sábado, 4 de junho de 2011

Rebolar em livros...

Eu e Ubik jantamos na feira do livro, aqui há uns dias. Decidimos ficar para a 'happy hour', ou seja, hora em que muitas editoras fazem descontos até metade do preço.

Um dia para esquecer nos nossos bolsos. Salva-se a colecção de mais e mais tesouros... As nossas casas começam a não ter espaço para tanta coisa.

Levados pela febre, tivemos um momento hilariante. No pavilhão da Porto Editora / Bertrand existem alguns caixotes carregados com livros descatalogados ou edições antigas. No meio de muitos atentados, descobrem-se obras a preço razoável, como Vergílio Ferreira ou Aquilino Ribeiro.

Uma extensa colecção de livros da Quetzal a preços entre os 2 e os 3.50€, por momentos, enganou-nos. Isto porque faltavam poucos minutos para o pavilhão fechar e nós, erradamente, julgamos que aqueles preços ainda iam descer mais...

Foi a confusão, pois reviramos o caixote de trás para a frente e processamos - em milésimos de segundo - centenas de títulos e preços. Quem nos visse ficaria, de certo modo, a pensar que tínhamos caído numa piscina (daquelas com bolinhas de muitas cores). De rir...


Peguei no carro e seguimos viagem para Guimarães - a cidade que nos apresentou e onde convivemos em alguns meses no mesmo emprego. Com a luz interior do carro, o meu amigo Ubik foi lendo algumas passagens do livro de Julio Ramón Ribeyro - Prosas Apátridas (recentemente publicado pela Ahab).

Não vos consigo transmitir a beleza daquela viagem. Este livro tem tanta e tanta matéria para ser lida e discutida que, provavelmente, podia servir de base a um blogue só de citações.

O melhor é convidar-vos a ler. Quando acabar de ler o meu, prometo deixar um breve resumo.

Soneto do Cativo

'Se é sem dúvida Amor esta explosão
de tantas sensações contraditórias;
a sórdida mistura das memórias,
tão longe da verdade e da invenção;

o espelho deformante; a profusão
de frases insensatas, incensórias;
a cúmplice partilha nas histórias
do que os outros dirão ou não dirão;


se é sem dúvida Amor a cobardia
de buscar nos lençóis a mais sombria
razão de encantamento e de desprezo;

não há dúvida, Amor, que te não fujo
e que, por ti, tão cego, surdo e sujo,
tenho vivido eternamente preso!'

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Foge-me a cor dos olhos correndo para o horizonte, de Pedro Ferreira, na Feira do Livro do Porto

Não costumo fazer muita auto publicidade mas como o livro não esteve disponível durante bastante tempo e como sei que há algumas pessoas, principalmente amigos e amigas que o gostariam de ter... serve esta mensagem para informar que a Corpos Editora conseguiu alguns exemplares que estarão à venda na Feira do Livro no Porto, no stand da editora. Para quem quiser falar com o autor ou quiser um autografo, eu estou um bocadinho mais acima no stand da Companhia das Artes.
Agora já não há desculpa para não o lerem, nem que seja para me falarem mal dele!

"Ouço a chuva a cair lá fora, a Lua já desapareceu por detrás das nuvens carregadas que agora encharcam a Terra em pequenos dilúvios. Deitado na cama vejo-me a pairar por cima do meu próprio corpo. Eu saí de mim. Não sei como é que isto aconteceu, mas é estranho. Olho para baixo e vejo um corpo abandonado. Não está abandonado porque não tem alma ou porque não tem coração. Está sozinho e por mais que tente só assim é que consegue estar."

Lídia Jorge - escolha para Junho!



Caros e fieis acompanhantes da escrita: a Constança regressa à escolha de mais um livro de leitura conjunta. Avançamos ao encontro do seu desejo: ler Lídia Jorge, na sua obra 'A praça de Londres' - cinco contos reunidos num livro publicado em 2008 pela Dom Quixote.

A sinopse diz:
'Cinco narrativas que oscilam entre o intimista e o irónico.
Em Praça de Londres, reúnem-se 5 contos de Lídia Jorge.
Além do conto que dá o título à recolha, dela ainda fazem parte Rue du Rhône, Branca de Neve e Viagem para Dois, narrativas já antes publicadas.

