sábado, 31 de janeiro de 2015

Cronicando pela Ásia... adeus Ásia

Macau, Hong Kong e Mundo, 14 de Maio de 2009

Desperto com Macau uma última vez. Contemplo o horizonte com saudade e despeço-me. Caminho um pouco pela Taipa (pela zona das faculdades) e almoço na biblioteca. Não tenho muita fome, estou triste por voltar a Portugal. O desemprego aguarda-me de punhal erguido e sei que não lhe posso fugir, mal aterre.

Aqui vou no autocarro cheio. As águas castanho-chocolate estão serenas, assim como a cidade. Eu próprio pareço estar em suspenso, arrumando nas gavetas da memória todas as alegrias, todos os cheiros e todo o brilho desta viagem.

O senhor cobra-me o bilhete para o turbo jet. Com a frieza de quem o faz centenas de vezes ao dia. Será que ele imagina as histórias que carregam as pessoas que ali embarcam? Ah, se eu fosse aquele homem... talvez escrevesse um livro.

Para trás ficam os néons. Para trás fica um mês de avião em avião, de comboio para o barco, de camionetas e tuk-tuks. Para trás ficam templos, ruínas, praias de sonho, arrozais, crianças e pessoas de sorriso fácil.

Choro pela primeira vez. Choro porque mereço chorar. A saudade tem isso de belo. Junto a esse sentimento o desejo louco de fazer por perder o avião, largar e esquecer tudo o que me aguarda em Portugal. Começar de novo, ali, agora! Vamos voltar para trás, Rodrigo?

A razão vence a emoção na maioria das vezes. Nem sempre para o bem. Neste caso fica a incerteza. Podia ter sido uma pessoa diferente. Mas quem sabe se um dia não voltarei a esse ponto para resolver parte da vida e das memórias que ali deixei? Quem diz que o passado fecha todas as portas, só pode estar enganado...

Desta vez não vou ao centro de Hong Kong. O barco vai directo ao aeroporto maior do mundo. E lá entro eu no frenesim de asiáticos que vão para ali e para acolá. Vejo imensa gente de máscara, a gripe está aí.

Entro no avião, ele estremece e parte. E com ele estremece e parte uma grande parte de mim.

Rodrigo Ferrão 


 









 















Solução para as escadas

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Foto frase do dia: James Joyce

Uma questão de equilíbrio

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sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Eu poético: «separação»

separação

não tive coragem para te dizer adeus
e por isso escrevi uma carta.

no íntimo
queria fazer da despedida
um virar de página.

mas o que não queria,
o que não queria mesmo
...
era ver-te chorar.

deixei-te porque não desejava
que fosses ao fundo
com os meus medos,
com os fantasmas,
com o pânico das noites,
as minhas mãos suadas
e trémulas.
as vozes que ouvia
e não sabia explicar.
o medo louco da morte
ou de ficar só.

deixei-te para tentares a sorte
com alguém que te trouxesse o sorriso de volta.
deixei-te porque achei
que estavas a ficar parecida comigo.
deixei-te porque fugir
é sempre a solução mais fácil
no momento.

nem sabes o que me arrependo.
nem sabes como a solidão se instalou de vez.

imaginas como sonhava ter uma máquina do tempo,
viajar e apagar
as distâncias
que nos afastam?

pergunta retórica
nesta separação.

Rodrigo Ferrão

Foto: Rodrigo Ferrão

a-ver-livros: duas linhas

Duas linhas
Um medo

Perder-te

Ana Almeida

* para saber mais sobre a pintora britanica Linda Brill
siga o link http://www.lindabrillart.com/

Bai'má Benda: ...continuaçom do coisa anterior...

...continuaçom do coisa anterior...

 
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Poesia em matéria fria: música de Quintana

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quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

A divisão de sonho

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Gonçalo Viana de Sousa - O Flâneur das Sensações




Prezados leitores, a pedido de Gonçalo, transcrevo agora as palavras que este me dirigiu na semana anterior, por forma a criar um tal "Efeito de Real", diz o nosso flâneur.


