus Nuno Guimarães. «a cuidar de ti»

a cuidar de ti

imaginei um céu
onde eu, morto, cuido de ti
dizem que sou o teu anjo da guarda
mas não acredito
só sei que trouxe comigo
a tua alma
para poderes esta noite
ter um abrigo
onde o teu corpo cansado, descanse
e o teu sorriso
sobreviva, apesar da tempestade

no céu onde agora estou
tenho anjos, iguais aos que me disseste
são sete, de um branco muito celeste
e cantam em volta de Orion
aquela constelação
que tão longe, desenhaste
com um beijo que me deste

imaginei-me morto, no céu
com os anjos que inventei
e as estrelas, que se apressaram a mostrar
o quanto gostam de ti
são quatro, de um brilho muito mel
os seus nomes
Betelgeuse, Saiph, Bellatrix e Rigel
anotei numa lua de papel
que te vou oferecer
quando acordares
de surpresa nos meus braços

descansa
estou morto por uma noite,
estou no céu, estou aqui
com os olhos bem abertos
e os sentidos despertos
para embalar os teus sonhos
e assim cuidar de ti...

Nuno Guimarães




É do borogodó: casa comigo, amor

casa comigo, amor

casa comigo, amor, neste instante em que não existe nada mais de importante no mundo, já os homens não estão em guerras, a janta está pronta, os meninos estão na cama e nossos trocados valem ouro. casa comigo, amor, lá fora arde o sol em plena noite escura, aves cantam em coro a bossa mais bonita, janelas dormem abertas e não há sinal algum de partida. casa comigo, amor, tenho a impressão de vida farta, haverá vinho, haverá queijo, haverá chocolate à vontade e a relva úmida, macia, servirá de amparo às carências. casa comigo, amor. casa comigo, amor. casa comigo, amor. nunca deixarei de dizer coisas no teu ouvido.

Penélope Martins

http://azeiteealecrim.wordpress.com/2012/09/25/casa-comigo/

1º Parágrafo: O Mundo do Sexo


Tenho muitas vezes notado que o grosso dos meus leitores se distribui por dois grupos distintos: o dos que afirmam que a dose generosa de sexo que há nos meus livros lhes desagrada e repugna, e o dos que ficam encantados ao descobrirem que esse elemento constitui um ingrediente tão importante. O primeiro grupo inclui muitos dos que consideram os meus estudos e ensaios não só recomendáveis, como extremamente a seu gosto, sentindo por isso dificuldade em explicar como é que um só e mesmo indivíduo pode produzir obras de tal modo diferentes. No segundo grupo, estão aqueles que declaram que aquilo a que chamam o meu lado sério os maça, e que, por consequência, se comprazem em denunciar todas as suas manifestações como porcaria, disparate e misticismo. Só algumas almas penetrantes parecem ser capazes de reconciliar os aspectos supostamente contraditórios de um ser que somente procurou não esconder nenhuma parte de si próprio naquilo que escreve.



* Tradução de Ana Luísa Faria e Miguel Serras Pereira


a-ver-livros: esquinas e Marianna Sztyma

É visceral a saudade
que sobra
profundo o sabor 
que ficou
Reconheceria o som
do teu virar 
de página
em qualquer esquina
da tristeza
em qualquer parapeito
daquela coisa
a que chamámos
felicidade
* para conhecer mais da pintura da polaca Marianna Sztyma
siga os links www.marianna-sztyma.art.pl e marianna-sztyma.blogspot.pt

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Quem é? Mia Couto? O actual prémio Camões?

Quem é? Mia Couto? O actual prémio Camões?

*Fernando Couto - antigo jogador do 
Futebol Clube do Porto e da selecção nacional.
Autoria da montagem: Miguel Arsénio - para a página do

Adeus Nuno Guimarães. «POESIA MINHA: linha»

POESIA MINHA: linha


Há uma linha que separa
o sobreviver do viver:
TU.
e assim sobrevivo
até que a linha nos abrace
ou
se parta em fragmentos de alma
que se lançam freneticamente
na corrente do tempo
flutuando como lembranças
do passado onde sobrevivemos juntos.

