sábado, 2 de março de 2013

Poema à noitinha... Maria do Rosário Pedreira

Ouça aqui.
Ou simplesmente leia... 
Porque não juntar as duas? 

-------------------

[Lê, são estes os nomes das coisas que]

Lê , são estes os nomes das coisas que
deixaste – eu, livros, o teu perfume
espalhado pelo quarto; sonhos pela
metade e dor em dobro, beijos por
todo o corpo como cortes profundos
que nunca vão sarar; e livros, saudade,
a chave de uma casa que nunca foi a
nossa, um roupão de flanela azul que
tenho vestido enquanto faço esta lista:

livros, risos que não consigo arrumar,
e raiva – um vaso de orquídeas que
amavas tanto sem eu saber porquê e
que talvez por isso não voltei a regar; e
livros, a cama desfeita por tantos dias,

uma carta sobre a tua almofada e tanto
desgosto, tanta solidão; e numa gaveta
dois bilhetes para um filme de amor que
não viste comigo, e mais livros, e também
uma camisa desbotada com que durmo
de noite para estar mais perto de ti; e, por

todo o lado, livros, tantos livros, tantas
palavras que nunca me disseste antes da
carta que escreveste nessa manhã, e eu,

eu que ainda acredito que vais voltar, que
voltas, mesmo que seja só pelos teus livros.



*in Poesia Reunida, Quetzal.

Bairro dos Livros: Ler é Manuel António Pina

Dia 9 de Março, o Bairro dos Livros celebra a sua 10ª edição com uma homenagem ao escritor e poeta.

O ponto de encontro será junto aos Clérigos, pelas 15h, para um desfile até à Associação de Jornalistas e Homens de Letras, com um programa de performances musicas e artísticas, que junta jornalistas, artistas, leitores e cidadãos anónimos, a favor da Poesia.

A Revista Literária Sítio junta-se ao Bairro dos Livros numa homenagem a Manuel António Pina. A tertúlia terá lugar no Café Orfeu no próximo dia 9, às 17h30. Vamos relembrar o Poeta e a sua obra numa conversa que começará com Álvaro Magalhães, Manuel Jorge Marmelo e Rui Lage e terminará a uma só voz com todos os presentes que quiserem relembrar Pina.

O cantor João Morais vai actuar no Café Orfeu, dando início à tertúlia.

(clique na imagem para ver o programa)

Entidades envolvidas:

Aventuras Urbanas
Associação de Jornalistas e Homens de Letras 
Café Orfeu 
Cultureprint 
Gambozinos 
Magalhães de Vénus 
Máscara Solta 
Porto Lazer 
Rádio Manobras 
Revista Sítio 
Sujeitas ao Verbo

*Evento no facebook: https://www.facebook.com/events/273253596138936/
Bairro dos livros em: http://bairrodoslivros.wordpress.com/ | https://www.facebook.com/bairrodoslivros

«A Esmeralda do Rei» - o livro de Paulo Pimentel lido por Emílio Miranda

Os livros são seres estranhos, providos de vontades… Com estranhos quero dizer misteriosos nas suas intenções e propósitos. Depois de escritos, tantas vezes impondo-se também à vontade dos seus autores, traçam o próprio caminho, descobrindo quem os desvende, nem sempre com pressas – como foi o caso.

Quando comecei a ler A Esmeralda do Rei, romance histórico de Paulo Pimentel, obra que forma um inédito «conjunto literário» com A Esmeralda O Rei, de Catarina Gaspar, no género de poesia, (de que já falei em anterior ocasião – muito bem, aliás, pela excelente impressão causada) - ambas editadas pela Edições Mahatma, uma jovem editora que deixa antever na qualidade destes dois filhos literários a exigência tantas vezes arredada de outras congéneres maiores -, percebi de imediato que estava perante uma obra de raro valor, tanto pelo enredo, como pela exímia utilização da nossa língua, facto tão pouco comum em muitas das obras «apressadas» que enchem as prateleiras das nossas livrarias.

Em A Esmeralda do Rei impera a riqueza das palavras associada à riqueza da investigação histórica, de uma profundidade e rigor que não nos deixa, não pode deixar-nos, indiferentes.


É um romance histórico sublime, este que narra os amores de um dos nossos primeiros Reis por uma mulher de condição simples mas carácter e natureza invulgares. Narrada através dos olhos de Esmeralda, esta extraordinária personagem, a história avança, atravessando cerca de quatro décadas e seduzindo-nos, ao longo das suas mais de 400 páginas. Não se trata de um romance ligeiro, de cordel, mas de uma obra fabulosa que nos encanta a cada página lida e que – damos por nós a pensar - não nos exige chegarmos ao final para nos sentirmos satisfeitos com a mestria do seu autor, no manuseio das palavras. Poética, a linguagem encanta-nos, valendo cada pequeno texto por si só.

Percebe-se na leitura a paixão de quem escreve «com paixão» e estranha-se apenas que uma obra desta qualidade não alcance, como outras, maior visibilidade nos escaparates.

Se demorei tanto tempo a concluir a sua leitura, tal deveu-se apenas à forma tantas vezes intrincada com que me entrego aos livros que leio, mas, como noutros casos anteriores, a demora apenas acentuou o gosto pelas palavras, pelo enredo bem entretido, pela sublime utilização da linguagem.

Parabéns ao Paulo Pimentel de quem aguardo, ansiosamente, outras obras.

Emílio Miranda

Uma outra forma de ler Bukowski: "The Genius Of The Crowd"

The Genius Of The Crowd: lido pelo próprio Bukowski.