Por isso, ainda que os ácidos sejam hoje algo distante, longínquo mesmo, peço-lhe encarecidamente que publique o final desta missiva como início deste prelúdio, deste texto antecâmara , melhor dizendo, deste ante-texto que terá continuação pelo menos durante duas semanas (dependendo dos cortes e acrescentos que lhe venha a fazer). O outro texto onde volto a referir Papa John, esse capitalista louco!, deixe-o para depois. Verá que, apesar de neste momento nada fazer sentido, quando tiver consigo o prelúdio e todas as outras partes terá algo mais luminoso (Assim o espero!).
(...)
Pois bem, meu querido jovem romântico por dentro, futurista das nuvens e das tempestades, o texto que se segue deve ser lido com a seguinte chave-mestra: tudo é mentira, tudo é ficção. O resto vem por acréscimo. Não comece a pensar em textos e liras amorosas assim escarrapachadas (desculpe a deselegância) em quatro tiras de papel pardo e barato! Isto não se trata de nenhuma novela nem de nenhum texto de alcova!
Tudo é ficção. Aliás, li algures, num destes modernos escritores do seu tão querido Pós-Modernismo (Post-Modernismo, para não dizer que sou teimoso) que a ficção, e não o cão, é o melhor amigo do homem. E esta, hein?
Tantas enciclopédias e artigos e reflexões numa só frase. (E eu que nunca pensei vir a ler tal coisa nesta literatura de pacotilha!).
Já li o poema que me enviou. Tem razão, os deuses não o incumbiram com a tarefa de tocar a lira de Safa! Melhor para si, pois nem todos podemos ser assim tão imbecilmente desimperfeitos! Melhor para si, que não tem que perder horas de um pedantismo de torres de marfim feitas de papel. Desista da poesia, invista na prosa!
Efraim disse o mesmo, o Vieirrrra não é poeta. Nem o padrrrrre foi! O que me ri com esta afirmação! Não pelos erres bárbaros e semitas, mas pelo alcance teológico, vestido do avesso, deste formidável judeu que venera Padre António Vieira.
Para a semana não publique o texto que conjuntamente com o seguinte lhe envio. (Sei que terá a tentação de o ler e sei de antemão que não encontrará algum sentido, tendo em conta que a ordem cronológica sou eu que a decido, não o José. Deixe-se de gavetas, homem!)
Um terrno abrrraço de Efrraim.
Outro, apertado, do
Seu

Gonçalo V. de Sousa.





Conhecemo-nos tarde demais.
O meu ser, tudo o que te poderia dizer, seria sempre pouco, para tentar explicar o tamanho, inatingível, da admiração e do espanto que sofro sempre que me deparo com o teu olhar, penetrante, doce, definitivo, como uma certeza perfumada de manhãs de Primavera. (Desconfia caro leitor. A ficção esconde verdades que não se dizem nem escrevem).
Não sei se gosto de ti ou se tudo não passa de uma admiração e de um coup de foudre romântico, ao jeito dos sociopatas que comigo partilham as noites por dormir, as insónias doces e musicais, líquidas de tanto desejo por cumprir. (É claro que não gosto de ti, a não ser que sejas de papel, como Maria Adelaide, ou então um sonho, Träume).
Quem és tu, Madonna das coisas eternas, que me hipnotizas com o teu sorriso capaz de calar qualquer tempestade, qualquer dúvida, qualquer medo? Quem és tu, menina de cabelos diáfanos e dourados, que me fazes navegar por montanhas de cumes inatingíveis, onde os sonhos são doces, belos, simples, ao alcance de um olhar terno. De um olhar que nunca me deste. Sonhos. (Cabelos diáfanos e dourados? Ninguém tem cabelos diáfanos! Margem de dúvida quanto ao dourado. Faltava só dizer que eram ligeiramente anelados!).
Conhecemo-nos tarde demais. (Quando é  que no conhecemos, agora falando seriamente?).
Sem dúvida que os teus cabelos, assim como o teu olhar, os teus lábios, o teu sorriso, o teu jeito, pensado e retido, de expor as tuas ideias, seriam um antídoto capaz de calar todas as falsas imortalidades de deuses que nunca passaram de devaneios nocturnos de uns quantos românticos que só tinham a noite, a neblina e talvez um piano como testemunhas de uma existência incompleta. (Tomar atenção com tanto devaneio. As tonturas literárias são fruto de tanto lodaçal escrito!).
Vislumbrei-te amável, nume, eterna, sempre sensualmente amável, meu tesoiro de trigo e de tardes parisienses passadas num café qualquer. (Sensualmente amável? Antinomia ou oximoro?)
Mas vi-te tarde demais, meu amor impossível. Já não sei escrever cartas de amor. (Algumas vez soube escrever cartas de amor? Realmente, impossível é, possivelmente, a palavra mais provável e credível!). Tudo o que poderia ser belo e poético e romântico foi desaparecendo como a cor de um belo quadro que se pretendia para sempre. (Vide Courbet, “A Origem do Mundo”).
Posso-te prometer o meu amor e a minha vida. Não te posso prometer as minhas palavras, nem o inefável que jamais encontrei nelas. (Não te posso prometer nada! Não se fazem promessas a quem não existe!).