O último conto, Perfume, é um inédito que a autora dedica ao realizador turco Yilmaz Güney, autor do filme Yol. Trata-se de uma espécie de réplica à história de amor que esse filme narra, transplantada para uma outra geografia humana.

Praça de Londres tem como subtítulo Cinco Contos Situados, por se tratar de narrativas inscritas em espaços urbanos reconhecíveis e por invocar instantes de vida marcantes, colhidos do quotidiano normal.

De um modo geral, o tom destas cinco narrativas oscila entre o intimista e o irónico. A questão da inocência e da perda é um dos temas que lhes dá unidade.'

A escritora Algarvia - uma das mulheres mais apreciadas no panorama da escrita em Portugal - conta já com um conjunto de obra assinalável. Desde a publicação do seu primeiro romance em 1980 - 'O Dia dos Prodígios' - tem tido bastante destaque entre a crítica, tendo ganho, inclusive, alguns prémios.

Constança Barras Romana e Lídia Jorge: juntas para vos apresentar o livro do mês de Junho. Mal posso esperar para começar...

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Prémio Príncipe das Astúrias para Leonard Cohen



Leonard Cohen, que é mais conhecido como músico do que como escritor, publicou o seu primeiro livro de poesia em 1956 “Let us compare mythologies” e em 1963 saiu a sua primeira obra literária, “The Favourite Game”, avança o Jornal Público.

Pessoalmente não estava à espera nem conhecia a lista dos candidatos ao Prémio (só sabia da nomeação do 'nosso' Lobo Antunes). Surpresa ou não, a verdade é que Cohen tem já um conjunto interessante de títulos publicados.

Entre nós:

Belos Vencidos, Relógio D'Água - 1997 (romance)
Filhos da Neve, Assírio & Alvim - 1997 (poesia)
Livro do Desejo, Quasi Edições - 2008 (poesia)
O Jogo Favorito, Alfaguara Portugal - 2010 (romance)

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Hoje o blogue é dos mais pequenitos - Dia Mundial da Criança

Em dia das criancinhas aqui ficam algumas propostas, bastante diferenciadas e para todos os gostos.

Booktrailer com o poema "Carta", de Matilde Rosa Araújo, no livro Com Quatro Pedras na Mão + CD, musicado e interpretado pelo Bando dos Gambozinos, da Deriva Editores.



A Maior Flor do Mundo, de José Saramago, pela Caminho. Aqui animado em ilustração pelo Diego Mallo e adaptado e dirigido por Juan Pablo Etcheverry. Nas palavras do próprio Saramago: "E se as histórias para crianças passassem a ser de leitura obrigatória para os adultos? Seriam eles capazes de aprender realmente o que há tanto tempo têm andado a ensinar?"


Migrando de Mariana Chiesa Mateos, da Orfeu Mini, chancela da Orfeu Negro. Migrando tem duas capas, dois pontos de partida, mas é indiferente por onde se começa a viagem. Neste livro, aves e pessoas cruzam os céus. Fazem as malas, abrem as asas e lançam-se à aventura. Dedicada aos que deixaram a sua terra para re-existirem noutro lugar, esta história sem palavras e de imagens poéticas, mostra como a palavra migrante pode ser sinónimo de sofrimento e fragilidade, mas também de coragem e futuro. Um livro de desenhos, no qual cada leitor re-inventa a própria história.


Livro da Avó, de Luis Silva, Edições Afrontamento. Nunca é demais falar deste livro, nunca é demais lê-lo. Depois do grande formato da 1ª edição, chega à segunda ligeiramente reduzido. Ainda mais pequeno e em edição de colecionador de 300 exemplares autografados e numerados pelo autor. A relação entre avó e neto é narrada amorosamente pelo neto. Ele relembra as brincadeiras, os carinhos e os ensinamentos de sua infância na casa da avó. Recebeu o Prêmio Bissaya Barreto de Literatura para a Infância 2008, Fundação Bissaya Barreto e foi contemplado com o selo Altamente Recomendável FNLIJ 2011.

terça-feira, 31 de maio de 2011

Portugal - Ensaio Contra a Autoflagelação, Boaventura de Sousa Santos

Os pensamentos podem ser assim explicados. De forma simples.



