sábado, 5 de março de 2011

"A Casa de Papel"

Este é um livro que nos fala de como um grande amor por livros se transforma numa obsessão a levar quase à loucura.

Fiquei fascinada com a descrição da biblioteca de Delgado - "deparei-me com vitrines... atestadas de colecções, prateleiras giratórias que, nos corredores, sustinham grandes dicionários, discos de vinil que abarrotavam os armários, livros na casa de banho, no quarto de serviço, na cozinha, nos quartos do fundo" e da forma como a sua leitura o conduz ao "aparato de notas" e assim ao entendimento daquilo que lê. E é com esta personagem, que conhecemos o enigmático Carlos Brauer - "leitor compulsivo", cujos livros nunca fugiam a anotações, para grande desespero de Delgado, da sua aquisição constante, da feitura de um ficheiro e da sua destruição quando, numa "noite, excedeu-se no vinho, outra boa companhia, ainda que perigosa, e esqueceu-se do candelabro em cima" do mesmo. A perda do arquivo, parte queimado e parte estragado com água, conduz-lo rapidamente à loucura.... tomando a bizarra decisão de construir uma casa numa "franja de areia entre a lagoa e o mar" e cujos materiais de construção, em vez de cimento e tijolo, são os livros, os incontáveis livros que possuíra.

Acabará por ser uma morte de uma mulher, de nome Bluma, e um livro de Joseph Conrad - "A Linha de Sombra" - a despoletar todo o desenrolar da acção.


O que me cativou nesta pequena obra foi o fascínio que os livros exercem, os sentimentos que suscitam, as paixões que provocam, as feridas que nos deixam, a ordem como são arrumados e protegidos, o escutar de uma música que acompanha a sua leitura, a luz que incide nas letras e o que de mais extremo podemos fazer com eles.

Che Guevara


'Assim ganhou o grau de comandante e de chefe de segunda coluna que se organizou na Sierra Maestra: assim começou a crescer o seu prestígio e conquistou aquela fama de magnífico combatente que devia levá-lo no decurso da guerra aos mais altos postos.'

Esta frase é retirada do discurso 'Oração Fúnebre para Ernesto Che Guevara', por Fidel Castro em Habana - Praça da Revolução, 18 de Outubro de 1967.

O livro que hoje vos apresento reúne o discurso de Fidel após a morte de Che, umas páginas de Notas Biográficas e Meditações. Não vos leva mais de meia hora a lê-lo.

No fim, a editora 'Alma Azul' deixa algumas frases de Che. Partilho as mais interessantes.


'Não quero nunca renunciar à liberdade deliciosa de me enganar.'

'O conhecimento faz-nos responsáveis.'

'Se fores capaz de tremer de indignação cada vez que se comete uma injustiça no mundo, então somos companheiros.'

sexta-feira, 4 de março de 2011

Gilgamesh

'Dois terços Deus e um terço humano...'

Esta é versão de Pedro Tamen para o texto de N. K. Sandars sobre um herói lendário. Rei da cidade de Uruk, 2750 anos A.C. Berço da grande civilização Suméria.

'Gilgamesh é um dos maiores poemas épicos de sempre. Proveniente da literatura suméria data a sua escrita do terceiro milénio antes de Cristo: ou seja, 1500 anos antes da Ilíada.'

Do prefácio de Luís Alves da Costa saem as primeiras palavras: 'Esta é uma antiga história de amor. A de um Rei de Uruk a quem os deuses quiseram perder, um rei dominado pelos sentidos e pela violência dos prazeres. E da prece dos homens à divina Aruru, A-Da-Criação, que dele os livrasse, irá nascer Enkidu, o igual de Gilgamesh, e à sua imagem, «semelhante a ele como o seu próprio reflexo», Enkidu para que o combatesse.'


Sintam a leveza da narrativa:

'Proclamarei ao mundo os feitos de Gilgamesh. Foi ele o homem de quem todas as coisas foram conhecidas; foi ele o rei que conheceu os países do mundo. Ele era sábio, viu os mistérios e conheceu as coisas secretas; transmitiu-nos uma história dos dias do Dilúvio.

Fez uma longa viagem, conheceu o cansaço, esgotou-se em trabalhos e, ao regressar, descansou; e gravou numa pedra toda a história.'

O início desta história descreve um Rei Tirano e pouco amigo do seu povo. Os Deuses criam Enkidu para vencer Gilgamesh. Os dois tornam-se grandes amigos e combatem juntos importantes batalhas.

Posteriormente, Enkidu é marcado pelos deuses para morrer. Gilgamesh fica transtornado com o seu desaparecimento e parte à busca da imortalidade.

Utnapishtim é o homem que conhece o segredo. Sobreviveu a um grande dilúvio - em tudo semelhante ao da Bíblia - e ajuda o herói. Uma planta no mar traz a imortalidade ao Homem. Gilgamesh apanha-a. No entanto, no seu regresso, perde-a para uma serpente.

