sábado, 15 de junho de 2013

Poema à noitinha... António Gedeão

Poema da Terra Adubada

Por detrás das árvores não se escondem faunos, não.
Por detrás das árvores escondem-se os soldados
com granadas de mão.

As árvores são belas com os troncos dourados.
São boas e largas para esconder soldados.

Não é o vento que rumoreja nas folhas,
não é o vento, não.
São os corpos dos soldados rastejando no chão.

O brilho súbito não é do limbo das folhas verdes reluzentes.
É das lâminas das facas que os soldados apertam entre os dentes.

As rubras flores vermelhas não são papoilas, não.
É o sangue dos soldados que está vertido no chão.

Não são vespas, nem besoiros, nem pássaros a assobiar.
São os silvos das balas cortando a espessura do ar.

Depois os lavradores
rasgarão a terra com a lâmina aguda dos arados,
e a terra dará vinho e pão e flores
adubada com os corpos dos soldados.


*António Gedeão, in Linhas de Força.

Cronicando pela Ásia...Pukhet

Pukhet, 
28 de Abril 2009

O dia acordou e foi o adeus definitivo às ilhas Phi-Phi. Antes de partir, fui comprar os bilhetes de barco. Passei a manhã na praia e ainda almocei por lá. Agora sim, estava de partida. Passei em revista aqueles dias de descanso e contemplação. Foram a perfeita pausa numa viagem onde não tinha ainda parado.

O destino estava traçado - ia agora para um dos sítios mais turísticos da Tailândia. O objectivo passava por encontrar um bungalow na praia e relaxar uns três dias. Mas foi impossível...

As pessoas diziam - "não há bungalows na ilha!". Nem de um lado nem do outro. Zarpei para um posto com internet, pesquisei por todo o lado e... nada. Havia alguns, sim... mas muito longe dali. A alternativa era ir para bungalows em resorts exclusivos e caros. 

Saí de Pukhet Town e segui em direcção a Patong Beach. Apanhei um Tuk-tuk e fiz uns quilómetros até à costa. O dia não estava famoso e o sol escondia-se entre nuvens. Calor sempre, humidade a mil... mas ameaçava chuva.

Patong parecia a praia da Oura em Albufeira (versão Thai). Uma rua repleta de bares, prostitutas a dançar em cima de balcões, muito barulho e, claro está, ingleses. Um pensamento imediato: por onde andam os ingleses a noite é sempre igual. Em Portugal, na Tailândia... apenas mudam as caras.


A frustração foi grande. Não queria estar num sítio igual a tantos outros no mundo. Fui pousar as malas ao quarto. Tinha televisão, uma cama formidável e água quente. Acabou por ser o que mais gostei de Pukhet!

E foi ali que se fez história nesta viagem pela Ásia: tomei o primeiro banho quente. Mas não só, também peguei na lâmina e fiz a barba. Havia quinze dias que não fazia. Ganhei um aspecto civilizado. Para trás ficava um primo do Indiana Jones... 

A noite chegou e com ela uma visita à loucura. O restaurante era de peixe e marisco, um sítio barato. O marisco daquelas águas não tem grande sabor. Já sabia que o das águas frias tem mais sabor, mas não imaginava tamanha diferença. 

Foi no restaurante que ouvi falar pela primeira vez da gripe A. A televisão passava imagens bem dali perto. Em Hong Kong as pessoas já andavam de máscara e luvas. Estava a leste daquilo tudo. Como não sabia que pandemia era esta e não entendo Thai, pareceu-me prudente deixar de comer porco. 


Dei uma volta pela rua principal e entrei em alguns bares. Não era muito a minha onda, estava à espera de algo mais relaxado. Acabei por pousar no bar da praia. Estive por lá um pouco e depois recolhi ao quarto.

A última imagem que tenho é de adormecer com o jogo de futebol entre o Barcelona e o Chelsea. Ficou zero-zero na primeira mão. A segunda veria mais tarde, no Laos...

Rodrigo Ferrão

Handwritten Manuscript Pages From Classic Novels: James Joyce

Já alguma vez pensou ver Ulysses desta forma? Então fique com uma das suas páginas, escritas pelo próprio James Joyce.

Visite o site http://flavorwire.com para encontrar mais. 
Siga o link directo.

Que significado têm as primeiras palavras no livro de Clarice?

Que significado têm as primeiras palavras no livro de Clarice? O que deixam adivinhar?

[Fiquem  com Jeanne d'Arc au bûcher - de Honegger, um oratório dito por Marion Cotillard]


Uma aprendizagem ou o Livro dos Prazeres*

Depois disto olhei, e eis que vi uma porta
aberta no céu, e a primeira voz que ouvi
era como a trombeta que falava comigo,
dizendo: sobe aqui, e mostrar-te-ei as coisas
que devem acontecer depois destas.
                                 APOCALIPSE, IV, 1

Provo.......................................................
Que a mais alta expressão
                                      da dor.................
Consiste essencialmente
                                    na alegria...............
                            AUGUSTO DOS ANJOS

Jeanne:
Je ne veux pas mourir! J'ai peur!
.................................................................
Iy y a la joie qui est la plus forte!

                                (Oratório dramático de
                    PAUL CLAUDEL para música
                                   de Honegger, Jeanne 
                    d'Arc au bûcher).



*Publicado pela Relógio D'Água

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Não há Feira, mas há Escritores! - o Clube de Leitores lança evento de divulgação

Vários escritores decidiram lançar uma iniciativa intitulada “Acorda Porto” para protestar simbolicamente contra a não realização da feira do livro nesta cidade e permitir um encontro entre os escritores e os seus leitores.