The Genius Of The Crowd

Charles Bukowski

there is enough treachery, hatred violence absurdity in the average
human being to supply any given army on any given day

and the best at murder are those who preach against it
and the best at hate are those who preach love
and the best at war finally are those who preach peace

those who preach god, need god
those who preach peace do not have peace
those who preach peace do not have love

beware the preachers
beware the knowers
beware those who are always reading books
beware those who either detest poverty
or are proud of it
beware those quick to praise
for they need praise in return
beware those who are quick to censor
they are afraid of what they do not know
beware those who seek constant crowds for
they are nothing alone
beware the average man the average woman
beware their love, their love is average
seeks average

but there is genius in their hatred
there is enough genius in their hatred to kill you
to kill anybody
not wanting solitude
not understanding solitude
they will attempt to destroy anything
that differs from their own
not being able to create art
they will not understand art
they will consider their failure as creators
only as a failure of the world
not being able to love fully
they will believe your love incomplete
and then they will hate you
and their hatred will be perfect

like a shining diamond
like a knife
like a mountain
like a tiger
like hemlock

their finest art

sexta-feira, 1 de março de 2013

a-ver-outros-livros no Metro: há poesia e O'Neill

Há dias em que corremos como loucos, num contra-relógio desenfreado, talvez para não perder o Metro. Talvez seja na estação do Aeroporto, em Lisboa, onde estão as caricaturas de António. Talvez acabemos por ver a porta da carruagem fechar-se no nosso nariz - e só sobra a imagem do poeta no mármore, olhando-nos por detrás dos óculos desmesurados, Alexandre O'Neill.

Alexandre Manuel Vahía de Castro O'Neill de Bulhões (Lisboa, 19 dezembro 1924 - Lisboa, 21 agosto 1986), publicitário inspirado e poeta surrealista. Sim, o lema "Há mar e mar, há ir e voltar" é dele. Sim, o poema "O Amor é o Amor" também é dele.

"O amor é o amor — e depois?!
Vamos ficar os dois
a imaginar, a imaginar?...

O meu peito contra o teu peito,
cortando o mar, cortando o ar.
Num leito
há todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor
e trocamos — somos um? somos dois?
espírito e calor!

O amor é o amor — e depois?
"

in 'Abandono Vigiado'

Mas na pressa do dia de hoje quero deixar-vos outro texto delicioso. Nesta época de best-sellers, O'Neill refere-se-lhes como 'bestas céleres' e deles fala assim em "Uma Coisa em Forma de Assim":

"Há quem lhe chame, por brincadeira, besta célere para caracterizar a qualidade mediana (tomada por média) desse produto cultural (agora é tudo cultural!) e, ao mesmo tempo, a rapidez com que ele se esgota em sucessivas edições. O best-seller é um produto perfeita (ou eficazmente) projectado em termos de «marketing» editorial e livreiro. É para se vender - muito e depressa - que o best-seller é construído com os olhos postos num leitor-tipo que vai encontrar nele aquilo que exactamente esperava. Nem mais, nem menos. Os exemplos, abundantíssimos, nem vale a pena enumerá-los. Convém não confundir, pelo menos em todos os casos, best-seller com «topes» de venda. Embora seja cabeça de lista, o best-seller tem, em relação aos livros «normais», uma característica que logo o diferencia: foi feito propositadamente para ser um campeão de vendas. A sua razão de ser é essa e só essa. E aqui poderia dizer-se, recuperando o lugar-comum para um sentido sério, que «o resto é literatura».

Estou a pensar em bestas céleres como Love Story ou O Aeroporto. Não estou a pensar em «topes» de venda como O Nome da Rosa ou Memórias de Adriano. estes últimos são boa, excelente literatura que, por razões pontuais e, muitas vezes extrínsecas à sua própria leitura, conheceram grandes êxitos de venda, o que é bastante diferente. Enquanto o best-seller é esquemático, quer dizer, não comporta mais do que o necessário, em termos de ingredientes, para comover (ou motivar, como é costume dizer-se) os simplórios, o livro «normal» nem pensa nisso. Nascido de uma necessidade interior, o livro «normal» chega ao leitor de dentro para fora. O best-seller é exactamente construído ao contrário: chega de fora para dentro ou, até de fora para fora, visto que a sua penetração no leitor não é nenhuma, ao passo que a sua propagação é imensa.

Habitualmente, o best-seller, ao fim de alguns anos, está esquecido ou, então, foi posto em cinema ou em TV e será, durante uns tempos, ainda lembrado, quase nunca em termos de literatura, que não é, mas apenas de história. O cinema ou a TV não podiam senão tornar ainda mais liso o que liso e correntio era.
Editores com o sentido da oportunidade aproveitam, então, para lançar ou desenterrar tiragens. que às vezes se vendem, outras não, mas sempre com a inevitável cinta: Um grande sucesso agora no cinema (ou na TV). Alimentam, deste modo, curiosidades menores do público: saber com antecipação o que vai acontecer (caso das séries televisivas, aliás «adiantadas» na Imprensa diária e semanal) ou ver até que ponto o cinema respeitou ou não respeitou a história original.

O best-seller é feito a pensar num leitor «espremido» por computador e serve a esse leitor tanto quanto lhe pode servir qualquer objecto de conforto. É um típico produto da chamada indústria cultural. Toma, exteriormente, a forma de livro para melhor se confundir com os verdadeiros livros. É uma espécie de ornamento (do espírito, da estante ou do caixote do lixo...) e cumpre, quase sempre, o seu papel, virada a última folha.
O best-seller pode ser preparado com muita habilidade e, para os desprevenidos, constituir, até, uma obra de qualidade. A propaganda fará o resto. Mas isso será só ilusão. O best-seller tem a qualidade apenas necessária para não comprometer a quantidade que alcançou ou deseja alcançar. Esse é o seu verdadeiro objectivo: quantidade e mais quantidade.
Hoje, que a literatura integra áreas cada vez mais vastas, uma há que não poderá integrar, a do best-seller, sob pena de se trasnformar no contrário de si mesma: o fabrico e o consumo de um produto que por acaso se chama livro."

