sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Contra-capa e abertura e abrimos um pouco a Claraboia

Capa da edição brasileira do livro Claraboia,
de José Saramago, editado pela Companhia das Letras


Na contra-capa:
"-Vivemos entre os homens, ajudemos os homens.
-E o que faz o senhor para isso?
- Conserto-lhes os sapatos, já que nada mais posso fazer agora."

Em epígrafe:
"Em todas as almas, como em todas as casas, além da fachada, há um interior escondido" de Raul Brandão, em Húmus.


A história acontece na Lisboa dos anos 50 num conjunto de seis apartamentos onde as angústias e os medos das personagens se misturam ao quotidiano da cidade. As paredes do prédio são as testemunhas oculares das seis histórias que se completam e que a cada página se transformam. De uma simplicidade ímpar, muito do que conhecemos de Saramago começa a acontecer neste livro. A construção politica das personagens e a forma como entram em diálogo directo com o leitor é um desses exemplos.

Curiosos?
Esperem para conhecer Lídia, enigmática, bela e sustentada por um amante misterioso, é assunto entre os vizinhos pelas mais diversas razões.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Não resisto a publicar este manifesto à leitura... Está demasiado bem feito...

Ontem andou a circular pelo grupo no facebook esta montagem, feita pelo brasileiro Marcos Felipe, "com a ajuda de uma galerinha super do bem".

Responsável por partilhar o vídeo: JDuarte Da Silva Pereira. Acrescentou, em breve nota, que este foi "Retirado do Bibliotecário de Babel".

Ainda bem! Continuará a ser espalhado por esse mundo fora.

Para ver e mostrar, o Manifesto - "Só a leitura salva"

a-ver-livros: Um dia bom para ler um livro


Um dia frio. Um bom lugar para ler um livro.
Como canta o Djavan.

"Nem um dia

Um dia frio
Um bom lugar prá ler um livro
E o pensamento lá em você
Eu sem você não vivo
Um dia triste
Toda fragilidade incide
E o pensamento lá em você
E tudo me divide
Longe da felicidade e todas as suas luzes
Te desejo como ao ar
Mais que tudo
És manhã na natureza das flores
Mesmo por toda riqueza dos sheiks árabes
Não te esquecerei um dia
Nem um dia
Espero com a força do pensamento
Recriar a luz que me trará você
E tudo nascerá mais belo
O verde faz do azul com o amarelo
O elo com todas as cores
Pra enfeitar amores gris"



* Ilustração: "Reading by Flowerlight", da pintora norte-americana Debbie Arnold

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Uma claraboia com muita coisa para ler...


O romance deste mês - Claraboia de José Saramago - foi editado pela Caminho em finais de 2011. Anunciado desta forma:
O primeiro romance do Nobel, escrito sob pseudónimo e que não chegou a ser publicado.


Quanto à história, é longa a sinopse:

"A acção do romance localiza-se em Lisboa em meados do século XX. Num prédio existente numa zona popular não identificada de Lisboa vivem seis famílias: um sapateiro com a respectiva mulher e um caixeiro-viajante casado com uma galega e o respectivo filho - nos dois apartamentos do rés do chão; um empregado da tipografia de um jornal e a respectiva mulher e uma "mulher por conta" no 1º andar; uma família de quatro mulheres (duas irmãs e as duas filhas de uma delas) e, em frente, no 2º andar, um empregado de escritório a mulher e a respectiva filha no início da idade adulta.

O romance começa com uma conversa matinal entre o sapateiro do rés do chão, Silvestre, e a mulher, Mariana, sobre se lhes seria conveniente e útil alugar um quarto que têm livre para daí obter algum rendimento. A conversa decorre, o dia vai nascendo, a vida no prédio recomeça e o romance avança revelando ao leitor as vidas daquelas seis famílias da pequena burguesia lisboeta: os seus dramas pessoais e familiares, a estreiteza das suas vidas, as suas frustrações e pequenas misérias, materiais e morais.

