quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Eu poético: Jogo

JOGO

dizes que sou louco
quando grito ao vento
o teu nome.
dizes que sou tonto
por não saber controlar
o meu ímpeto.
dizes que sou parvo
quando tremo
ao falar de ti.

estamos numa corrida contra o tempo
e ele não joga a nosso favor.

nunca jogará.

neste jogo, neste jogo,
eu | não sei que mais diga, talvez
amo-te | daqui deste ponto até ao infinito,
tanto e tanto, | onde quer que estejamos,
| eu e tu, sejamos meros patetas,
assim, | lançados ao destino,
unidos | aos abraços que gostaríamos,
na plenitude, | de ter tido.
para sempre ... para sempre.

e se jogarmos antes ao futuro?

Rodrigo Ferrão

*aos leitores: descubram formas de ler este poema - ele em si é um jogo


Foto: Rodrigo Ferrão

Foto frase do dia: Kenko Yoshida

Encontrado na página For Reading Addicts

terça-feira, 10 de novembro de 2015

"Juventude mostrem a coragem"

Foi num destes dias que dei como conclusão a impossibilidade de me tornar num jovem de respeito sem me alistar numa juventude partidária. Rapidamente calcei as galochas vesti a gabardine desci as escadas num rápido e em menos de nada já estava no chinês do outro lado da rua perguntando ao senhor se não vendia rapas, não vende rapas, exatamente assim, teve o homem a princípio dificuldades de entendimento, naturais derivado à longínqua parecença de línguas, houve insistência de minha parte, fiz-lhe um desenho no canto de um calendário pousado sobre a mesa de atendimento, poucos segundos passados percebeu o homem o sentido do meu desejo, andou meia dúzia de metros apoiado em bengala demasiado curta e então uma caixinha com quatro rapas (e desta forma ficaram expostas as minhas genéticas qualidades para obras de arte, há de ser herança vinda de parte feminina).
Bom, pego no rapa, belo brinquedo que me foi dado a conhecer por familiares de tempo superior, pego no rapa, com perdão pela indevida quantidade de apartes, pinto-lhe em cada face umas letras organizadas em sentido de me juntar a estes ou àqueles, aos fulanos ou aos beltranos, enfim, isto haverá semelhanças entre todos, ficando aqui em aberto variáveis interpretações de serem as semelhanças reguladas por qualidade ou defeito, sendo facilmente detetável o meu entendimento nestas matérias.
(...)
De maneiras que fui hoje pela primeira vez a um comício, curiosa palavra provinda lá dos romanos, com fininhas diferenças de morfologia. Rapidamente me receberam com peculiar sentido de carinho, providenciaram-me a escolha de exercer esta ou aquela função, atalhei eu caminho pelo que achava mais proveitoso tendo em conta as minhas valências pessoais. Ora, perguntam vós com sensata dose de curiosidade por que afazer tive eu preferência, realmente é pergunta de se fazer, sujeito com tal conjunto de capacidades deverá, por certo, empenhar papel de grande responsabilidade e respeito social. Pois assim mesmo foi, nem menos nem mais, digo-vos que vesti o avental e então me dirigi à cozinha do sítio, descasquei batatas para o almoço dos ilustres, no fim da refeição fiz a recolha de pratos e a lavagem de talheres, sempre olhado com ganas de pouca simpatia e visível desprezo por meus colegas, tão promissores jovens, uns na arte de dividir, outros na de subtrair, com ressalva pela pequeníssima parte que de facto se nutre por intenções sensatas.

Gonçalo Naves


Imagem tirada daqui: http://tijolaco.com.br/blog/a-corrupcao-nao-e-dos-politicos-e-da-politica-como-ela-e-hoje/

nuance


ao longe o horizonte
um corpo frágil de azul-claro
desmaia entre nuances cor-de-rosa
como se o dia fizesse já parte do passado.


Helder Magalhães


Fotografia de Américo Rui Pacheco

Já vos aconteceu?

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segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Poema à noitinha: Daniel Faria

Entrei na sombra como alguém que via
Entrei devagar no ritmo de um salmo
E havia luz
Era uma luz como uma árvore quando cresce
E estando em flor era um dia inteiro
Entrei como sombra pela cintura como algo conquistado
Com o sangue a escorrer-me para os pés. Mas mesmo
Que não sangrasse eu entrava em triunfo
Inteiramente vencido.
Entrei para um laço sem saída porque era um nó aberto
E tinha os pés regados pelo sangue que dá vida
Tinha umas sandálias de sangue para caminhar livre
Entrei em morte sucessiva no que vive
Era a luz de uma árvore quando cresce
E se ensombra para não ficar sozinha

*Daniel Faria, de Homens Que São Como Lugares Mal Situados (1998)
 
 

Livros por todo o lado

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