sábado, 18 de dezembro de 2010

O culto do Chá, Wenceslau de Moraes


'Wenceslau José de Sousa de Moraes nasceu a 30 de Maio de 1854, em Lisboa, onde se tornou oficial da marinha de guerra.

A sua actividade literária inicia-se em Macau onde foi imediato da capitania do porto e professor no liceu-seminário, ao mesmo tempo que Camilo Pessanha, que mais tarde, já consumido pela tuberculose e o ópio, viria a ser reitor interino.

Wenceslau de Moraes deslocou-se depois para o Japão onde, em 1898 se tornou cônsul em Kobe, cargo que exerceria também em Osaka.'

Este pequeno livro é uma viagem ao Japão desconhecido. Às profundezas das gentes, ao campo. A todas as tradições do cultivo desta bebida. À história dos portugueses que por lá passaram.

Com ilustrações de Yoshiaki, a Relógio D'Água cedeu os direitos à Biblioteca editores Independentes que organizou esta obra.

'O chá japonês, servido invariavelmente sem leite e sem açúcar, que lhe prejudicariam o aroma, é a bebida mais suavemente agradável que possa oferecer-se ao nosso paladar (não de todos, porém, mas um paladar sentimental, um tanto sonhador... que nisto dos nossos órgãos de sentir há temperamentos, aptidões afectivas características...).'

Um livro que desperta os sentidos.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Saudades

'Saudades! Sim... talvez... e porque não?...
Se o nosso sonho foi tão alto e forte
Que bem pensara vê-lo até à morte
Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?... Ah! como é vão!
Que tudo isso, Amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte
Deve-nos ser sagrado como pão!


Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar,
Mais doidamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais a saudade andasse presa a mim!'

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Poema aos amigos

Isabel Maria Vaz.
Amiga anónima. Deste mundo a teclados.
Uma leitora assídua deste blogue e de outros.
Desconhecida fisicamente. Nunca a vi. Nem de foto.
Escreveu-me outro dia. Com 'atrevimento', diz ela.
Com naturalidade, diria eu.
Com magia, acrescento.
Agradeço-lhe as palavras. O elogio. A força da dedicatória que me deixou.
Retribuo com o poema que escolheu.
Para todo o mundo que segue este canto.

Muito obrigado.


"Não posso dar-te soluções
Para todos os problemas da vida
Não tenho resposta para as tuas dúvidas ou temores,
Mas posso ouvir-te
E compartilhar contigo.

Não posso mudar
O teu passado nem o teu futuro.
Mas quando necessitares de mim
Estarei junto a ti.

As tuas alegrias
Os teus triunfos e os teus êxitos
Não são os meus,
Mas desfruto sinceramente
Quando te vejo feliz.

Não julgo as decisões
Que tomas na vida,
Limito-me a apoiar-te,
A estimular-te
E a ajudar-te sem que me peças.

Não posso traçar-te limites
Dentro dos quais deves actuar,
Mas sim, oferecer-te o espaço
Necessário para cresceres.

Não posso evitar o teu sofrimento
Quando alguma mágoa
Te parte o coração,
Mas posso chorar contigo
E recolher os pedaços
Para armá-los novamente.

Não posso decidir quem foste
Nem quem deverás ser,
Somente posso
Amar-te como és
E ser teu amigo.

Todos os dias, penso
Nos meus amigos e amigas,
Não estás acima,
Nem abaixo nem no meio,
Não encabeças
Nem concluís a lista.
Não és o número um
Nem o número final.

E tão pouco tenho
A pretenção de ser
O primeiro
O segundo
Ou o terceiro
Da tua lista.
Basta que me queiras como amigo.

Dormir feliz.
Emanar vibrações de amor.
Saber que estamos aqui de passagem.
Melhorar as relações.
Aproveitar as oportunidades.
Escutar o coração.
Acreditar na vida.

Obrigada por seres meu amigo."

Simplesmente único!

Exageros

O Alfredo atirou o jornal ao chão,
irritadíssimo, e virou-se para mim:

- Estes jornalistas! Passam a vida a
inventar coisas, é o que te digo. Então não
afirmam que, no Sardoal, foi encontrado um frango com três pernas!
Vê lá tu! É preciso ter descaramento.

Ajeitou-se melhor no sofá e, realmente indignado, coçou a tromba
com a pata do meio.


In Contos do Gin Tonic
dito por Mário Viegas

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Se isto é um homem - Porquê?