O quarto do sapateiro acaba alugado a Abel Nogueira, personagem para o qual Saramago transpõe o seu debate - debate que 30 anos depois viria a ser o tema central do romance O Ano da Morte de Ricardo Reis - com Fernando Pessoa: Podemos manter-nos alheios ao mundo que nos rodeia? Não teremos o dever de intervir no mundo porque somos dele parte integrante?"


Motivos não nos faltam para atacar o livro! Mas deixo-vos, igualmente, um excerto do mesmo:

«Por entre os véus oscilantes que lhe povoavam o sono, Silvestre começou a ouvir rumores de loiça mexida e quase juraria que transluziam claridades pelas malhas largas dos véus. Ia aborrecer-se, mas percebeu, de repente, que estava acordando. Piscou os olhos repetidas vezes, bocejou e ficou imóvel, enquanto sentia o sono afastar-se devagar. Com um movimento rápido, sentou-se na cama. Espreguiçou-se, fazendo estalar rijamente as articulações dos braços. Por baixo da camisola, os músculos do dorso rolaram e estremeceram. Tinha o tronco forte, os braços grossos e duros, as omoplatas revestidas de músculos encordoados. Precisava desses músculos para o seu ofício de sapateiro. As mãos, tinha-as como petrificadas, a pela das palmas tão espessa que podia passar-se nela, sem sangrar, uma agulha enfiada.
Num movimento mais lento de rotação, deitou as pernas para fora da cama. As coxas magras e as rótulas tornadas brancas pela fricção das calças que lhe desbastavam os pelos entristeciam e desolavam profundamente Silvestre. Orgulhava-se do seu tronco, sem dúvida, mas tinha raiva das pernas, tão enfezadas que nem pareciam pertencer-lhe.
Contemplando com desalento os pés descalços assentes no tapete, Silvestre coçou a cabeça grisalha. Depois passou a mão pelo rosto, apalpou os ossos e a barba. De má vontade, levantou-se e deu alguns passos no quarto. Tinha uma figura algo quixotesca, empoleirado nas altas pernas como andas, em cuecas e camisola, a trunfa de cabelos manchados e sal-e-pimenta, o nariz grande e adunco, e aquele tronco poderoso que as pernas mal suportavam.
Procurou as calças e não deu com elas. Estendendo o pescoço para o lado da porta, gritou:
- Mariana! Eh, Mariana! Onde estão as minhas calças?
(Voz de dentro:)
- Já lá vai!
Pelo modo de andar, adivinhava-se que Mariana era gorda e que não poderia vir depressa. Silvestre teve de esperar um bom pedaço e esperou com paciência. A mulher apareceu à porta:
- Estão aqui.
Trazia as calças dobradas no braço direito, um braço mais gordo que as pernas de Silvestre. E acrescentou:
- Não sei que fazes aos botões das calças, que todas as semanas desaparecem. Estou a ver que tenho de passar a pregá-los com arame…
A voz de Mariana era tão gorda como a sua dona.»


Por fim, não menos importante, transcrevo na íntegra a biografia que a editorial Caminho disponibiliza no interior deste livro:

"Filho e neto de camponeses sem terra, JOSÉ SARAMAGO nasceu na aldeia de Azinhaga, província do Ribatejo, no dia 16 de Novembro de 1922, se bem que o registo oficial mencione, como data do nascimento, o dia 18. Seus pais emigraram para Lisboa quando ele não perfizera ainda dois anos de idade. A maior parte da sua vida decorreu, portanto, na capital, embora até ao princípio da idade madura tivessem sido numerosas, e às vezes prolongadas, as suas estâncias na aldeia natal. Fez
estudos secundários (liceal e técnico) que, por dificuldades económicas, não pôde prosseguir. No seu primeiro emprego foi serralheiro mecânico, tendo exercido depois diversas profissões: desenhador, funcionário da saúde e da previdência social, tradutor, editor, jornalista.

