sábado, 21 de março de 2015

Eu poético: «Dó, li, tá»

Dó, li, tá

Um dó li tá,
ia eu caminhando pela praia
sentindo o sal nos meus lábios
e a água fria do mar.
Ao fundo vejo a nau
por entre a neblina.
Julgo descortinar o rei perdido
desembarcando na areia
e reclamando para Deus novo território.
A pele estala com o sol escaldante,
a camisa de linho agarra-se ao corpo.
- Tudo isto é ode, tudo isto é sonho.

Dois dó li tá,
sou agora velho e arrasto a perna.
Ciática permanente, músculos parados
e manchas marcadas bem fundo.
As noites são uivos de dor,
por momentos sou lobo no meu próprio quarto.
A luz quente brilha na estante e
representa a única esperança de vida.
Mas a borboleta sem cor dá às asas e
recorda-me que o fim é próximo.
Porque é que a angústia não tem cura permanente?
- Tudo isto é escuro, tudo isto é sonho.

Três dó li tá,
a tua mão pousa na minha
e sinto o beijo de sabor a mel.
Abres a janela e eu cheiro a primavera lá fora.
Os raios iluminam as estantes dos livros que fomos colecionando ao longo dos anos
e o vento suave agita os lençóis com a sua frescura.
Molhamos as torradas no café com leite,
sorrimos cara-com-cara.
A seguir tropeçamos no chão e tu desfazes-te em risos.
Agarro o teu pé e faço cócegas;
tu estremeces e gritas bem alto para eu parar.
- Tudo isto é luz, tudo isto é sonho.

Depois levas a chapada dos dias,
carregas futuros incertos,
estremeces de medo ao pensar nos finais desconhecidos
e lamentas não teres alguém para partilhar a tua ideia de felicidade.

Não
mais

li
tá...
nem tudo é quimera, nem tudo é destino.

Só a morte, matéria sem solução.

Rodrigo Ferrão

Foto: Rodrigo Ferrão

Bai'má Benda: Especial excurçom a Santiago de Compostela...

Especial excurçom a Santiago de Compostela...

Não perca esta página, por nada: https://www.facebook.com/baimabenda

Sublinhei no «Desamparo» de Inês Pedrosa


(...) "Faltavam-lhe amigos que lhe recordassem que ninguém vive em função de outrem; podemos, por exemplo, morrer a tentar salvar alguém, mas fazemo-lo em função dos valores que estabelecemos para a nossa vida. Atiramo-nos ao mar para salvar um filho ou um desconhecido de morrer afogado porque não seríamos capazes de viver em paz se não o tivéssemos feito. Não se trata de uma lei geral: há aqueles que se sacrificariam para salvar os seus torturadores, e aqueles que nem pela carne da sua carne se imolariam. A moral pública interfere nestas decisões mais do que gostamos de acreditar, sobretudo neste século XXI em que o individualismo se tornou o cavaleiro-mor da inteligência e a liberdade enche as bocas como uma nova especiaria à disposição de todos. Até meados do século XIX, a morte de uma criança era um acontecimento banal; ainda hoje o é, aliás, na maior parte do mundo. A omnipresença das imagens cria uma rotina de compaixão diferida, uma imitação de mágoa que alivia as consciências modernas."

*in Desamparo, Inês Pedrosa.
ed. Dom Quixote

Estantes de sonho: a luz da janela

A  janela convida, não?
 
Encontrado na página Bookshelf Porn. A não perder por nada! 


quinta-feira, 19 de março de 2015

SOMOS JOVENS!