Boa viagem!

Do texto à têxtil... Há seis meses abandonei profissionalmente os livros

Faz seis meses que abandonei profissionalmente os livros. Não o amor por eles.

Quando saí, deixei um depoimento no blog de uma pessoa que chefiou a minha última empresa neste mundo. Sem nunca termos falado muito lá dentro, a verdade é que a vida fez cruzar caminhos. E o nosso cruza-se de várias formas.

Hoje não divulgo a leitura ou o livro. Hoje sou pensador com palavra publicada.

*(carregue na imagem para ler o testemunho por completo)

1º Parágrafo: O Turista Acidental


Era para ficarem na praia uma semana, mas nenhum deles teve coragem para isso e resolveram regressar mais cedo. Macon conduzia. Sarah ia ao lado, de cabeça encostada contra a janela. Por entre os seus caracóis castanhos e emaranhados divisavam-se farrapos de céu.



* Tradução de Maria Lucília Filipe
* Adaptado ao cinema em 1988


a-ver-livros: astronomia e Andrej Mashkovtsev

Os planetas alinham-se
perpendiculares
ao coração que deixas 
no papel

E as ervas crescem
no caminho que em tempos ligou
fulgurante
as nossas galáxias

* para conhecer melhor o pintor russo Andrej Mashkovtsev
basta seguir o link www.artlondon.com

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Poema à noitinha... Octavio Paz

Teus Olhos

Teus olhos são a pátria do relâmpago e da lágrima,
silêncio que fala,
tempestades sem vento, mar sem ondas,
pássaros presos, douradas feras adormecidas,
topázios ímpios como a verdade,
outono numa clareira de bosque onde a luz canta no ombro
duma árvore e são pássaros todas as folhas,
praia que a manhã encontra constelada de olhos,
cesta de frutos de fogo,
mentira que alimenta,
espelhos deste mundo, portas do além,
pulsação tranquila do mar ao meio-dia,
universo que estremece,
paisagem solitária.

*Octavio Paz, in Liberdade sob Palavra 
Tradução de Luis Pignatelli


Octavio Paz

PRÉMIO NOBEL DA LITERATURA 1990

Escritor e poeta prolífico mexicano, Octavio Paz nasceu a 31 de março de 1914, na Cidade do México. Filho de um jornalista que se tornou secretário do revolucionário Emilio Zapata e neto de um autor de romances dedicados ao martírio indígena, beneficiou da extensa biblioteca do seu avô, interessando-se desde muito cedo pela literatura. Com o assassinato de Zapata, em 1919, a família de Octavio Paz foi forçada a exilar-se, demorando-se algum tempo nos Estados Unidos da América. De regresso ao México, ingressou no curso de Direito da Universidade Nacional mas, ambicionando vir a tornar-se poeta, não chegou a obter o seu diploma. Estreou-se em 1933 com a publicação da sua primeira colectânea de poemas, Luna Silvestre.

Em 1937 partiu para Espanha, com o intuito de tomar assento no Segundo Congresso Internacional de Escritores Anti-Fascistas, a decorrer na cidade de Valencia, mas acabou por combater nas fileiras republicanas durante a Guerra Civil Espanhola. Teve ocasião de conhecer colegas como Ilja Ehrenburg, André Gide e André Malraux. Simpatizando com os ideais comunistas, publicou nesse mesmo ano de 1937 Bajo Tu Clara Sombra y Otros Poemas e No Pasarán! obras que refletem as suas experiências em solo espanhol. Em 1938 participou na fundação de uma revista, Taller, que procurava estabelecer uma nova geração de escritores no México, ansiando pela liberdade em tons de surrealismo. Em 1943 viajou até aos Estados Unidos da América munido de uma bolsa atribuída pela Fundação Guggenheim, tomando contacto com a poesia modernista na Universidade de Berkeley.

Em 1945 entrou ao serviço do Corpo Diplomático Mexicano e foi enviado para Paris, onde escreveu Liberdad Bajo Palabra (1949) e El Laberinto De La Soledad (1950). Publicou a sua primeira experiência em prosa poética em 1951, com o título Águila O Sol?, e em 1956 apareceu El Arco Y La Lira, um ensaio sobre as literaturas francesa e espanhola. Depois de ter composto Piedra De Sol (1957) e cumprido uma missão no Japão, Octavio Paz foi nomeado embaixador do México na Índia, em 1962. Acabou por se demitir em 1968, em sinal de protesto contra o massacre dos estudantes na Praça Tlateloco, que se manifestavam contra o governo pouco tempo antes dos Jogos Olímpicos do México.

Seguiu então uma carreira académica, marcada pela passagem por instituições de prestígio como as universidades de Cambridge e de Harvard, mantendo a actividade editorial. Foi galardoado com inúmeros prémios, entre os quais se destacam o Neustadt, em 1982, e o Nobel da Literatura, em 1990.

Octavio Paz faleceu a 19 de Abril de 1998.
Octavio Paz. In Infopédia. Porto: Porto Editora, 2003-2011.