Deixo-te o meu legado de silêncio e de dúvida. Torno-te herdeira de todos os meus sonhos, oh dourada senhora dos meus pensamentos perfeitos.

AVÓ

Tem sempre a mesma mancha nas calças. Não sabe que a tem porque nunca as despe e nunca se vê ao espelho. Diz que tem a cara num trapo e por isso não quer espelhos. Eu peço-lhe que compre um e ela a dizer que não é preciso, não é preciso não é preciso, dinheiro mal gasto menino. As rugas, transpiradas e profundas, contam histórias. Quando era miúda, dez anos talvez, saía de casa com a madrugada ainda lenta e plantava-se à porta da leitaria. Por ser a primeira conseguia trazer mais um quarto de pão e meio frasco de leite. Livro-vos da guerra mas não vos livro da fome, ela a escutá-lo com a face namorando o rádio, melhor que estes gatunos que só nos roubam menino.
Não lhe treme a caligrafia e nas palavras cruzadas tem excelente entendimento. As outras velhas invejam-na. Não são tão velhas mas têm uma velhice maior. Umas andam de bengala, pobrezinhas, desequilibram-se por tudo. Outras, mais ou menos mortas, passam o dia amarradas ao colchão. De noite não, de noite ganham vida e passeiam-se em grupos. Fazem excursões e deixam lá o tempo. Ela não, seja dia ou seja noite mantém o mesmo passo acelerado em direção a todo o lado. O passo leva-a e não deixa de existir.
Quem sabe ainda venha a morrer. Tenho em memória, tenho em boa memória a primeira vez que a vi. Eu bebé, ela velha, sempre foi, nunca deixou de ser velha. Mudou-me a fralda e quis pôr-me uma de pano. Tentou com afinco, braços fortes dominaram-me a resistência, quieto menino. Dizia que no tempo dela era assim que se fazia, não havia cá fraldas descartáveis e os meus filhos não morreram por causa disso menino. Modernices só fazem é mal e não servem para nada. Lavava-as uma vez por mês ou menos no tanque da roupa, tanque tão sujo. Não achei graça nisso. Fraldas de pano não me compunham a ideia, não sei porquê. Ela ainda as tem guardadas. Tem medo feio de precisar.

Gonçalo Naves
Foto tirada daqui: http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=726645

Tom Gauld: cartoon about football?

 

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Mundo só meu

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É do borogodó: Suavíssima, de Cecília Meireles

Os galos cantam, no crepúsculo dormente . . .
No céu de outono, anda um langor final de pluma
Que se desfaz por entre os dedos, vagamente . . .

Os galos cantam, no crepúsculo dormente . . .
Tudo se apaga, e se evapora, e perde, e esfuma . . .

Fica-se longe, quase morta, como ausente . . .
Sem ter certeza de ninguém . . . de coisa alguma . . .
Tem-se a impressão de estar bem doente, muito doente,

De um mal sem dor, que se não saiba nem resuma . . .
E os galos cantam, no crepúsculo dormente . . .

Os galos cantam, no crepúsculo dormente . . .
A alma das flores, suave e tácita, perfuma
A solitude nebulosa e irreal do ambiente . . .

Os galos cantam, no crepúsculo dormente . . .

Tão para lá! . . . No fim da tarde . . . além da bruma . . .

E silenciosos, como alguém que se acostuma
A caminhar sobre penumbras, mansamente,
Meus sonhos surgem, frágeis, leves como espuma . . .

Põem-se a tecer frases de amor, uma por uma . . .
E os galos cantam, no crepúsculo dormente . . .

- Cecília Meireles -

* escolhido por Penélope Martins

 

Emílio Miranda - A crónica de Um suicídio (1 a 5)

A Crónica de Um suicídio

 1.

A vida começa todos os dias. Não interessa o que está feito. Todos os dias a ciência de viver recomeça. Exigente.
Esquece o que fizeste. São coisas de nada, que é obrigatório aperfeiçoar. Em novas coisas de nada. Que nada são quando os dias nascem de novo.
(Mesmo que tenhas experimentado o sucesso. Mesmo que tenuemente o tenhas sentido…)
Tudo e nada andam de mãos dadas, como dois gémeos antagónicos. Nada sorri de tudo. Troça do que tudo faz. Tudo é nada e ambos sabem-no.
E um dia tu também o sabes, de uma forma que não te permite a redenção. Nenhum caminho te resta. Nenhuma janela aberta. Nenhum recanto onde esconderes o ridículo em que te tornaste. E então pensas na forma de poderes também tu transformares-te em nada. Um nada consolador, onde tudo se resuma ao silêncio. Ao esquecimento e à paz final.
E primes o gatilho de uma arma esquecida. Ancestral. E nada. Nada acontece.