Somos jovens e não gostamos de peixe, peixe que merd é essa, coisa verde muito menos, venha de lá o bife chefe.
Somos jovens e nada bem fazemos, rebeldes e mal-educados, nada somos que não rebeldes e mal-educados. 
Peço desculpa mas somos jovens.
Somos jovens e trepamos muros. Corremos telhados fora e por pouco não viramos esqueleto espalmado no alcatrão.
Somos jovens e tão mal das professoras falamos. Tantos nomes nas costas lhes chamamos, Deus meu que nem coragem temos, realmente somos umas bestas quadradas.
Somos jovens e não há vez em que nós não cheios de razão. 
Somos jovens e não queremos saber se os sapatos sujos de lama e a mãe em gritos corridos atrás.
Somos jovens e nas discotecas colocamos a mão em cauda alheia.
Somos jovens e depois dos festivais de Verão nós diretos para a escola, o casaco só de terra, as calças em forma de sono, nos pés uma pegada de felicidade que vai virando cansaço com o desdobrar do relógio.
Somos jovens e pouco lemos, rabaldaria com os outros jovens coisa bem melhor, ações pouco graves, delitos menores, furtos mascarados, tudo isso que tu que em tempos jovem tão bem fizeste.
Peço desculpa mas somos jovens.
Somos jovens e a música sempre no máximo. Somos jovens e ficarmos surdos nem possibilidade é, aguentem-se tímpanos, eu quase não jovem e aí descanso para vós.
Havemos de ser não jovens. Havemos de não ter professoras, havemos de não ter costas de professoras para atirar tanto nome feio. Havemos de não ter os gritos da mãe em correria atrás. Havemos de não poder jovens outra vez.

Havemos de não ser jovens.

Gonçalo Naves


Foto tirada daqui: 
http://www.saudebemestar.org/2013/05/transtorno-desafiador-opositivo.html




Gonçalo Viana de Sousa - O Flâneur das Sensações




Meu querido José

Envio-lhe a sétima e última parte do meu definitivo testamentário. Imagino que já deve estar todo eufórico por não ter recebido nem a quinta ou sexta partes. Tenha calma, jovem frenético das alturas românticas! Já o tinha avisado que comigo não adianta tentar engavetamentos, nem em épocas nem em textos. Faça o que quiser com o texto, mas não espere ordem onde só se pode aguardar pelo caos e pelo mistério. Não espere harmonia onde só existe humanidade e paroxismo.
Antes de terminar esta missiva, devo-lhe, em nome da nossa amizade, dar-lhe umas quantas informações em relação a estes textos. Papa John, como já lhe tinha dito, é americano, mas de continente, não de país. Seu verdadeiro nome era João Rubinato e foi actor e músico nesse grande país de Terra Brasilis, diria meu primo Jobim. Talvez este nome de João Rubinato nada lhe diga, mas posso afiançar-lhe que foi um dos grandes nomes do samba do povo livre ao longo do século vinte, bem antes de meu primo. Pois bem, este João Rubinato, ao qual apelidei de Papa John, era o famosíssimo Adoniran Barbosa. Se nunca ouviu música alguma dele, aconselho-lhe a escutar o Samba do Arnesto, o Samba Italiano e a Saudosa Maloca. Procure nessas maluquices virtuais, pois acredito que não devem faltar álbuns e fotografias e outras coisas que tal.
Quanto a meu primo Jobim e à Elis Regina, ficará para outra altura o relato de como os conheci e de como descobri que o Tom era meu primo.
Ora bem, jovem das alturas profundas (este oximoro foi exímio, diga lá?), quanto às outras partes, um dia destes envio-lhas, para poder tentar entender o porquê de tal volte-face, ou talvez não haja volte-face algum. Foi a realidade a tecer a sua meada com laivos de sangue e ficção tropical.
Sei que vai querer saber o nome daquela que parece ter sido fundacional para a minha vivência. Não lho digo, pois veria até nisso estranhos sagrados segredos amadores de alguém que não teve como destino escrever, mas sim viajar.
Muito agradeço a sua visita no domingo passado e o seu presente, que era escusado.
Receba este texto, meu querido José, e não dê às asas da imaginação, atenha-se às palavras e sorria.
Um abrrraço do Efrraim, que muito lhe agrrrradece os doces. Uma Marrravilha!
Outro do
Seu

Gonçalo V. de Sousa.