Nuno Guimarães


1º Parágrafo: Cemitério de Elefantes


PRIMEIRA noite ele conheceu que Santina não era moça. Casado por amor, Bento desesperou. Matar a noiva, suicidar-se, e deixar o outro sem castigo? Ela revelou que, havia dois anos, o primo Euzébio lhe fizera mal, por mais que se defendesse. De vergonha, prometeu a Nossa Senhora ficar solteira. O próprio Bento não a deixava mentir, testemunha de sua aflição antes do casamento. Santina pediu perdão, ele respondeu que era tarde – noiva de grinalda sem ter direito.


a-ver-livros: eco e Katie Herzog

Silêncio.
Silêncio. Silêncio.
Si-lên-cio. 
Silêncio!

Quero ouvir o eco dos livros

que li

* para saber mais sobre a pintora norte-americana Katie Herzog
siga o link www.katieherzog.net

terça-feira, 28 de maio de 2013

Adeus Nuno Guimarães. «No dia do Abraço...»

No dia do Abraço...

abraço imaginado

um abraço imaginado pousou-me hoje no peito
e trouxe com ele o teu jeito
de chegar
de sonhar
de gostar
com um gosto tão perfeito
cegou-me no seu apertar
incessante
ofegante
de tonalidade brilhante
lembrando um vento solar.
por ofuscar-me o olhar
com seu brilho penetrante
as lágrimas que escorreram
por sentir teu abraçar
eram como estrelas d’água
com o sal a cintilar

um abraço imaginado, deixou-me hoje sozinho
com as mãos tocando o nada
o corpo sem uma morada
e a alma em desalinho

Nuno Guimarães



É do borogodó: todas as horas

todas as horas

todas as horas são tidas
horas passadas, horas sofridas
horas agonias sinistra fantasia
horas que a hora não passa
horas frias de frágil desgraça
cala prosa, escassez de poesia
todas as horas são tidas
horas poucas, horas moucas
vozes roucas, camas vazias

Penélope Martins


1º Parágrafo: O Mistério dos Sete Relógios


O afável jovem, Jimmy Thesiger, desceu a correr a grande escadaria de Chimneys, galgando os degraus dois a dois. Tão precipitada foi a sua descida que colidiu com Tredwell, o imponente mordomo, no momento em que este atravessava o vestíbulo com um abastecimento de café acabado de fazer. Devido à excelente presença de espírito e magistral agilidade de Tredwell, não se verificaram baixas.


* The Seven Dials Mystery foi originalmente publicado na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos em 1929.
* Foi o primeiro livro de Agatha Christie que foi deliberadamente escrito como sequela de outro dos seus romances, O Segredo de Chimneys.
* Adaptado à televisão em 1981, Harry Andrews estreou-se no papel de inspector-chefe Battle.

a-ver-livros: sem resposta e Maria Jose Taboas Cabral

Para onde vai
o tempo
que não sobra
perguntas 
ao tempo
que voa
o tempo demora
na resposta
perdido a saber
da água no rio
como corre 
para o mar


* para saber mais sobre a pintora espanhola Maria Jose Taboas Cabral
siga o link www.artistasdelatierra.com/artistas/MJTABOAS

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Mia Couto vence o Prémio Camões

Acaba de ser anunciado o Prémio Camões: Mia Couto. 

Escritor e jornalista moçambicano, António Emílio Leite Couto nasceu em 1955, na Beira, filho de uma família de emigrantes portugueses chegados a Moçambique no princípio da década de 50. Fez a escola primária na Beira. Em 1971, iniciou os seus estudos de Medicina na Universidade de Lourenço Marques (actualmente, Maputo). Por esta altura, o regime exercia grande pressão sobre os estudantes universitários. Ligado à luta pela independência de Moçambique, tornou-se membro da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).