Boaventura de Sousa Santos tem uma nova publicação, pelas mãos da Almedina. Conheçam o essencial de 'Portugal - Ensaio Contra a Autoflagelação':


'Há algumas décadas que o ser e o estar não nos eram tão problemáticos. Vivemos um intenso episódio de ser, que é também um episódio de não-ser. Somos portugueses do mesmo modo que somos europeus? Entretanto, estamos mas a instabilidade de estar é tão grande que nos sentimos desinstalados. Estamos em Portugal do mesmo modo que estamos na Europa? Estamos sendo em múltiplas desproporções. Estamos sendo uma miniatura da dívida externa ou a dívida externa está sendo uma miniatura de nós? Estamos sendo os retornados da Europa, sem nunca daqui termos saído, chegados repentina e atabalhoadamente na ponte aérea das cotações de bolsa e das notações da dívida?'

Vida - Já Perdoei Erros Quase Imperdoáveis, Augusto Branco

Esta é a versão em português de Portugal. Do brasileiro Augusto Branco, num poema que é um livro. Hoje dedicaram-me.


'Já perdoei erros quase imperdoáveis
Tentei substituir pessoas insubstituíveis
E esquecer pessoas inesquecíveis

Já fiz coisas por impulso
Já me desiludi com pessoas
Que nunca imaginei que me desiludiriam
Mas também desiludi alguém

Já abracei para proteger
Já ri quando não devia
Fiz amigos eternos
E amigos que nunca mais vi

Amei e fui amado
Mas também fui rejeitado
Fui amado e não amei

Já gritei e saltei de tanta felicidade
Já vivi de amor e fiz promessas eternas
Mas também me magoei muitas vezes

Já telefonei só para ouvir uma voz
E apaixonei-me por um sorriso
Já pensei que fosse morrer de tanta saudade
Tive medo de perder alguém especial (e acabei por perder)

Mas vivi!
E ainda vivo!
Não passo pela vida
E também tu não deverias passar!

Bom é lutar com determinação
Abraçar a vida com paixão
Perder com classe
E vencer com ousadia

Porque o mundo pertence a quem se atreve
E a vida é muito para ser insignificante.

Vive!'

O Livro

'Dos diversos instrumentos do homem, o mais assombroso é, indubitavelmente, o livro. Os outros são extensões do seu corpo. O microscópio e o telescópio são extensões da vista; o telefone é o prolongamento da voz; seguem-se o arado e a espada, extensões do seu braço. Mas o livro é outra coisa: o livro é uma extensão da memória e da imaginação.
Em «César e Cleópatra» de Shaw, quando se fala da biblioteca de Alexandria, diz-se que ela é a memória da humanidade. O livro é isso e também algo mais: a imaginação. Pois o que é o nosso passado senão uma série de sonhos? Que diferença pode haver entre recordar sonhos e recordar o passado? Tal é a função que o livro realiza.


(...) Se lemos um livro antigo, é como se lêssemos todo o tempo que transcorreu até nós desde o dia em que ele foi escrito. Por isso convém manter o culto do livro. O livro pode estar cheio de coisas erradas, podemos não estar de acordo com as opiniões do autor, mas mesmo assim conserva alguma coisa de sagrado, algo de divino, não para ser objecto de respeito supersticioso, mas para que o abordemos com o desejo de encontrar felicidade, de encontrar sabedoria.'

segunda-feira, 30 de maio de 2011

A menina que queria escrever e viajar encontrou o jornalismo, esteve hoje na Feira