2.

A luz intensa atinge-te, como uma bala fulminante. Rasga-te o nervo ótico, aloja-se num recanto da memória.
Não te lembras do dia em que nasceste, mas a primeira lembrança é aquela que te identifica com tudo o que passas a ser. Cheira-te a pão fresco, a fumo e a frio. Depois vês-te a comer sofregamente o pão que te queima o céu-da-boca. Sabes que acabou de sair do forno, cozido pela tua mãe, amassado durante longos minutos e levedado por horas. O pão é um alimento exigente. Por isso o comparas à vida.
Quando foi que surgiu essa analogia? Não sabes, mas é assim que há muito o vês.

3.

A dor crava-se na tua fronte esquerda. Palpita torturante. Por cima quente. Por baixo frio. Não sabes onde estás, nem o que és. Ou, porventura, no que te transformaste. Não sabes mais do que sempre soubeste. Que não sabes quem és.
Laivos de recordações atingem-te. Como um comboio em que viajas. Ruge na noite e pressentes, sentes, que lá fora, para lá da janela que silva, chove. Chove torrencialmente. Uma chuva fria. Álgida!
E é então que ela chega. Senta-se a teu lado, na carruagem cheia. E o perfume dela envolve-te como uma nuvem de bem-estar.
Que dura pouco. Tão pouco!
Sobrevém uma dor surda.

4.

A dor assinala uma ferida no joelho. Caiu quando corria. Estava quase escondido quando a queda o revelou. E como se não bastasse ainda havia a dor.
Chorou de vergonha.
Não chores – disse-lhe a Maria. É mais nova do que ele um ano e gosta mais do Joaquim do que dele.
Gosta tanto dela que às vezes lhe dói.
O avô riu-se e disse-lhe que eram ciúmes. E que ciúmes era o que se sentia quando se gostava muito de alguém que não nos queria…
Não sabia ainda que toda a sua vida tenderia a repetir-se…

5.

A primeira vez que viu o mar não imaginava, não podia supor que houvesse uma distância tão vasta feita de água, de reflexos e de espuma. Feita de cheiros, de sonhos e de fantasias.
Mas o avô disse-lhe que tudo quanto pudesse imaginar relativamente à vastidão do mar era muito menos do que a distância que haveria a percorrer.
Caso tivesse a coragem de se aventurar como os antigos marinheiros que haviam ousado ir pelo mundo.
Desconhecido.
Perigoso.
E tão povoado de medos!

*Emílio Miranda

Poesia em matéria fria: Lispector

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terça-feira, 27 de janeiro de 2015

têmpera


um poema em cima do joelho
como se as palavras fossem rótula

a punção do martelo de taylor
há-de erguer cada verso
e ainda que um fio de sangue se
derrame
a métrica escorrerá límpida
tímpanos adentro

os ossos encarregar-se-ão
de fazer ranger o tempo
ou a ausência dele
que a têmpera da sílaba
tanto a arte forja
como parte.

Helder Magalhães


(Fotografia "blackrock" de Daniel Curval)

a-ver-livros: aquele abraço

Inepto e inóspito
esse teu abraço
esse teu ensejo de fingir
os pés no chão
afinal enterrados 
no teu umbigo
Insano o passo
que não chega
para incutir o fardo 
íntimo e infantil
de saber de cor as linhas
das indagações
com que constróis
esse castelo
Chega insolente o dia
em que só o beijo
selará o pacto

Ana Almeida

* para saber mais sobre a ilustradora Laura Sua
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Bai'má Benda: Tudo, tudo, tudo, tudo...

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Lea, 6 anos

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segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Terra-Pátria

Quando fazemos a critica a um livro é absurdo tentarmos reproduzir e ou citar ideias dos autores, deixo isso para os autores e os leitores do mesmo. Cabe-me a mim como critico contextualizar e explicar o que é na generalidade e como apareceu a obra. Os autores Edgar Morin e Anne Brigitte Kern são dois sociólogos, o primeiro para além de sociólogo é filosofo e antropólogo, formado em Direito, História e Geografia e tem, no meu entender, neste livro o ponto alto do seu pensamento político. 