(7ª e última parte) - Change Partners

Abri os olhos e senti o teu perfume no meu corpo, nos suaves lençóis de linho. A brisa soprava pela janela do hotel que se espraiava até ao azul infinito do Atlântico. Os teus cabelos tinham aquele aroma fresco e primaveril dos lírios e das rosas, ainda que a maresia e todo o tropicalismo do Rio de Janeiro e de Copacabana navegassem no teu corpo.
Ali estavas tu, verdadeiramente amável, náufraga em suaves segredos amorosos. Ali estavas tu, na minha cama, encostada ao meu peito, abraçada ao meu pescoço. Tudo parecia tão certo e, ao mesmo tempo, tão assustadoramente irreal. Os teus cabelos loiros derramados pela minha cama como um despojo de guerra, o teu vestido branco, elegante, intrigante, maravilhoso, sobre o chaise-longue. O teu corpo nu e quente, os íntimos pequenos pêlos eriçados, as tuas pernas entrelaçadas nas minhas. Foi assim que acordei nessa manhã de quinze de Março de 1968, no dia em que completava vinte e dois anos.
Depois de duas semanas irreais e quase novelescas, tinha-te nos meus braços, tinha o teu sorriso todo só para mim, todo só para mim, só para mim, doirada senhora dos cabelos e dos pensamentos perfeitos.
Saio da cama sem fazer algum barulho que incomode o teu sono sem mácula, sem que a tua respiração calma e suave se dissolva na brisa da manhã. Vou até à varanda da suíte que Papa John reservara para mim. A manhã clara e luminosa de um sol olímpico que banha Copacabana e os morros e o Redentor. As praias espreguiçando-se languidamente ao longo do Calçadão, enquanto alguns turistas e veraneantes aproveitam as últimas águas de Março. (Mais tarde, esta minha expressão iria inspirar meu primo a escrever uma música que ficaria imortalizada no dueto com a Elis Regina.) Que mais poderia eu, jovem, com bons padrinhos, sem problemas, e com a mulher da minha vida partilhando a cama, e talvez a vida, pedir aos deuses? Tudo era bom e belo e justo e tudo fazia sentido. Agora sim, tudo parecia fazer sentido.
Da varanda olhava para dentro do quarto e quando as cortinas faziam balão com a suave brisa que acariciava aquela manhã, vislumbrava-te deitada e adormecida. O teu corpo delicado, moreno do Sol dos trópicos, exalando aromas a coco e a abacaxi. As tuas pernas perfeitas, os teus braços perfeitos, o teu rosto, linhas de versos escritos por indizíveis e inenarráveis anjos de cetim que guardam os tesouros celestes e as coisas inefáveis. Os teus lábios adormecidos eram os suspiros que embalavam aquela manhã tão irreal e tão verdadeira. Naquele momento, acreditei que era possível sermos melhores do que as pessoas de papel. E fomos, dourada senhora minha. E fomos.
Mandei subir um moço com o mata-bicho. Frutas, sucos, pão, geleias e flores, muitas rosas e lírios e camélias e tulipas roxas.
Tu continuavas dormindo como uma promessa de vida no meu coração, diria meu primo poucos anos depois estas palavras que vagueavam pelo silêncio dos meus pensamentos.
A brisa do Atlântico chegava ao leito em suaves e doces quietações. Fosforescências líquidas.
O Sol começava a nascer na varanda do quarto, avançando até à nossa cama. O Sol crescendo por entre os teus pequenos e delicados pés, subindo pelas tuas pernas, tranquilizando a tua pele sensível e perfumada.

Ligo o gira discos.