Estudou teatro e licenciou-se em Ciências da Comunicação na Universidade Nova de Lisboa. Trabalhou dez anos na rádio, continuando ainda hoje a colaborar com a RDP. Desde 1998 é jornalista no jornal Público. A partir de 2001 viajou várias vezes pelo Médio Oriente/Ásia Central e esteve seis meses em Jerusalém como correspondente. E por muitos outros lugares do mundo, como na África do Sul e Brasil. Foram-lhe atribuídos prémios de reportagem do Clube Português de Imprensa, Casa da Imprensa e o Grande Prémio Gazeta 2005. Em 2007 publicou "Oriente Próximo" na Relógio d’Água.
Alexandra Lucas Coelho é uma daquelas jornalistas como já quase não há. A Alexandra escreve com gosto, e com prazer para quem lê. Procura as noticias, faz reportagem e descreve-nos os lugares e as pessoas transportando-nos para a noticia. Porque esta escrita jornalística é por vezes tão realista, quase queirosiana. Pois então estes textos não podem ficar esquecidos em páginas de jornais ou revistas. A editora Tinta da China fez essa aposta e tem publicado esses textos, a única repetente na colecção de viagens coordenada pelo Carlos Vaz Marques conta com os "Cadernos Afegãos" e com "Viva o México", agora mais em contexto politico a última aventura da Alexandra no Egipto na altura da revolta popular neste país. Tahrir – Os Dias da Revolução conta na primeira pessoa essa vivência, a jornalista correspondente no Brasil que depois da catástrofe causada pelas chuvas nesse país, mete uns dias de férias para sentir na pele a revolução de massas, a nova revolução feita com internet e redes sociais mas também com muita força e coragem nas ruas.
Hoje foi dia de Alexandra Lucas Coelho, na Feira do Livro do Porto. Autografos e apresentação do livro e com muita pena minha não ter podido "gastar" mais tempo em conversa com ela. Vale bem a pena descobrir as palavras deste jornalismo que se faz em Portugal. Vale a pena ir lendo no blogue da autora Atlântico-Sul, da menina que queria viajar e escrever.

domingo, 29 de maio de 2011

A cidade líquida e outras texturas, Filipa Leal

Li este livro de poemas de Filipa Leal e foi uma agradável caminhada. Por uma(s) cidade(s), pela imaginação pautada por uma escrita inteligente. De todos os poemas, este é o mais forte (talvez o mais universal):


Se ao menos a morte

'Ela morria tantas vezes
em tiroteios à porta de casa
que já não sabia morrer para sempre
assim
de uma vez só.
Se ao menos se marcasse um dia
para a morte, uma hora certa
como no dentista
que apesar de tudo
nos faz esperar
onde apesar de tudo
não sabemos quando será a nossa vez.
Se ao menos a morte tivesse revistas
e gente na sala de espera
não estaríamos tão sós
tão vivos nessa ideia final
nesse desconforto.
Poríamos o nome na lista
quando estivéssemos prontos
sabendo que seria fácil desmarcar
marcar para outro dia
ou simplesmente
não comparecer.
Depois, ficaríamos com a dor,
com o terror
de passar sequer naquela rua
como ela à porta de casa.
Ela que morria tantas vezes
porque morria de medo de morrer.'

Mãe, a culpa é da feira...

Dia de muito calor... E alguns pingos. Mas nada - felizmente - que assustasse demasiado. Apenas as devidas precauções que uns plásticos ajudaram a resolver.

Hoje fui fazer o reconhecimento da área. Levei o Pedro (meu vizinho de blogue e de stand). Fico estupefacto com os espaços dos grandes grupos livreiros. Ok, percebo que representam muitas editoras e, como tal, movimentam mais gente. Não compreendo é a máquina de actividades em seu redor e, muito menos, a horrível música ambiente. Fica o conselho: os verdadeiros leitores e compradores de livros gostam de espaços acolhedores e relaxados.

Deu-me dó ver o José Luís Peixoto dar autógrafos colado a uma sessão 'pseudo-esotérica' de um outro autor. Não joga bem. Estamos a falar de um escritor que gosta de privar com o leitor...


Acabei por ficar mais tempo que o previsto. Entre uma e outra conversa, fui esticando o tempo. E, lá para o fim, enchi-me de coragem e fui ver livros. Resultado: 3 sacas cheias em pouco mais de meia hora. Felizmente tenho o olho treinado e começo a ter noção do que vale realmente a pena. Mas há sempre mais uma pérola perdida que acaba por se encontrar...

Mãe: a culpa é da feira!!