Antes sequer de passar às considerações profundas que este livro nos aponta temos que o contextualizar, escrito em 1993, logo após o colapso da União Soviética, em plena guerra civil Jugoslava e antes da universalização da internet e da chamada guerra ao terrorismo islamita e de todos os contra ataques que este efetuou, embora nessa altura já se tivesse anunciado O Fim da História por Francis Fukuyama (escrito em 1989) a parte dois deste pensador intitulada O Fim da História e o ultimo homem em que este argumenta que a Democracia Liberal é o ponto final da evolução histórica e política humana tinha acabado de sair. Terra-Pátria é deste modo um livro pré Era Métatecnica (identificada no livro com a revolução que tanto a internet como a cybernética iriam provocar no homem e na humanidade) mas após o colapso de um dos últimos sistemas de ditadura ideológica, o império socialista cientifico, a subsistir neste Planeta
 
Edgar Morin e Anne Brigitte Kern têm uma ideia principal que perpassa em todo o livro que é que o investimento no repensar político precisa de uma verdadeira re-fundação, a qual exige a reforma de pensamento e com este pressuposto detalham de forma interessante e resumida como se chegou onde estamos, na atual Era Planetária e o ponto de partida em que se encontravam, em 1993, numa síntese que denominam de: Agonia Planetária. Neste capítulo analisam os meta-problemas que o Homem e a Humanidade tinha para referirem quais as finalidades terrestres que estes podem alcançar, enfatizando a necessidade de uma reforma do pensamento capaz de conceber as coisas no seu contexto e definirem a comunidade de destino terrestre ao proporem-se assumir a Terra enquanto morada e, como uma sociedade-mundo, na qual os problemas globais ou supranacionais venham à frente das disputas de poder entre as nações, definindo deste modo não sem antes enquadrarem num capitulo anterior quais os pontos de identidade terrena que podem levar ao mesmo – o conceito de Terra-Pátria. A parte mais importante do livro, não fica ao que parece no final mas a meio do mesmo, pois ao falarem destas finalidades tentam enquadrar nestas o que de facto interessa, mas... 

E há sempre um mas, o problema é o confronto com a realidade e como é que se pode construir e/ou levar avante as realidades que o Homem e a Humanidade se podem propor a prosseguir de modo a que se atinja uma finalidade comum que culmine numa comunidade destino chamada de Terra-Pátria e lutar contra o impossível realismo e é aqui que aparece o conceito da Antropolítica como enquadramento para a construção de uma Utopia Realista (aliás existe um livro interessante intitulado Para uma Utopia Realista sobre os Encontros de Châteauvallon que se realizam precisamente à volta de Edgar Morin) desconstruindo o real e explicando as diferentes intensidades deste quer no tempo, quer nos valores, quer na política, quer e por fim na construção de uma utopia viável e realista.

A parte final é o ápice que me abstenho de explicar, pois retiraria a graça toda a quem pretende ler o livro. As perguntas que ficam são: Será que os autores conseguem ultrapassar o confronto com a realidade? E se o fazem a utopia que propõem é ampla e/ou limitada?

Quando os livros são desafiantes é o que me apetece deixar, o gosto para que leiam os mesmos e tirem por vós mesmos as conclusões que mais ninguém pode tirar. Como a próxima semana é a primeira 2.ª feira de Fevereiro, e analiso/critico livros de romance, poesia, viagens & best sellers, o livro que escolhi foi Il pendolo di Foucault e/ou O Pêndulo de Foucault de Umberto Eco, um romance e best seller que este publicou em 1988.

Saudações a todos os leitores e boas leituras,

.'.Sandro Figueiredo Pires.'.

EU



Se existo não sei, disseram-me que existindo não se sente. Não importa. Se para existir tiver que parar de sentir, vou não senti-lo, passando a existir em partes.

O
tempo, tempo já não me tem. Um livro sim, e quando o abro deixo de o ter porque a tê-lo já não sou eu próprio, e não me deixam deixar de me ser.

dias em que me sobe um desaconchego rápido. Vai-se cansando antes de chegar a manhã parecer. Outras noites me pesam sem eu lhes pensar. Já pouco me dói e vou aguentando. Aguentar tem que ser.

É
uma aparição que dói toda, quase todo, leva-me o Presente. Deixou-me uma carta escrita com palavras mais fortes. Enfraqueceu-as para eu as poder compreender- outro modo seria menos possível.

Vida
e vírgulas interrompem-me. Não há possibilidade de a viver senão for completo, senão existindo em continuidade.

Se o há, é vida.



Gonçalo Naves


Foto tirada daqui: 
http://campodapoesia.blogspot.pt/2010_12_01_archive.html