Acordo-te com um beijo pausado, enquanto as gaivotas voam alto e o cheiro a maresia se ergue por entre as cortinas brancas do hotel. Tu sorris e beijas-me e o tempo parece não existir. As palavras não existem. Mas os teus lábios existem. Mas os teus beijos existem.
Gasto eras olhando, observando, vislumbrando, de forma embasbacada e infantil, o teu rosto. O teu sorriso de dentes perfeitos. Os teus lábios que sussurram suspiros bruxuleantes, misteriosos, mágicos, eternos, deliciosos. Tu sorris e não existe dor nem no presente nem no futuro que seria o presente desta manhã. Hoje, essa dor continua a não existir, porque gravei a sangue o teu sorriso e as tuas palavras.
Beijo-te o corpo nu e enlaço as tuas nas minhas mãos. O elegante verniz esbranquiçado dos teus majestosos dedos é um pormenor de retábulo. Acaricio-te os cabelos com promessas de manhãs suaves e justas. Prometo-te o Verão e as coisas belas em cada carícia, em cada toque capaz de arrepiar o mais teimoso e subtil pequenino pêlo do teu regaço. Abraças-me com a vulcânica força que rege as vagas e as neblinas, enquanto o Sol nos cobre as costas e os pés e a brisa do mar se guia pelo ritmo da música.

Que aquela manhã, triunfal, ecoe no silêncio do anonimato. Para sempre. E que faça lembrar o Sol e a luz dos dias fartos, frescos e líquidos, de beijos sedosos e maravilhosos. (Meu primo iria aproveitar a métrica e o sabor desta última frase para uma sua famosíssima canção intitulada Chega de Saudade).

Passaram mais de quarenta anos e onde nos encontramos agora, que o mundo continuou e as ondas cumpriram as suas promessas de espuma?
Tivemos medo de responder ao futuro e às incertezas, agarrando-nos ao presente que é constante. Fizemos daquela manhã um continuum ad aeternum.
Não interessa o que veio depois, meu amor de manhãs doiradas e perfumadas. O que veio depois é nada, madona minha das palavras por escrever.
O que veio antes ou depois, não interessa absolutamente nada. Interessa sim, aquele quarto naquela manhã em Copacabana, num hotel que selou o meu destino de viagens para ti. Só para ti.
Tudo o que permanece é o teu sorriso e o meu corpo e o teu corpo sendo um, como uma comunhão de passarinhos brancos a voarem para os picos mais altos das montanhas inacessíveis. 

O teu corpo no meu corpo.

«Porque fazes tudo isto por mim, Gonçalo?», perguntavas-me. «És tu a resposta para o meu futuro e para tudo o que venha a fazer. Digo-te isto e ainda não sei o propósito do que está a acontecer ou do que vai suceder.» «Porquê eu?» «A música selou-nos sem que o soubéssemos. Não me arrependo de nada.» E tu respondeste «Nem eu. Parece que estamos vivendo sonhos, Gonçalo. Träume.» «Sonhos ou não, dourada senhora dos meus pensamentos perfeitos, temo-nos.» Ao dizeres sonhos em alemão, com o teu sotaque límpido de horas de aulas sobre essa magna língua de príncipes e valquírias e dragões e cavaleiros, estremeci.
Beijei-te novamente e abracei-te com toda a força do mundo. Beijei-te os dedos e os braços. Peguei em ti ao colo, dançámos e sorrimos e nada mais interessava. Fizemos amor ao som da música que o gira discos repetiu vezes sem conta. Amamo-nos como deuses e como demónios, de forma sagrada e profana, de forma literária e real. Amamo-nos como humanos, finitos e mortais e, por conta disso mesmo, eternos e imortais.
Que adianta sequer sussurrar o teu nome, tão presente na minha memória e em todos os aspectos da vida? Não, o nome não interessa nada.
Mas não saiamos daquele quarto de hotel. Deixemos a brisa entrar, só mais uma vez. Deixemos o sol iluminar e aquecer aquela manhã azul. Deixemos o teu sorriso, o teu rosto, o teu olhar, os teus lábios fazerem parte de mim, sempre.

Hoje, quarenta e sete anos depois, precisamente à mesma hora que acordaste, volto a abrir a porta daquele quarto. Não sei se o que escrevi corresponderá à verdadeira realidade do papel. Sei que corresponde à minha. A realidade do sangue.

