quinta-feira, 10 de junho de 2010

Venha o livro de Junho!


O livro de Junho vai começar. Mas não seria justo arrancar com um novo sem eu fazer um juízo acerca do de Maio - 'o grande retrato', de Dino Buzzati. Na realidade, tenho-o lido há bastante tempo.

No entanto, julgo oportuno dizer que, as pessoas que o leram, facilitaram-me a vida. Manuel Cardoso e Paula (do blogue 'viajar pela leitura') acenderam uma enorme discussão em torno deste livro. Aliás, foram mais entusiastas que eu, leram-no mais rápido! A certa altura, pareceu-me que era um juiz de uma partida de ténis.

Eu resumiria o livro a uma ideia presente na página 117: "Onde nasce o nosso sentido de liberdade? Qual a sua origem última? A primeira e indispensável condição que nos faz sentir senhores de nós mesmos, mesmo numa prisão, mesmo diante de uma doença mortal? Que coisa é essa sem a qual nada nos restaria senão enlouquecermos?"

Endriade, personagem que marca o livro, é um cientista obcecado com a recordação da sua primeira mulher, Laura - morta num acidente de carro. Ele lidera um projecto de construção de uma gigantesca máquina, capaz de pensar e sentir como os humanos.

Ismani e sua mulher vão viver para a zona militar onde este projecto é secretamente montado. Mas, lentamente, vão percebendo que a máquina que vêem não é mais que a grande cisma de Endriade em adoptar a mesma à imagem da sua primeira mulher.

Este livro lança muitas questões. As que me parecem mais pertinentes são - até onde é que a ciência pode ir? Há limites? Esses limites deverão ser impostos ao cientista? Ou ele é movido, tal como todos, pela curiosidade de saber mais e mais?

Ler este romance de Buzzati trouxe-me muitas interrogações. E fez recordar questões que o nosso mundo tanto debate, nomeadamente a clonagem ou o uso de células estaminais para a investigação científica. Lembrei-me dos transgénicos ou do conhecimento do DNA. Trouxe à tona imensas perguntas que o meu pensamento já não colocava há muito...

Não sendo um livro do outro mundo, 'o grande retrato' tem o mérito de entreter o público. E, sem uma história brilhante, fazer com que o leitor reflicta. Estou contente com a escolha deste livro no mês que passou. Foi muito interessante acompanhar o diálogo entre os intervenientes e captar as sensibilidades de cada um sobre matérias extremamente importantes.

Hiroshima meu amor, Marguerite Duras


Ler este livro sem ver o filme poderá não fazer sentido para muitos. Isto porque nos imaginamos dentro daquele cenário à medida que desbravamos linha a linha. E porque não podemos ficar indiferentes à história de amor entre uma Ocidental e um Nipónico, nesta cidade que tem o peso histórico que tem.

Um livro que é um filme. Um romance que é uma história vivida. E uma autora que consegue sentir, com enorme sensibilidade, os dois mundos tão distantes de um Europeu e um Japonês. Distantes na educação, próximos num grande amor...

"voltar a ver-te hoje não é ver-te de novo. Em tão pouco tempo não se vêem de novo as pessoas"

Até qualquer livro!

A literatura portuguesa está mais pobre. António Manuel Couto Viana deixa para trás anos dedicados às letras, num país que tarda a reconhecer os seus talentos. Foi poeta, contista, ensaísta, actor, dramaturgo, encenador e figurinista. E, sem dúvida, um dos poetas que mais gostei de ler nos últimos tempos.

Deixo um poema, em nossa (sua) homenagem.


A poesia está comigo

Queres cantar fados, ler sinas
Por ruas tortas, escusas?
Ou tens pretensões mais finas?
- Não me esperem nas esquinas:
Não marco encontros a musas.

Cantem outros a desgraça
Em quadras fáceis, banais,
Cheias de mofo e de traça:
Soluços de fim de raça,
Com vinho, amor, ódios, ais.

E dos parques silenciosos
De estátuas, buxo e luar,
Cresçam sonetos cheirosos,
Requintados, vaporosos
Qual uma renda de altar.

Para mim basta o que tenho:
Umas rimas sem valia,
Mas próprias, do meu amanho;
Minha colheita, meu ganho
- Poesia! Poesia!

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Que Lareiras na Floresta, Alberto Pimenta

Alberto Pimenta é um grande poeta. Muitas vezes esquecido num espaço escondido. Este livro ('que lareiras na floresta') está na minha lista de compras para breve.

Dele, deixo este poema, que admiro bastante. Mas não é deste livro...

Já?

já tentaste praticar o bem
fazendo mal?
já tentaste praticar o mal
fazendo bem?
já tentaste praticar o bem
fazendo bem?
já tentaste praticar o mal
fazendo mal?
já tentaste praticar o bem
não fazendo nada?
já tentaste praticar o mal
fazendo tudo?
já tentaste praticar tudo
não fazendo nada?
e o contrário, já tentaste?
já?
seja qual for a tua resposta,
não sei que te diga.

Alberto Pimenta

Livros para venda


Tenho para venda os seguintes livros que um particular me pediu para anunciar. Comprometo-me a enviar para casa ou entregá-lo pessoalmente (no caso de enviar para casa, não assumo os portes). Disponibilizo nib para a troca. Estão como novos e a bom desconto... Aproveitem!

*Pessoa Inédito - Coordenação Teresa Rita Lopes - Livros Horizonte -1993 - estado novo - 13,00 (preço de mercado: 25.93€)

*Aparição - Vergílio Ferreira - Editora Bertrand - edição 1997 - 5,00 (preço de mercado: 12€)

*A Ninfa inconstante - Guilhermo Cabrera Infante - Circulo de Leitores - 2008 - 8,00 (preço de mercado: 17€)

*Brida - Paulo Coelho - Pergaminho - estado: novo - 5,00 (preço de mercado: 15€)

*Fúria Divina - José Rodrigues dos Santos - Gradiva - estado: novo - 12,00 (preço de mercado: 23€)

*McMáfia - Misha Glenny - estado:novo - 8,00 (preço de mercado: 16.90€)

*O Ovário de Eva - Clara Pinto Correia - estado: novo - 10,00 (preço de mercado: 21.45€)

*Para uma só voz - Suzana Tamaro - estado: novo - 8,00 (preço de mercado: 11.22€)

domingo, 6 de junho de 2010

O Operário em Construção, Vinicius de Moraes

Quer ler um grande poema, do tamanho de um livro? Vinicius, o 'poetinha' como era conhecido no mundo da música, publicou 'O operário em construção'. E se toda a sua música são poemas, então imagine-se a vida na escrita...

Este é um livro carregado de simbolismo. É, provavelmente, a mais emblemática ode deste grande poeta brasileiro, que deu voz a muita escrita que deixou.

O excerto não é deste livro, mas é, apenas, uma singela homenagem a um grande homem. Um homem que foi capaz de escrever coisas tão belas e carregadas de significado. Espero não ser o único a achar isso!

Procura-se um amigo

'Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar.

Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objectivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.

Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância. Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.


Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.'

O caderno da casa das nuvens, Vasco Graça Moura

Hoje o Vasco Graça Moura foi lá à loja. Como quem não quer a coisa, pedi-lhe que me assinasse o seu mais recente livro de poesia. Este livro passou um pouco ao lado do grande público, mas não a nós - eternos agarrados ao papel...