Publicou o seu primeiro livro, um romance (Terra do Pecado), em 1947, tendo estado depois largo tempo sem publicar, até 1966. Trabalhou durante doze anos numa editora, onde exerceu funções de direcção literária e de produção. Colaborou como crítico literário na revista Seara Nova. Em 1972 e 1973 fez parte da redacção do jornal Diário de Lisboa, onde foi comentador político, tendo também coordenado, durante cerca de um ano, o suplemento cultural daquele vespertino. Pertenceu à primeira direcção da Associação Portuguesa de Escritores e foi, desde 1985 a 1994, presidente da Assembleia-geral da Sociedade Portuguesa de Autores. Entre Abril e Novembro de 1975 foi director-adjunto do jornal Diário de Notícias.

A partir de 1976 passou a viver exclusivamente do seu trabalho literário, primeiro como tradutor, depois como autor. Casou com Pilar del Rio em 1988 e em Fevereiro de 1993 passou a dividir o seu tempo entre a sua residência habitual em Lisboa e a ilha de Lanzarote, no arquipélago de Canárias (Espanha).

Em 1998 foi-lhe atribuído o Prémio Nobel de Literatura. José Saramago morreu a 18 de Junho de 2010."

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Livros que deram filme: Quem Quer Ser Bilionário?, Vikas Swarup

Slumdog Millionaire estreou em 2008 nas salas de cinema. Danny Boyle realizou o filme que mais Óscares arrecadou em 2009, incluindo Melhor Filme, Melhor Realizador ou Melhor adaptação.


A sinopse do livro escrito por Vikas Swarup é curta e deixa pouco a desejar: "Na história do jovem Ram concentra-se toda a comédia, a tragédia, a alegria e a amargura da Índia moderna. Passado na Índia contemporânea, Quem Quer Ser Bilionário? é uma mistura de comédia, drama e romance que revela as extraordinárias e insuspeitas formas que nos permitem saber aquilo que sabemos."

Quem viu o filme, sabe que é bem mais abrangente. Quem quer ser Bilionário? é uma história de sobrevivência, de pobreza, uma história de amor, um retrato da Índia...

Um filme e um livro a não perder!

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Em Janeiro abra-se a Claraboia para o novo ano

Em Janeiro começamos um novo ano. Prometemos coisas, traçamos objectivos. Tentamos começar algumas coisas de novo. Não esquecemos o que passou e um dos livros que marcou 2011 foi definitivamente a publicação póstuma de Claraboia, de José Saramago. Já tinha feito uma referência ao livro a propósito de uma coincidência com uma curta-metragem de animação.

É pois então este o livro do mês aqui no blogue, em Janeiro. O livro esquecido de José Saramago, uma narrativa simples e divertida, embora partilhe igualmente da força e profundidade que definiria toda a obra posterior de Saramago. Deste livro até agora inédito, o autor disse certa vez que "tanto quanto me recordo, tem coisas que já não têm que ver com o meu modo de ser.".

Começar o ano com um poema assim...


Fernando Namora escreve este poema, inspirador de muitas maneiras.

Por Todos os Caminhos do Mundo

"A minha poesia é assim como uma vida que vagueia pelo mundo,
por todos os caminhos do mundo,
desencontrados como os ponteiros de um relógio velho,
que ora tem um mar de espuma, calmo, como o luar num jardim nocturno,
ora um deserto que o simum veio modificar,
ora a miragem de se estar perto do oásis,
ora os pés cansados, sem forças para além.

Que ninguém me peça esse andar certo de quem sabe o rumo e a hora de o atingir,
a tranquilidade de quem tem na mão o profetizado
de que a tempestade não lhe abalará o palácio,
a doçura de quem nada tem a regatear,
o clamor dos que nasceram com o sangue a crepitar.

Na minha vida nem sempre a bússola se atrai ao mesmo norte.
Que ninguém me peça nada. Nada.
Deixai-me com o meu dia que nem sempre é dia,
com a minha noite que nem sempre é noite
como a alma quer.

Não sei caminhos de cor."

in 'Mar de Sargaços'