Mordes-me o ouvido e sussurras-me Won’t you change partners and then, enquanto eu te olho nos olhos e te segredo You may never want to change partners again.

A música selou-nos. O testamento termina aqui.






«1089», o novo livro de Emílio Miranda

1089 - O Livro Perdido das Origens de Portugal
de
Emílio Miranda
Um livro RTP
Sinopse:
Ano de 1089. Uma nação em formação ergue-se na bruma do tempo, movida pelo forte e leal braço do povo, pelo arrojo de senhores feudais e pela fé nos ditames da Igreja e dos seus ministros. Num velho mosteiro, são muitas e sinceras as preces, mas também as manobras pela conquista do poder nesse novo território.

Magistralmente concebido, 1089 relata, de forma precisa, viva e cativante, os dias da fundação de Portugal tendo como palco central as terras de um mosteiro beneditino. E não deixa de fora relatos concisos da ambição dos homens e, em particular, dos da Igreja, com os seus segredos e jogos de luz e sombra. Cativante e surpreendente!


quarta-feira, 18 de março de 2015

A cama dos sonhos literários

Encontrado na página For Reading Addicts

É do borogodó: o amor bate na aorta, de Drummond de Andrade

Cantiga do amor sem eira
nem beira,
vira o mundo de cabeça
para baixo,
suspende a saia das mulheres,
tira os óculos dos homens,
o amor, seja como for,
é o amor.

Meu bem, não chores,
hoje tem filme de Carlito!

O amor bate na porta
o amor bate na aorta,
fui abrir e me constipei.
Cardíaco e melancólico,
o amor ronca na horta
entre pés de laranjeiras
entre uvas meio verdes
e desejos já maduros.

Entre uvas meio verdes,
meu amor, não te atormentes.
Certos ácidos adoçam
a boca murcha dos velhos
e quando os dentes não mordem
e quando os braços não prendem
o amor faz uma cócega
o amor desenha uma curva
propõe uma geometria.

Amor é bicho instruído.

Olha: o amor pulou o muro
o amor subiu na árvore
em tempo de se estrepar.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo o sangue
que escorre do corpo andrógino.
Essa ferida, meu bem,
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã.

Daqui estou vendo o amor
irritado, desapontado,
mas também vejo outras coisas:
vejo corpos, vejo almas
vejo beijos que se beijam
ouço mãos que se conversam
e que viajam sem mapa.
Vejo muitas outras coisas
que não ouso compreender…

Carlos Drummond de Andrade
* poema escolhido por Penélope Martins

A poesia não tem grades: O lado de dentro do lado de dentro

 
Ainda precisamos de toda a ajuda possível e é muita:

Apoiar uma causa solidária e receber um livro com inéditos de excelentes autores: "O lado de dentro do lado de dentro" é um livro que inclui textos originais de Afonso Cruz, Alice Vieira, André Gago, Catarina Fonseca, Cristina Silveira de Carvalho, Delmar Gonçalves, Filipa Leal, Frederico Fezas Vital, Helder Moura Pereira, Inês Fonseca Santos, Joaquim Cardoso Dias, José Carlos Barros, José Mário Silva, Nuno Garcia Lopes, Pedro Paulo Camara, Richard Zimler, Samuel Pimenta e fotos de Rowan Schelten e Duarte Belo.

 Todos os valores obtidos com as suas vendas revertem para o projecto "A Poesia não tem grades" que promove a leitura em ambiente prisional desde 2003.

 Poderá também fazer o seu pedido através da página http://www.apoesianaotemgrades.pt/ ou através do email dentro@apoesianaotemgrades.pt. O preço é de 8 euros, sendo enviado gratuitamente por correio (para Portugal).
 
Fique atento às sessões de apresentação que vamos desenvolver por todo o país, onde poderá contactar com alguns autores, ficar a conhecer melhor o trabalho desenvolvido ao longo de uma década e debater a importância da intervenção artística em contextos menos comuns. Contamos consigo.