E acaba por morrer. Consagrado pelo seu povo.

Posso garantir-vos um tempo bem passado com este texto poético. É absolutamente belo.

Gilgamesh é uma publicação da editora Nova Vega.

quinta-feira, 3 de março de 2011

O efeito contágio

'A galinha da vizinha é melhor que a minha?'

Será que lemos motivados pelo o que o vizinho lê? E as nossas estantes? Compramos livros só para as decorar? Para não sentir vergonha quando levamos alguém lá a casa?

--- 'Este livro condiz com as minhas cortinas...', 'este fica tão bem nesta mesinha', 'vou comprar a obra do José Rodrigues dos Santos, porque toda a gente lê e pode ser motivo de conversa...', 'preciso oferecer um livro de pintura, toda a gente gosta de pintura. tem que ser caro, porque é para um médico!...' ---


Pois bem... Creio que os portugueses - em larga maioria - são matéria fácil para o marketing. Em tudo. E, como tal, nos livros também. Obviamente que, sendo um povo que lê pouco, vai ler o que 'os poucos' lêem (poucos títulos para muito público).

Hoje proponho um exercício: tentem imaginar quantos livros compram pelas vossas descobertas? Sem ser no 'ouvi dizer que aquele é muito bom'?

E digam-me se concordam!

quarta-feira, 2 de março de 2011

terça-feira, 1 de março de 2011

Não quer assinar!

Quem escreveu estas palavras (sobre mim) não quer publicidade.

E assim será. (fica o texto, não o autor)

"... há diferentes tipos de sensatez e diferentes tipos de loucura, mas o mais difícil de entender no meio desta diferença é o génio no qual elas se manifestam, sendo da mais pura justiça o reconhecimento das luzes e das sombras por que atravessa o sensato louco ou o louco sensato, e da mais forte ligação o pressentimento de um génio distante no espaço mas perto no tempo."

Ágape, agonia; William Gaddis

'Ágape (em grego "αγάπη", transliterado para o latim "agape"), é uma das diversas palavras gregas para o amor.'

'Agonia é o conjunto de fenómenos que anunciam a morte (do grego agonia = luta; entende-se luta "contra a morte").'


Do prefácio de Rodrigo Fresán abrimos a história: 'Jack Gibbs, figura do elenco de JR e narrador de Ágape, Agonia, dirige-se a nós do seu leito de morte e não é um narrador feliz. O seu corpo atraiçoou-o, e o mundo é uma merda e está dominado por tecnocratas.'

Quando damos início à leitura, não vemos mais um parágrafo. A angústia do narrador passa a ser a nossa. A velocidade de pensamento é estonteante. Sucedem-se episódios da vida presente misturados com citações, autores, músicos, pensamentos... É fácil perdermos o fio à meada.

Não há muita pontuação. O ritmo não pára: 'Tinha-o aqui algures não consigo encontrar o outro livro arranjei o lápis não tive tempo para o anotar e estou cada vez mais confuso mas é disto que se trata é esse o cerne da questão não o posso esquecer, não o posso esquecer agora porque até aqui tinha a coisa mal encadeada ainda bem que não passei a escrito tudo aquilo sobre a autenticidade e a interpretação perfeita de que ainda agora estava a falar, a linha melódica que não podia ser imitada mecanicamente porque era sim na Alemanha sim, onde mais poderia ser?'

O narrador tem pressa para acabar o livro que escreve. Tal como o autor (William Gaddis), sabe que os seus dias estão a chegar ao fim.

Tive que pousar o livro diversas vezes. Mas o seu estilo atraiu-me. E a ele regressei. No entanto, não é livro que vos diga trazer alegria. Mas nem sempre tem que ser assim...

Apanhei muitas citações. Deixo uma que Gaddis partilha, de Flaubert: 'o artista deve estar tão ausente da sua obra como Deus da Natureza, o artista deve levar a posterioridade a acreditar que ele nem sequer existiu.'

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Afloramentos do livro do mês


Ao pegar no livro 'A casa de Papel' de Carlos María Domínguez, presto atenção à crítica feita pelo jornal Público: 'Está impregnado de paixão. De paixão pela literatura, mas também pelos livros enquanto objectos.'

Folheio este pequeno livro de 78 páginas, com uma capa carregada de letras a saltar de um rasgão em papel. Leio o perfil do autor, vejo a quem ele dedica a obra...

Procuro matéria para convencer os leitores do blogue a agarrarem a narrativa. Encontro, já no fim, a opinião de outro jornal, o Expresso: 'Este curto e intenso relato tem tudo para ser um livro de culto. A história tem aquele perfume irresistível que emana das grandes obras.'

Fecho o livro. Hoje ficamos por aqui. Espero angariar mais uns quantos...

Em breve discutimos a substância de que é feito.