Conheçam a revista Poética - antologia de poesia e prosa-poética portuguesa contemporânea. O segundo número será lançado sábado, em Lisboa


POÉTICA 

A nossa visão do mundo, resulta sempre do conjunto das nossas vivências, inquietações, buscas e experiências várias, bem como da consciência de pouco saber e do desejo de o procurar. Um velho professor e amigo, Antero Costa Urbano, a quem devo também a grande paixão que tenho pela Poesia, escreveu: «A Poesia é a forma exotérica de uma visão do mundo. O poeta vê o mundo como vê, vê-o como mais ninguém o vê. Este mundo criado pelo poeta, recria em cada um dos outros um mundo que não é o mesmo do poeta, que também da criação primitiva se vai afastando. (...) O Poema é, no fim, um mundo-à-disposição, um mundo-despertador».

Toda a nossa Vida é uma demanda do Graal - procuramos crescer interiormente e, para tal (uns melhor que outros), dialogamos com a Tradição e Cultura em toda a sua riqueza e dimensão. A “diferença” dos homens reside aí, na intensidade e entusiasmo (o deus dentro de si) da busca, na vontade de se ultrapassar a si mesmo bem como na entrega de si, e, sobretudo, na humildade perante o universo e as certezas sobre o mesmo.

A tentação primeira, perante a leitura de uma qualquer obra poética, deve ser a de nada lhe perguntar pois talvez nenhuma pergunta seja possível. Escreveu Eduardo Lourenço nessa maravilhosa obra chamada Tempo e Poesia:«Compreender a poesia é olhá-la sem a tentação de lhe perguntar nada. É aceitar o núcleo de silêncio donde todas as formas se destacam. A obra vale pela densidade de silêncio que impõe. Por isso os poetas que imaginam dizer tudo são tão vãos como as estátuas gesticulantes».

Sabemos e sentimos que a Poesia é bem mais do que uma linguagem: energia-cósmica que impele a procura de nós, trilho do Graal,  mística, amor, paixão, algo sagrado. No poema, as palavras não são palavras, são “outra coisa” que tem a força e o sentido de uma oração a todos os deuses. Fruir poemas-oração, é como descansar serenamente - e por magia - sobre as águas do Mar num dia calmo e ao crepúsculo.

A Poesia condensa toda a vida espiritual da humanidade e, por isso, é também uma fonte de conhecimento; ela não é só evasão, fuga, liberdade criadora, lugar intemporal de todas as possibilidades, a Poesia pode e deve subverter, sublimar, exaltar, profetizar, despertar... O poeta é um “trabalhador” da possibilidade, da diáspora, do ócio-divino, da paixão, da angústia que o atira ao Infinito, da revolta, da esperança... O “verso certo” resulta também de muitas folhas rasgadas com palavras-dor, do Silêncio-Absoluto, do indizível, da nostalgia do Futuro e do rumo que o poeta dá à constelação de sentidos da palavra-poética que advém de um processo interno semelhante ao Mistério da Trindade. Cada poema constitui um mundo a descobrir e cada descoberta não é mais do que um meio para uma nova descoberta. Torna-se necessário cada vez mais, um satisfatório estado de insatisfação.

Ângelo Rodrigues
Coordenador literário da antologia Poética



CONVITE
A Editorial Minerva e os autores têm o prazer de convidar V. Exª, família e amigos, para a sessão de apresentação da POÉTICA II - antologia de poesia e prosa-poética portuguesa contemporânea - a maior antologia da CPLP! -, com 75 autoresa realizar no dia 2 (Sábado) de Março de 2013 pelas 16 horas na:

 BIBLIOTECA MUNICIPAL ORLANDO RIBEIRO

Antigo Solar da Nora - Estrada de Telheiras - Lisboa

(Próximo do Estádio do Sporting – Metro de Telheiras 
para o lado do Colégio Alemão – Carris: 47, 67, 78

Apresentação dos autores e da obra por Ângelo Rodrigues.
Todos os autores interessados terão oportunidade de uma breve intervenção.
Leitura de dois poemas da obra pelo actor e declamador 
von Trina.
Performance pelo grup
o de dança «Sevilhanas do Beira Mar de Almada»
com orientação da Profª Marisa Caeiro
.
Será servido um Porto de Honra

http://www.editorialminerva.com/

1º Parágrafo: O Amigo Americano


- O crime perfeito é coisa que não existe – disse Tom Reeves. – Tentar imaginar um não passa de um jogo de salão. Claro que podes sempre dizer que há uma quantidade de homicídios que nunca foram resolvidos. Mas isso é diferente. – Tom sentia-se maçado. Andava para trás e para diante à frente da lareira grande, onde crepitava um fogo fraco mas acolhedor. Tom sentia que falara duma maneira desagradável, dogmática. Mas o facto é que não podia ajudar Reeves e já lho dissera.


* Tradução de Mariana Pardal Monteiro
* Patricia Highsmith é muitas vezes definida como uma escritora de thrillers criminais psicológicos 

* Adaptado ao cinema em 1977


David pinta... Guillermo Cabrera Infante. David vem ao Porto no próximo sábado

David pinta... Guillermo Cabrera Infante


É no passado que vemos o tempo como se fosse o espaço. Tudo está longe, na distância em que o passado é uma imensa pradaria vertiginosa, como se caíssemos de uma grande altura e o tempo da queda, à distância, nos tornasse imóveis, como acontece com os acrobatas do ar, que vão caindo a uma enorme velocidade e contudo para eles nunca se cai. É deste modo que caímos na recordação. Nada parece ter-se movido, nada mudou porque estamos a cair a uma velocidade constante e só aqueles que nos vêem de fora – vós, leitores – dão conta de quanto descemos e a que velocidade. O passado é essa terra imóvel da qual nos aproximamos com um movimento uniformemente acelerado, mas o trajecto – tempo no espaço – impede-nos de nos afastarmos para ter uma visão que não seja afectada pela queda – espaço no tempo – voluntária ou involuntária. O tempo, ainda que parado, provoca vertigens, que é uma sensação que só o espaço pode provocar.