*Por Filipe Lopes

terça-feira, 17 de março de 2015

queda


que língua compreende os desígnios
do azul que não a infinitude do voo
que o mar pelo céu o sal cristaliza

do alto caem pingos
de claridade
plumas de ondulação
à boca.

Helder Magalhães


Fotografia de Clara Amorim

a-ver-livros: a figueira

Chegou o tempo de esperar
que a figueira 
seja fénix
que cubra a nudez da alma
e revele as cicatrizes 
tornadas frutos
tornadas dias de sol à sombra
generosa
dos sonhos

na casca escrevo o livro que ainda não é
e depois virá a romã

Ana Almeida

* para saber mais sobre a pintora Jane Peterson
siga o link http://www.questroyalfineart.com/artist/jane-peterson

Da Yahoo para alfarrabista de bairro

Farto de despedir na Yahoo, tornou-se alfarrabista de bairro

por João Almeida Moreira, em São Paulo


Ricardo Lombardi, ex-diretor da revista brasileiraBravo! e alto quadro na empresa digital, decidiu mudar de vida. Abdicou de 70% do que ganhava e agora vende livros na garagem da casa da mãe.

Foi ao atravessar Buenos Aires, de férias, que a ideia surgiu: no bairro de San Isidro, um alfarrabista sobrevivia como pequeno negócio de família em plena era do comércio hiper e da indústria mega, aparentemente indiferente ao furor dos tempos modernos. Ricardo Lombardi, paulistano de 44 anos, pensou porque não ele e porque não em São Paulo.

A chefiar a redação brasileira do gigante digital Yahoo e com longa carreira em jornais e revistas no país - foi diretor da revista cultural Bravo!, correspondente em Nova Iorque do digital Último Segundo, editor de turismo do Jornal da Tarde, arquivista em O Estado de São Paulo -, Lombardi, casado e com dois filhos, decidiu demitir-se e fundar o seu próprio alfarrabista, o Desculpe a Poeira.

Pegou nos quatro mil livros da sua biblioteca pessoal, fora as coleções da Playboy, Placar, Around e Piauí, títulos icónicos no país, e abriu as portas em novembro, na garagem de 24 metros quadrados da casa da mãe, em Pinheiros, no centro da cidade, algures entre outras garagens transformadas, também nos últimos anos, em pastelarias, sapatarias ou costureiras. "Perdi 70% dos meus rendimentos mas vendi o carro e passei a andar de bicicleta, larguei o karaté no ginásio, porque a mensalidade era cara, e agora treino para a Maratona de São Paulo e deixei de gastar 300 reais [cerca de 100 euros] em restaurantes para comer apenas nos bons e baratos", diz o ex-jornalista ao DN. "Em compensação, posso pegar num livro e lê-lo às 15.00, beber um copo de vinho às 16.00, se me apetecer, e levo os filhos à escola..."

Margens que me comprimem: o livro-objeto de Ana Paula Oliveira

Diz Ana Paula: "Acabado de publicar o meu conto Margens que me comprimem em livro-objeto, pela Artelogy. O frasco pode ser adquirido no site da editora e na sua página no Facebook (Facebook store)."


O último convidado acaba de sair. O dia começa a despertar e a noite despede-se convidando-me a descansar. Recuo seis horas.

Casa cheia, música, ritmo, alegria. Taças de champanhe, erguidas bem alto, beijam-se brindando ao novo ano acabadinho de estrear, mal finda a última badalada da meia-noite.
Indiferente, olho-os. A casa é minha, a música é minha, a esplanada e a piscina iluminada são minhas. Mas a alegria é deles.
 
Olho-os. Indiferente. A alegria não é minha. E as horas que teimam em não passar!
(...)


*in http://livro-leitor.blogspot.pt/2015/03/margens-que-me-comprimem.html?spref=fb

segunda-feira, 16 de março de 2015

E se Hemingway fosse vivo?