A partir do 25 de Abril e da independência de Moçambique, interrompeu os estudos para trabalhar como jornalista, em primeiro lugar, em "A Tribuna" , juntamente com Rui Knopfli. Nessa altura tornou-se também director da Agência de Informação de Moçambique (AIM). Participou na revista "Tempo" até 1981, ficando, depois, no "Notícias" até 1985. Altura em que ingressou na Universidade Eduardo Mondlane para tirar o curso de Biologia.

*In Infopédia. Porto: Porto Editora, 2003-2005.


O vencedor do prémio literário mais importante da criação literária da língua portuguesa é o biólogo e escritor moçambicano autor de livros como Raiz de Orvalho, Terra Sonâmbula e A Confissão da Leoa . É o segundo autor de Moçambique a ser distinguido, depois de José Craveirinha em 1991.

A escolha foi decidida por um júri, que reuniu durante a tarde desta segunda-feira no Palácio Gustavo Capanema, sede do Centro Internacional do Livro e da Biblioteca Nacional, e de que fizeram parte, do lado de Portugal, a professora catedrática da Universidade Nova de Lisboa Clara Crabbé Rocha (filha de Miguel Torga, o primeiro galardoado com o Prémio Camões, em 1989) e o escritor e jornalista (director do Jornal de Letras) José Carlos Vasconcelos. E também os brasileiros Alcir Pécora, crítico e professor da Universidade de Campinas, e Alberto da Costa e Silva, embaixador e membro da Academia Brasileira de Letras, o escritor e professor universitário moçambicano João Paulo Borges Coelho e o escritor angolano José Eduardo Agualusa.

*in Público. 

Adeus Nuno Guimarães. «se eu morrer».

se eu morrer

escuta amor
se eu morrer
estarei perto do céu
e os meus últimos beijos
irão chover sobre ti
inundando-te aos poucos
com águas dos meus desejos
as conversas
voltarão a nascer no teu jardim
e à noite
quando não conseguires dormir
apanha-as só para ti
na mesa, terás cerejas
ao jantar, a luz das velas
derretendo o teu sorriso
rio que eu preciso
ver correr só para mim
escuta amor
se eu morrer
não sei se me vais ver
serei vento, serei mar
serei tempo, o tear
onde estenderás devagar
as nossas pequenas histórias
e entrelaçando os finais
que ficaram por nascer
encontrarás os sinais
que eu receei te dizer

escuta amor
se eu morrer
este poema é só teu
cuida dele com teus dedos
deixa-o falar nos teus lábios
como se ele fosse eu


Nuno Guimarães



1º Parágrafo: O Inquisidor


O professor Tripler saiu do Robert Lee Building, sede do Departamento de Astrofísica da Universidade do Texas, com um ar muito circunspecto. Sondou os caminhos do campus, detendo-se nas sebes e nos pequenos grupos de estudantes, e depois começou a andar com passo rápido, olhando continuamente em volta. Não se apercebeu, porém, de que um jovem de cabelos muito negros, com uma barba espessa e encaracolada e uma expressão determinada no rosto, tinha saído logo a seguir e caminhava atrás dele, afastando-se para um lado e para o outro de cada vez que o professor mexia a cabeça.


* Tradução do Italiano de Regina Valente
* Valerio Evangelista, ex-professor de História, nasceu em Bolonha, em 1952

A surpresa: inéditos de Herberto Hélder

ilustração Maria Henriques
Esta é a novidade da semana. Na verdade, talvez a novidade do ano, anunciada de surpresa há poucos dias.
"Servidões", poesia inédita de Herberto Hélder, com selo da Assírio & Alvim e capa assinada pela artista plástica Ilda David, chega hoje às livrarias - e, claro, também à Feira do Livro de Lisboa. O volume reúne mais de 70 novos poemas e uma prosa inicial do autor, biográfica, na qual evoca a ilha da Madeira, onde nasceu. 

Aos 82 anos, o poeta que não dá entrevistas há uns trinta decidiu que haverá uma só edição autónoma deste livro, com tiragem de três mil exemplares. Mais tarde virá a integrar a nova edição de "Ofício Cantante", que reúne toda a sua poesia. Sugiro que leiam este artigo para saber mais.