*Guillermo Cabrera Infante: in "A Ninfa Inconstante - ed. Quetzal

Aproveito o espaço desta rubrica para anunciar que a ilustração acima faz parte de um calendário especial que está à venda na livraria Papa-Livros, no Porto. Até sábado! Dia em que David Pintor estará neste espaço para uma sessão de autógrafos, com Carlos Nogueira, do livro da Tcharan: "O Grande Chefe". É às 16h30.

Os originais estarão em exposição. A não perder esta sessão por nada!

(clique para aumentar)

David Pintor em:
Blog: http://www.davidpintor.blogspot.pt/
Facebook: https://www.facebook.com/pages/David-Pintor-ilustraciones/197902626909227

a-ver-livros: frio e Pascal Blanchet

Fica no quente,
deixa-te estar
há um livro que precisa de ser lido agora

só os pássaros se deleitam
nas correntes de ar frio 

* para conhecer mais do trabalho do ilustrador canadiano Pascal Blanchet
siga o link  www.pascalblanchet.com

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Literatura e Cinema uma dupla FANTAStica



Este Programa segue o mesmo padrão dos Programas Especiais do Fantasporto anteriormente apresentados, sempre com uma temática anual diferente, reorganizando práticas, espectáculos e eventos paralelos que remontam à primeira edição do Fantasporto em 1981, e explorando o cruzamento do Cinema com as Artes e as Ciências.

Assim, foram já dedicados Programas Especiais às seguintes temáticas:  Arquitectura (2009), Robótica e Efeitos Especiais (2010), Artes Plásticas (2011),  A Problemática do Futuro e a Ficção Científica (2012).

Estes Programas têm como parceiros habituais especialistas de entidades como a Universidade do Porto e Universidade Católica, assim como diversos profissionais das  áreas em questão.

O espectro deste Programa Especial é muito amplo, incluindo debates, exposições, conferências e apresentações de novas publicações, sempre no Teatro Rivoli.

Este Programa Especial é único no universo dos Festivais de Cinema, estando já a ser esboçado por festivais como Sundance e Sitges.

Literatura e Cinema 2013


2013 é o ano da LITERATURA, pedra fundamental da boa escrita de Argumento, da Crítica Cinematográfica e da Cultura em geral.

O festival apresenta, assim, aos seus espectadores, e mais uma vez pela voz de escritores e investigadores profissionais, áreas da Cultura que lhes permitirão compreender melhor o processo criativo e de investigação que existe por detrás dos filmes. Serão apresentados diversos livros que abrangem a maioria dos géneros literários- romance, conto, poesia, conto infantil, conto fantástico, ensaio.


Dia 28 Fev- 5ª feira- 17 h
PROGRAMA ESPECIAL - CONFERÊNCIA

Prof Doutora Zulmira Santos (Faculdade de Letras da Universidade do Porto):

“O Estado da Literatura Portuguesa”


Dia 1 Março, Sábado- 20.30h
INAUGURAÇÃO DA EXPOSIÇÃO DE ESCULTURA DE PAULO NEVES

Átrios do Pequeno Auditório (“Santas”) e Grande Auditório do Rivoli (“Guardiões”)


Dia 2 Março- Sábado- 17h
PROGRAMA ESPECIAL –APRESENTAÇÃO DE LIVROS

Morte com Vista para o Mar” de Pedro Garcia Rosado

Romance Policial. (Contacto: pedro.garcia.rosado@gmail.com)


Dia 3 Março, Domingo, 17h
PROGRAMA ESPECIAL- APRESENTAÇÕES DE LIVROS

“Mensageiros das Estrelas- Antologia de Contos de Ficção Científica e Fantástico”.

Contos  de Ana Cristina Luz, António de Macedo, António Pedro Saraiva, Cristina Flora, Isabel Cristina Pires, João Afonso Machado, João Seixas, José António Barreiros, Luísa Marques da Silva, Luís Filipe Silva, Maria de Menezes, Miguel Garcia, Nuno Fonseca, Octávio dos Santos, Ozias Filho, Pedro Manuel Calvete, Sacha Andrade Ramos e Sérgio Franclim. Coordenação de Adelaide Meiras Serras, Duarte Patarra e Octávio dos Santos  Edição do Centro de Estudos Anglísticos da Universidade de Lisboa / Fronteira do Caos (Contacto:  octaviodos santos@gmail.com)


Dia 4  Março- 2ª feira- 17h

PROGRAMA ESPECIAL- APRESENTAÇÕES DE LIVROS

“O Homem que Trazia Instruções”  de Beatriz Pacheco Pereira- Contos,  ilustrados pelos seguintes artistas plásticos: Maria Manuela Mendes da Silva, Helena Leão, Paulo Neves, Ludmila, Augusto Canedo, Antónia Gomes, Albuquerque Mendes, Francisco Laranjo, Catarina Machado, Mirene,  João Dorminsky, Agostinho Santos, Zulmiro de Carvalho, Otília Santos, Nazaré Álvares e Júlio Costa.Edium Editores (Contacto: beatriz.pachecopereira@gmail.com)



Dia 5 Março, 3ª feira- 18h
PROGRAMA ESPECIAL- APRESENTAÇÕES DE LIVROS

“Sete” de Danyel Guerra
Ensaios sobre a vida e obra de sete cineastas: Manoel de Oliveira, Luis Buñuel, Roberto Rossellini, Mario Monicelli, Glauber Rocha, J. P. de Andrade e Júlio Bressane. (Contacto: danyelguerra@hotmail.com)