"Se Hemingway estivesse a escrever agora não estaria a fazê-lo em Paris, Berlim ou Madrid - hoje invadidas por grandes empresas, desumanas máquinas americanas de 'fazer dinheiro'. Mas não Lisboa - não há um Burguer King ou um McDonald's em cada esquina, nem um Hollister ou Abercrombie à vista, e continua teimosa e orgulhosamente agarrada a si mesma. 

Hemingway estaria a escrever em Lisboa. 

A festa de Hemingway, a sua cidade de luzes e sons, continua a existir. Mudou apenas um pouco mais para Sul e só isso. Esqueçam os modernos Champs D'Elysees - o escritor andaria a passear na longa, gloriosa e luxuriante Avenida da Liberdade (...), a desfrutar das luzes e do rodopio sonoro da cidade de Lisboa.

Há um tremendo fluxo artístico aqui, que continua a crescer a uma velocidade sem precedente. Algumas das maiores mentes artísticas da próxima geração encontram-se e socializam por aqui, partilhando inspirações e produzindo grandes obras.

O próximo grande romance americano? Bem, pode mesmo vir a ser escrito em Lisboa."

Assim se pode ler num artigo recente publicado por Eric Macklin no site Elevated Today.
Concordam? 
Hemingway ficaria fascinado com a Lisboa de hoje? Escreveria aqui os seus maravilhosos romances? 



"If Hemingway were writing now, he wouldn’t be writing in Paris or Berlin or Madrid- they have been overrun by corporations, by soulless American machines that are doing their best to “monetize”. But not Lisbon- there is not a Burger King or a McDonald’s on every street corner, not a Hollister or an Abercrombie in sight, and it has stubbornly and proudly hung on to itself.

He would be writing in Lisbon.

Hemingway’s movable feast, his city of lights and sound- it’s still here. It’s just moved a bit south, that’s all. Forget the trendy Champs D’Elysees- he would have walked down the long, gloriously leafy promenade of the Avenida da Liberdade (which is, I am told, actually wider than the famous French boulevard), enjoying the sights and whirling sounds of the city of Lisbon.

There is a huge influx of art here, and it is growing at an unprecedented rate. Some of the next generation’s greatest artistic minds are meeting and mingling here, sharing inspiration and producing their own great works.

The next great American novel? Well… it just might be written in Portugal
."

Leia o artigo completo aqui

A ementa do dia

Encontrado na página For Reading Addicts

Bai'má Benda: Faltando saca plástica...

Faltando saca plástica...

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domingo, 15 de março de 2015