E que aproveitem este presente maravilhoso oferecido pela TSF e pela voz carismática de Fernando Alves. Nada menos do que a leitura de sete destes poemas inéditos, para ouvir uma vez. E outra. E outra. 


http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Vida/Interior.aspx?content_id=3241601

a-ver-livros: na feira e Malie Baehr

Leva-me à feira
quero o cheiro do papel
a competir com o das árvores
não sei qual dos dois
me traz mais recordações
se a sombra de umas
as páginas de outros
ou apenas quem fui 
sob o manto protector
de cada

* para saber mais sobre a pintora holandesa Malie Baehr
siga o link www.maliebaehr.com

domingo, 26 de maio de 2013

Poema à noitinha... o «até amanhã» de Eugénio.

Até Amanhã

Sei agora como nasceu a alegria,
como nasce o vento entre barcos de papel,
como nasce a água ou o amor
quando a juventude não é uma lágrima.

É primeiro só um rumor de espuma
à roda do corpo que desperta,
sílaba espessa, beijo acumulado,
amanhecer de pássaros no sangue.

É subitamente um grito,
um grito apertado nos dentes,
galope de cavalos num horizonte
onde o mar é diurno e sem palavras.

Falei de tudo quanto amei.
De coisas que te dou
para que tu as ames comigo:
a juventude, o vento e as areias.


*Eugénio de Andrade, in Até Amanhã


Handwritten Manuscript Pages From Classic Novels: As mil e uma noites.

Já alguma vez pensou ver As mil e uma noites desta forma? Então fique com uma das suas páginas

Visite o site http://flavorwire.com para encontrar mais. 
Siga o link directo.

Cronicando pela Ásia... Ilhas Phi-Phi by night

Ko Phi-Phi, 
27 de Abril 2009

A dança do fogo é a principal atracção nocturna da ilha. Correias com uma bola na ponta, um líquido próprio para o espectáculo, voltas e mais voltas - com os braços atados e desatados - a rodopiar e a atirar ao ar, passando o fogo por debaixo da perna ou rente à cabeça. Um fire show!

Esta é a principal actividade dos bares da praia, ali mesmo na areia. Grandes acrobacias ao som de um rock duro, bem pesado. E para o fim, um limbo especial: uma vara e um escadote. O desafio é tentar passar por baixo e descer a vara mais um degrau. Haja coragem!


Não se julgue que é a única diversão que se encontra. Para outros fanáticos, existe sempre a possibilidade de tentarem rebentar o balão do parceiro/a. O animador está ao centro. Como bom tailandês, não diz bem os "s". Isso transforma simples frases em verdadeiras pérolas, como por exemplo: people make some noi.

Muitos bares inundam a parte central da vila. As festas são dominadas por ingleses e australianos e bebe-se até cair para o lado. Até aqui, pensava que os ingleses eram os campeões da bebida... Mas os australianos estão ao mesmo nível ou até pior. Caso para dizer que aprenderam bem uns com os outros!

Recolho à pacatez de outra praia, noutra parte da ilha. Sou chamado por um som mais calmo, bem ali... nas ondinhas calmas do mar. Bebe-se uma cerveja, olha-se o horizonte e a lua, caminha-se pela areia... De volta ao paraíso.


Rodrigo Ferrão

Adeus Nuno Guimarães. O Clube de Leitores não te esquece.

O Clube de Leitores homenageia um dos seus maiores seguidores: o professor, escritor e poeta Nuno Guimarães.

É com tristeza que soubemos da sua morte. E é com profunda admiração que celebramos a sua vida. Com as suas palavras.

POESIA MINHA: desiste

Quando o peito não cabe
dentro do peito.
Quando o coração se passeia
pelo corpo todo.
Quando a garganta está cheia de automóveis
como uma cidade à hora de ponta.
Quando o cérebro tem um LP riscado.
Quando o futuro tem um só segundo.
Quando as paredes contam histórias
e o telefone soma silêncios.
Quando nos olhos
não para de chover.

Desiste.

Nuno Guimarães