Dia 6 Março, 4ª feira- 18h


60 ANOS DE “THE RED SHOES”- HOMENAGEM A MICHAEL POWEL

CONFERÊNCIA

“The Work of Michael Powell”/ A obra de Michael Powell” por Ian Haydn Smith, editor of Curzon Magazine (proferida em língua inglesa/in English)



Dia 7 de Março, 5ª feira- 18h

PROGRAMA ESPECIAL- APRESENTAÇÕES DE LIVROS

“Abaddon” de  Rui Madureira
Romance (Contacto: rui.madureira@hotmail.com) Apresentação: Nuno Reis (ScifiWorld Portugal)


Porque são bloggers como nós e nos cruzamos muitas vezes, vale a pena também ir espreitar:

Dia 8- 6ª feira- 15h

4º ENCONTRO IBÉRICO DE BLOGS DE CINEMA

O encontro anual dos maiores cinéfilos da Península Ibérica no Fantasporto.

1º Parágrafo: A Beltraneja


Bastou-me a pergunta da princesa Joana para recordar como aquela infâmia tinha começado.


* Tradução de João Costa

a-ver-livros: na biblioteca com Candida Hofer

Respira devagarinho, amor
não perturbes as letras que descansam
agora
bailaram toda a noite nos meus olhos
a dança perfeita da poesia

* para conhecerem mais sobre a fotógrafa alemã Candida Hofer
siga os links /www.museomagazine.com/CANDIDA-HOFER e também este sobre esta foto
da Biblioteca de St. Gallen, na Suiça www.tate.org.uk/art/artworks/hofer-stiftsbibliothek-st-gallen«

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

As histórias loucas... dentro da leitura conjunta deste mês. É obrigatório ler Hrabal. É óptimo ler «A terra onde o tempo parou».

Está quase a chegar o fim deste mês e a leitura que acompanhamos em Fevereiro. Até à conclusão do livro, deixo esta história hilariante. Contada, claro está, pela grande personagem: o mítico Tio Pepi.

foto tirada daqui.

(...) chamado Jarunka, aquele que é ajudante do chefe da estação (...) sabes o que é que lhe aconteceu? Como adormeceu em serviço, a telegrafista tirou-lhe o pénis para fora das calças e o chefe da estação pintou-o com a tinta de carimbo e o Jarunka, ao chegar de manhã a casa, sem tirar o uniforme, quis dar à senhora Jarunkova a maior prova de amor, e a senhora disse que sim, mas mal o senhor Jarunka tirou o pénis para fora, para passar ao acto, segundo o tratado do senhor Baptista, ao acasalamento, aliás, ao acto sexual, a senhora Jarunkova assustou-se com aquele pénis pintado de roxo, correu a ralhar com o chefe da estação, por causa das porcarias que se faziam aí durante as horas de serviço, e como invadiu o escritório logo de manhãzinha apanhou o chefe da estação, careca, a pentear uma peruca que tinha na mesa sobre uma cabeça artificial, antes do serviço; a senhora Jarunkova teve de pegar no sabonete e lavar o pénis do senhor Jarunka no tanque, mas a tinta não saía, então pegou no desoxidante que tinha para a limpeza das retretes, mas o senhor Jarunka pôs-se a berrar e correu, com o pénis de fora, através da aldeia até à estação e de volta; as pessoas assustavam-se, primeiro, porque estava de uniforme, segundo porque tinha o pénis roxo e depois, porque berrava muito...

*in A terra onde o tempo parou - Bohumil Hrabal, edições Afrontamento.

David Pintor no Clube de Leitores

Inauguramos mais uma rubrica em parceria com David Pintor: conhecido ilustrador galego nascido em 1975. David ilustrou alguns livros que estão traduzidos em Portugal e ganhou inúmeros prémios tanto em Espanha como noutros países. Formado em arquitectura, é na ilustração que encontra a sua verdadeira paixão.

David Pintor vai estar connosco numa rubrica muito interessante: conjuga a ilustração de conhecidos escritores com os seus pensamentos. 

Dirigindo-se aos que acompanham o Clube de Leitores, deixou-nos estas palavras como mote. Fica feito o convite para esta viagem. 

Estoy en una habitación con un gran ventanal desde el que se puede ver el mar. Se nota el calor de la luz del sol. En una pared hay una copia de una ilustración de Mattisse titulada "Palomas", de 1948. Cojo un cilindro de madera relleno de carbón vegetal y lo poso con suavidad sobre una lámina de papel. Empiezo a moverlo y aparece de la nada una línea que sube, describe una curva y vuelve a bajar. De repente, aparece por la esquina del papel un barco lleno de mil piratas armados hasta los dientes. De la otra esquina bajan una pareja de enamorados que se posan en un bosque encantado del que empiezan a salir tigres, elefantes, hipopótamos y hasta una traviesa ardilla que va saltando de árbol en árbol. ¡Vaya!, una caravana de circo acaba de llegar y se acaba de instalar en un claro de la hoja. Los mil piratas gritan entusiasmados ante la posibilidad de asistir al mayor espectáculo del mundo...y todo esto sin salir de un papel...

*mais sobre a biografia do escritor aqui. 

David pinta... Clarice Lispector


Uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora da minha própria vida. 

*Clarice Lispector: in "Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres" - ed. Relógio D'Água

David Pintor em:
Blog: http://www.davidpintor.blogspot.pt/
Facebook: https://www.facebook.com/pages/David-Pintor-ilustraciones/197902626909227

1º Parágrafo: A Herança do Vazio


Durante todo o dia, as cores tinham sido as do crepúsculo, com a bruma a deslocar-se, qual criatura marinha, pelas grandes encostas de montanhas possuídas por sombras e profundezas oceânicas. Visível por breves instantes sobre a neblina, o Kanchenjunga era um pico distante, aguçado pelo gelo, concentrando a derradeira réstia de luz, com uma pluma de neve soprada até uma grande altitude pelas tempestades no seu cume.



