terça-feira, 7 de junho de 2016

indizível


as tardes estendem-se
para lá do visível
suspensa a boca para
o ângulo do ombro
na fractura exposta
do desejo todo
um sol indizível
pele afora.


Helder Magalhães



Fotografía de Cristóbal Escanilla

já não - é - do borogodó



cambaleante.
a diarista quer pagar o aluguel e não pode.
cambaleante.
a diarista tem um filho no ventre e não pode.
cambaleante.
a diarista quer comer todo dia e não pode.
cambaleante.
a diarista tem de roubar o dinheiro e não pode.
cambaleante.
a diarista quer ver o filho na escola e não pode.
cambaleante.
a diarista tem o dever de prover e não pode.
cambaleante.
a diarista quer uma dose mais forte e não pode.
cambaleante.
a diarista tem que cuidar da madame e não pode.
cambaleante.
a diarista quer seu filho em casa e não pode.
cambaleante.
a diarista tem que ser mãe e não pode.
cambaleante.
a diarista quer e não pode. a diarista quer e não pode.
cambaleante.
a diarista tem o filho morto.
cambaleante.
a diarista não pode.
não pode ser, não pode.

                  "Me ajuda, moço."





- penélope martins -





* um poema de dor para uma das diaristas que, como outras, perdeu o filho de dez anos para uma para uma justiça cambaleante.

** desconheço a autoria da fotografia.