A menina com brincos de dragão



A menina com brincos de dragão, de ANA CRISTINA DIAS, Acrílico s/tela, 90X90cm


O céu do meu país a cada anoitecer, antes de se vestir de um negro povoado de estrelas, lantejoulas, brilhos, pós, poeiras, pensamentos nómadas, tuaregues em solo lunar; antes da festa de cada noite, depois do sol se retirar e enquanto as cigarras ainda cantam, é lilás de cor, quase vinho, um brinde, uma saudação, um lilás perfeito de amores-perfeitos, frágeis e curiosamente comestíveis.
Depois fechado na noite, no céu negro, cego, deslumbrado, se procurares com cuidado, com atenção e paciência.
Que a paciência é uma espécie de esperança.
E a esperança, dizem, uma virtude.
É possível.
Quase impossível.
Podes ter a sorte de encontrar um dragão.
No céu do meu país os dragões voam como gaivotas embaladas pelo vento.
Consegues imaginar o valor, a valentia, a força?
A doçura do vento para conseguir, sem baloiço nem rede, embalar dragões numa elegância de libelinhas.
Dragões enormes e azuis, os corpos de um azul tão escuro que se confundem com o negro do céu, dragões que esbaforidos lançam chamas, efémeras fogueiras que por segundos ofuscam o brilho das estrelas.
Fogos efervescentes que lembram estrelas cadentes.
E quando uma pessoa, um habitante, um viajante, dois olhos de propósito ou por acaso no céu, se cruzam com uma estrela assim, nesse mágico acender e apagar de lâmpada de tecto, nesse paradoxo de trovão silencioso, atreve-se a pedir um desejo, uma alegria, um motivo para sorrir.
E sem saber, sequer suspeitar, pede um desejo sobre um espirro de fogo de um dragão, não sobre uma estrela cadente, uma estrela que perdeu um dente, uma das cinco pontas.
Exemplo ou razão porque é tão difícil encontrar um dragão.
É que não é suficiente ver, é preciso crer, deixar-se encantar, quase sonhar.
É preciso vontade.
E se a culpa é da vontade, as conquistas também.
Assim, pediu o habitante, o viajante, um desejo e em guarda esperou.
Esperou.
Esperou.
Uma espera cheia de esperança que não foi mais do que uma esperança cheia de espera.
Esperou sem desejo nenhum se concretizar porque um dragão não é uma estrela na ponta de uma varinha a fazer magia.
A magia do dragão é sobreviver.
Cuidado com o que desejas, não vás queimar o coração, é o aviso do dragão, é que, se não consegues ser feliz com o que tens, também não vais conseguir ser feliz com o que não tens.
Derivado do diz que dizem, por saberem, os sábios dragões, que quem tudo quer tudo perde.
Porque tudo tiveram e tudo perderam.
Porque foram monarcas da côncava abóbada celeste e em consequência do chão, redondo e côncavo também, o que só eles sabiam, até que fustigados por todo o tipo de caçadores.
De maus contadores de histórias e de contadores de histórias maus.
Sem súbditos nem trono, encontraram, conseguiram encontrar, exílio e paz no céu do meu país, talvez porque o meu país não aparece no mapa.
Eu ainda não.
Eu nunca encontrei um dragão.
O meu dragão, alado, emplumado, com hálito de fogo, circula, talvez perdido, gaivota, barco à deriva, pelo céu do meu país à espera do brilho dos meus olhos.
Eu sei que espera.
O dragão do meu desejo espera.
Sei, porque já conheço o meu desejo, o meu sorriso, a minha vontade.
O meu desejo voa, do fundo da rua ao fundo da rua, como se fizesse piscinas, de olhos postos na minha janela.
E ontem deixou uma caixa-caixinha na minha caixa do correio.
E na caixa-caixinha um par de brincos.
Ouro da minha fortuna.
Eu afortunada.
Enfiei os brincos, nos lóbulos já furados e vazios, como se o meu corpo apenas à espera.
E os brincos dois dragões a voar sobre os meus ombros, dois dragões a fazer fogo-de-artifício para mim, para os meus olhos, dois dragões que vou passear pelas ruas da noite até encontrar a boca.
Só uma boca me interessa.
Só uma boca é capaz, a do tal rapaz, tem o talento, consegue incendiar o meu coração.

Raquel Serejo Martins
Este texto, esta small SONG, teve como ponto de partida o quadro supra, trabalho da pintora Ana Cristina Dias.
Mais trabalhos em: http://eu-e-a-pintura.blogspot.pt/.

Amor

Amor

O amor não se gasta. Reinventa-se.
Aqui ficam as considerações de crianças de 5 anos.

O que é para ti o amor?
- É uma felicidade é muito linda.
- Desenhar um coração.

O que é estar apaixonado?
- É gostar muito de alguém.
- É ficarem algum tempo juntos, mostram coisas bonitas uns aos outros, contam histórias de verdade de amor.
- É o coração estar feliz.

Quando é que sabemos que estamos apaixonados?
- Sei porque o meu coração costuma a dizer “estou feliz!”
- Quando tivermos amor nos olhos.
- Quando se dá beijinhos nas mãos.
-  Quando temos amor.
- É quando as pessoas olham umas para as outras e dão a mão e dão beijinhos na cara e vão dar um passeio.

O que sentem as pessoas apaixonadas?
-Sentem uma coisa no coração.



Porque amor só existe com magia e imaginação


Foto frase do dia: Auster