* Adaptação para a língua portuguesa: Vera Falcão Martins



a-ver-livros: provocação e Quint Buchholz

Sim, estou a provocar-te.
Vem cá. Leva-me.
Lê-me.
Deixa-me entrar na tua mente
varrer teias de aranha
deixar dúvidas
perguntas novas
colocar vírgulas onde antes
tinhas pontos
parágrafos

Quero inquietar-te
mudar-te as sombras de lugar
e oferecer-te outras ruas
jardins
mares
marés
guiar-te à bolina
até à próxima provocação

* para conhecer mais do trabalho do alemão Quint Buchholz
é só seguir o link www.quintbuchholz.de

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

a-ver-outros-livros no Metro: Nemésio no canal

Talvez o olhem impávido no mármore e lhe reconheçam ainda a expressão do olhar. Afinal, no tempo em que só havia um canal de televisão, Vitorino Nemésio entrava-nos pela casa adentro aos sábados à tarde com a sua charla "Se Bem Me Lembro". Eu era miúda - e lembro-me bem que pedia para ser das irmãs a primeira a tomar o 'banho grande' de fim-de-semana para poder depois ficar especada, enrolada ainda na toalha, a olhar o pequeno ecrã e aquele homem fascinante e expressivo que falava de coisas que eu ainda não entendia mas que já adivinhava.

Agora ali, na parede da estação do Aeroporto onde o imortalizou o cartoonista António, a quem o Metropolitano de Lisboa encomendou a decoração artística daquele apeadeiro, nada diz. Mas consegue ainda provocar a curiosidade de quem pergunte "e quem era este?", acabando quem sabe, por prestar-lhe a maior de todas as homenagens, lendo-lhe um poema, um ensaio, o romance "Mau Tempo no Canal", a sua obra maior.

Vitorino Nemésio Mendes Pinheiro da Silva (Açores, 19 dezembro 1901 - Lisboa, 20 fevereiro 1978), professor e romancista, historiador e jornalista, poeta e pensador, o homem que disse "Gosto da Horta como de nêsperas" e que definiu, em 1932, o conceito de 'açorianidade'. "Em primeiro lugar o apego à terra, este amor elementar que não conhece razões, mas impulsos; e logo o sentimento de uma herança étnica que se relaciona intimamente com a grandeza do mar."

Reza a história que, pouco antes de morrer, pediu ao filho para ser sepultado no cemitério de Santo António dos Olivais, em Coimbra. Mas pediu mais: que os sinos tocassem o Aleluia em vez do dobre a finados. O seu pedido foi respeitado.

Se este facto me comove, a minha alma romântica entusiasma-se mais com a intensidade da paixão daquele que foi, mais do que qualquer outra coisa, poeta. Quando foi internado no hospital onde haveria de morrer, Nemésio tinha em mãos o minucioso trabalho de cópia de um conjunto de poemas para o livro Caderno de Caligraphia, dedicado a D. Margarida Victória, Marquesa de Jácome Correia (a sua Marga) - e todos os poemas que o constituem são de amor e erotismo.

Não me alargo - deixo-vos um poema, só um. Mas, mais do que isso, deixo-vos a chave para (re)descobrir Vitorino Nemésio. Dois links (este e este), recheados de artigos interessantes, dados biográficos, poesia vária, entrevistas, um relato até da última aula que deu. Algo para registar nos favoritos e degustar com calma - ou devorar num ápice digno do entusiasmo que desperta. Quem sabe vos desperte o apetite para ir buscar "Mau Tempo no Canal". Será decerto excelente companhia para as vossas viagens no Metro.

"Outro Testamento

Quando eu morrer deitem-me nu à cova
Como uma libra ou uma raiz,
Dêem a minha roupa a uma mulher nova
Para o amante que a não quis.

Façam coisas bonitas por minha alma:
Espalhem moedas, rosas, figos.
Dando-me terra dura e calma,
Cortem as unhas aos meus amigos.

Quando eu morrer mandem embora os lírios:
Vou nu, não quero que me vejam
Assim puro e conciso entre círios vergados.
As rosas sim; estão acostumadas
A bem cair no que desejam:
Sejam as rosas toleradas.
Mas não me levem os cravos ásperos e quentes
Que minha Mulher me trouxe:
Ficam para o seu cabelo de viúva,
Ali, em vez da minha mão;
Ali, naquela cara doce...
Ficam para irritar a turba
E eu existir, para analfabetos, nessa correcta irritação.

Quando eu morrer e for chegando ao cemitério,
Acima da rampa,
Mandem um coveiro sério
Verificar, campa por campa
(Mas é batendo devagarinho
Só três pancadas em cada tampa,
E um só coveiro seguro chega),
Se os mortos têm licor de ausência
(Como nas pipas de uma adega
Se bate o tampo, a ver o vinho):
Se os mortos têm licor de ausência
Para bebermos de cova a cova,
Naturalmente, como quem prova
Da lavra da própria paciência.

Quando eu morrer. . .
Eu morro lá!
Faço-me morto aqui, nu nas minhas palavras,
Pois quando me comovo até o osso é sonoro.

Minha casa de sons com o morador na lua,
Esqueleto que deixo em linhas trabalhado:
Minha morte civil será uma cena de rua;
Palavras, terras onde moro,
Nunca vos deixarei.