Desculpem, não fui eu que o escolhi, foi ele que me escolheu. E sim, já viram isto acontecer nalgum lado, mas é que eu acho que ele queria mesmo vir para este blog...

Se isto é um homem tem sido muito paciente comigo. Está na minha estante há demasiados meses e, por um motivo ou por outro, teve sempre que ficar para mais tarde. No entanto, há umas semanas decidi: "És o próximo!"
Quando o Rodrigo propôs que eu escolhesse o livro do mês de Dezembro, pensei que teria que adiar, uma vez mais, o meu encontro. A coisa boa dos livros é que eles nunca se aborrecem com estes percalços, mas acabam por adquirir uma autoridade moral- basicamente, fico sempre com a sensação que lhes falhei! Olhei para a lombada com dúvida e pena antecipada, mas a lombada devolveu-me um olhar muito vertical.
Em boa verdade, receava anunciar este livro por pensar que a maioria das pessoas já o tinha lido. Pensei também que talvez não fosse o mais adequado pelo carácter de relato, mais do que de peça literária, que encerra. No entanto, não demorei a perceber que ele já tinha ganho a ilustre corrida dos livros da estante da Carla quando reparei que também o Rodrigo já tinha sido escolhido por ele.

E como é que ele chegou à minha estante?
Eu tenho as melhores referências desta obra, dadas pelas pessoas da minha maior confiança literária. Tenho igualmente um interesse histórico, acrescido de uma curiosidade mórbida acerca de todos os pormenores que penso que irei lá encontrar. Há uns anos estive em Auschwitz e quero chocar-me uma vez mais, com mais distância mas com mais intimidade. Resumindo, é, para mim, um cocktail de obrigatoriedades.

E foi assim que ele encontrou o caminho pra cá.

E porque acredito no poder de sedução dele, vou-me calar e pô-lo a dizer as suas primeiras palavras:
Fui capturado pela Milícia fascista a 13 de Dezembro de 1943. Tinha vinte e quatro anos, pouco bom senso, nenhuma experiência e uma acentuada inclinação, favorecida pelo regime de segregação ao qual desde há quatro anos fora obrigado pelas leis raciais, para viver num mundo só meu, pouco real, povoado por civilizados fantasmas cartesianos, por sinceras amizades masculinas e por amizades femininas evanescentes. Cultivava um moderado e abstracto sentido de rebelião.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Excerto do livro do mês... Novembro!

Enquanto se aguardam análises mais profundas ao livro do mês de Novembro, vou dando mais umas pistas ao público.

Tenho marcada uma página para partilhar convosco.

'Eu preferiria não o ajudar a ferir outras pessoas, meu amigo, ou a causar a si próprio outras feridas para além daquela que considerar ser o seu paraíso. O rato vive numa toca. É extremamente difícil viver numa toca; pelo menos, os pássaros considerariam que seria um mau paraíso. Por outro lado, a águia sentes-se em casa nos picos das montanhas e considera-se a rainha de todos os ventos. Ah, como isso é completamente absurdo, meu amigo! E os nossos pobres pássaros das charnecas voltam todas as Primaveras à Islândia e partem todos os Outonos voando com aquelas asinhas inúteis sobre o temível oceano. Mas não se pense que o fazem acidentalmente ou à sorte. Não, têm a sua filosofia própria, embora possam ser citadas autoridades para provar que se trata de um acto de loucura. Eu nunca faria isso. Eu defendo que se deveria ajudar todas as criaturas a viver conforme o seu desejo. Mesmo que um rato me dissesse que gostaria de viajar sobre o oceano e que uma águia afirmasse que estava a pensar escavar um buraco no chão, eu diria: Força nisso. No mínimo deveríamos permitir que os outros vivessem como cada um de nós pretende viver, desde que não os impedíssemos de viver como quisessem viver. Eu sei que é possível provar que tudo correria melhor se fôssemos todos minhocas e se vivêssemos todos no mesmo quintal, mas a águia pura e simplesmente não acredita na verdade, nem o rato. Eu estou tanto do lado da águia que adere a uma doutrina manifestamente falsa, como do lado do rato, que é tão humilde na sua maneira de pensar que escava para si um buraco no chão. Eu sou amigo das aves migratórias, embora, para ser simpático, elas adiram a filosofias dúbias, talvez até mesmo erróneas.'


in 'Os peixes também sabem cantar'. Capítulo 16, pág. 114/115.