a cidade está deserta
e ao longe o semáforo verde dá-me ordem para seguir.
prossegue a vida, diz.
mas ele fecha mal chego ao seu encontro,
sinal inequívoco da necessidade de parar
e ceder passagem.
olho para a direita.
olho para a esquerda.
olho em frente.
espreito o retrovisor.
os meus olhos apontam ao céu.
e ninguém cruza.
conto os segundos, bato o pé de impaciência.
escuto as batucadas do coração,
descompensadas pela ausência de alguém que as eduque.
penso em mim.
penso na ausência de ti.
como seria bom que alguém trouxesse a tua solidão numa caixa.
poderia então juntar a minha tristeza à tua,
agitar os nossos medos
e daí resultar alegria.
o semáforo abre.
olho para todos os cantos onde tu possas estar.
mas não estás.
simplesmente não.
sigo viagem, volto a contar o tempo e penso na esperança que me guia até ao cruzamento seguinte.
será aí que morro?
ou será o destino em que te descubro
e convido a vires morrer comigo?
Rodrigo Ferrão
Foto: Rodrigo Ferrão