Mas quando eu morrer, só por geometria,
Largando a vertical, ferida do ar,
Façam, à portuguesa, uma alegria para todos;
Distraiam as mulheres, que poderiam chorar;
Dêem vinho, beijos, flores, figos a rodos,
E levem-me - só horizonte - para o mar
"


1º Parágrafo: O Quarto de Hóspedes


Comecei por dispor a cama do quarto de hóspedes sobre um eixo norte-sul. Assim, a pessoa que nela dormisse ficava em sintonia com o fluxo de energia positiva do planeta, ou lá o que era. Ela havia de achar que sim. Fiz a cama com um lençol acabado de passar, um lençol cor-de-rosa clarinho, porque toda a gente sabia que ela tinha uma especial sensibilidade para as cores, e o cor-de-rosa fica bem a qualquer pele; mesmo que a pessoa esteja a ficar amarelada.


* Tradução de Maria José Figueiredo

a-ver-livros: a sombra e Daniel Cacouault

A sombra
escreve o teu nome
aos meus pés

para eu pisar
como mereces

* para conhecer mais da pintura do francês Daniel Cacouault
siga o link danielcacouaultsblog.blogspot.pt

domingo, 24 de fevereiro de 2013

dramaTEns 2013 – Concurso Anual de Dramaturgia do TEatroensaio


Já temos falado aqui do TEatroensaio e as novidades não param. Desta feita um desafio e um concurso. Vamos lá conhecer novos talentos na dramatugia portuguesa. O Clube de Leitores promete acompanhar bem de perto esta iniciativa. Vejam como podem e devem participar.

Objectivos:
Incentivar e divulgar a criação dramatúrgica em língua portuguesa.

Calendário:
Data de Abertura: 21 de Fevereiro de 2013.
Data Limite para a Entrega dos textos: 21 de Junho de 2013, 17h.
Data de Anúncio do Vencedor: 25 de Outubro de 2013.
Data de Publicação e Apresentação pública do texto: 13 de Dezembro de 2013.

Regulamento:

1. Quem pode concorrer?
1.1. Maiores de 18 anos.
1.2. Cidadãos portugueses (residentes ou não em Portugal) e cidadãos de países de Língua Oficial Portuguesa;
1.3. Não poderão concorrer autores que mantenham vínculo de natureza laboral ou cargo na entidade promotora (TEatroensaio – Teatreia Associação Cultural);
1.4. Os concorrentes poderão candidatar-se com um ou mais textos da sua autoria, desde que anónimos, originais e inéditos.

2. Qual o formato e tipo de textos a concurso?
2.1. Os textos a concurso têm tema livre e deverão ser escritos em português e serem originais e inéditos (sem qualquer apresentação prévia, seja sob a forma de leitura, espectáculo ou edição) nem premiados/distinguidos em concurso anteriormente. (mesmo com diferente título);
2.2. Texto tem de permitir um espectáculo com uma hora de duração (60m);
2.3. Número de personagens não superior a cinco.
2.4. Tipo de letra: Times New Roman, tamanho de Letra: 14, parágrafos/espaçamento entre linhas de 1 (simples).
2.5. Os originais deverão ser assinados com pseudónimo. Caso o concorrente se candidate com várias obras deverá assinar cada obra com um pseudónimo diferente.

3. Como e quando deverão ser entregues os textos a concurso?
3.1. Os textos deverão ser entregues até 21 de Junho de 2013 às 17h (hora de Lisboa).
3.2. A divulgação de qualquer elemento que permita a identificação do original e seu autor implica a exclusão do mesmo.
3.3. O Texto poderá ser remetido via email ou via correio registado.
No caso de ser enviado via email (recepção sujeita a confirmação via email):
- o texto deverá ser enviado para o email: dramatens.teatroensaio@gmail.com
O email emissor não poderá conter nenhum nome ou alusão ao autor, mas apenas ao pseudónimo. No caso de ser enviado por correio registado:
- o texto deverá ser enviado para a seguinte morada:
DramaTEns TEatroensaio
Rua Alfredo Keil, 243, h. 15
4150 – 049 Porto, Portugal
- O texto deverá ser enviado num envelope, donde constará no remetente apenas o pseudónimo respectivo. Os textos cujo carimbo ultrapasse a data de entregue serão excluídos do concurso;
- o texto deverá vir acompanhado de um envelope fechado contendo no seu interior o nome e contacto do autor, e no seu exterior o pseudónimo utilizado e o título do texto.
- os envelopes contendo o nome do autor do texto premiado serão abertos apenas após decisão final do júri.

4. Constituição do Júri
4.1. O Júri será composto por 5 elementos (sendo dois elementos pertencentes à direcção da Teatreia Associação Cultural e os restantes convidados pela mesma).
4.2. As decisões do júri não são sujeitas a recurso.

5. Prémio
5.1 O título da peça premiada e respectivo autor será anunciado a 25 de Outubro de 2013.
5.2. O texto vencedor será publicado na revista Nº2 “Ensaios de Teatro”.
5.3 O texto vencedor será lido publicamente a 13 de Dezembro de 2013,no Salão Nobre do Teatro Nacional São João no Porto, sendo esta leitura dirigida pela companhia TEatroensaio. Nesta sessão será entregue um troféu simbólico e uma cópia da revista ao autor.
5.4 O júri não é obrigado a atribuir o prémio, se assim o entender.

6. Disposições Finais
6.1. A entrega dos originais implica o conhecimento e a concordância do seu autor com todas as cláusulas constantes deste regulamento.
6.2. Os casos omissos ou dúvidas interpretativas serão resolvidos pelo TEatroensaio – Teatreia Associação Cultural, e da sua decisão não haverá recurso.