O Clube de Leitores não podia deixar de estar super solidário e presente. Como tal, achou importante dar o seu contributo e criar um evento no facebook para convidar e dar a conhecer a iniciativa ao máximo de gente possível. 

Adiram, partilhem, divulguem.

Aqui segue o link: 


*Página da iniciativa - consulte aqui.

1º Parágrafo: Fogos


O nome do meu pai era Clevie Raymond Carver. A sua família chamava-lhe Raymond e os amigos chamavam-lhe C.R. Deram-me o nome de Raymond Clevie Carver Júnior, e sempre odiei a parte do “Júnior”. Quando era pequeno, o meu pai chamava-me Sapo, e disso eu gostava. Mas, mais tarde, como toda a gente na família, ele começou a chamar-me Júnior. E continuou a tratar-me assim até eu ter treze ou catorze anos, idade em que anunciei que não responderia mais por esse nome. Por isso começou a chamar-me Doc. A partir desse momento, e até ao dia em que morreu, a 17 de Junho de 1967, tratou-me por Doc, ou então por Filho. Quando ele morreu, a minha mãe ligou à minha mulher para lhe dar a notícia. Eu encontrava-me afastado da minha família nessa altura, entre vidas, tentando entrar na Faculdade de Biblioteconomia da Universidade do Iowa. Quando a minha mulher atendeu o telefone, a minha mãe exclamou: “O Raymond morreu!” Por um instante a minha mulher julgou que a minha mãe lhe estava a dizer que eu tinha morrido. Depois a minha mãe explicou de qual dos Raymond estava a falar e a minha mulher disse: “Graças a Deus. Achei que estava a falar do meu Raymond.”



* Tradução de João Tordo e João Luís Barreto Guimarães


a-ver-livros: a rimar com Marie Fox

Risca arrisca na areia
junto ao mar
escreve o nome
teu e meu
sem hesitar
há-de vir a onda 
que o irá apagar

* para conhecer melhor a pintora americana Marie Fox
siga o link  mariefoxpaintingaday.blogspot.pt

quinta-feira, 13 de junho de 2013

É do borogodó: paixões incontroláveis

Peço-te humildemente que encerre este estado miserável de ausência. Dói profundamente a saudade da intimidade que ainda não tivemos

http://azeiteealecrim.wordpress.com/2012/04/14/paixoes-incontrolaveis/

fotopoema 
Penélope Martins

1º Parágrafo: Quanto mais depressa ando, mais pequena sou


Sempre gostei de acabar as coisas. Tapa-orelhas, inverno, primavera, verão, outono. A vida de trabalho do Epsilon. Conforma-te. E esta impaciência teve consequências quando, uma vez, o Epsilon me deu uma orquídea no meu aniversário. Uma orquídea não era o que eu mais queria; nunca percebi qual o interesse flores, pois vão todas acabar por murchar. O que mais queria era que o Epsilon se reformasse. “Mas preciso de um refúgio da...”, e ele parecia prestes a dizer “companhia a dois”, mas então disse “nudez”. “Estás a falar de mim?”, perguntei. “Não vou mencionar nomes”, disse ele.


* Tradução de João Reis

Fernando Pessoa - 125 anos ditos num poema. Por Gonçalo Waddington.


Fernando Pessoa nasceu faz hoje 125 anos.
E a revista Granta revela, no seu primeiro número, cinco sonetos inéditos do poeta.

Ouçam um soneto de Pessoa dito por Gonçalo Waddington.

a-ver-livros: bucólico e Meadow Gist

Aninha-te à sombra
e espera
e espera
e espera mais um pouco
um pássaro há-de pousar na fímbria
do teu vestido
e cantar a canção
que irá aplacar o torvelinho
que vai dentro 
do teu corpete

Enquanto não chega 
rende-te ao murmúrio do rio
ao restolhar das copas
ao ritmo da poesia

* para saber mais sobre a pintor americana Meadow Gist
siga o link www.meadowpaint.com

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Fausto canta Daniel Filipe

"Não fora o grito a faca
de súbito rasgando
a fronteira possível
Não fora o rosto   o riso
a serena postura
do cadáver na praia

Não fora a flor a pétala
recortada em vermelho
o longínquo pregão
o retrato esquecido
o aroma da pólvora
a grade na janela

Não fora o cais   a posse
do nocturno segredo
a víbora   o polícia
o tiro   o passaporte
a carta de paris
a saudade da amante

Não fora o dente agudo
de nenhum crocodilo

Não fora o mar tão perto
Não fora haver traição
"


Daniel Filipe

Descobri este poema de Daniel Filipe - sim, o poeta de "Invenção do Amor" - há dias, sem querer, ao cruzar-me com um disco de 1974. "Pró que der e vier" é um LP de Fausto, com música, arranjos e direcção musical do próprio e produção de Adriano Correia de Oliveira e José Niza. Ouçam agora, lindo, o poema de Daniel Filipe interpretado pelo cantautor.

1º Parágrafo: Ar de Dylan


Há quem entre muito tarde no teatro da vida, porém, quando o faz, parece que entra desencabrestado e directo ao fim da obra. Foi esse o meu caso. E hoje posso assegurá-lo com toda a confiança. A representação começou na manhã em que a minha mulher me entregou uma carta que acabava de chegar da Suíça, um convite para participar num congresso literário sobre o Fracasso.


* Tradução de Miranda das Neves

a-ver-livros: ousar e Monique de Roux

Ousa afagar
a ferida
ousa apagar a memória
da dor
entre golfadas
de azul e gardénias
atreve o gesto
que não queres fazer
sem esperança na redenção

colherás madrugadas
de parágrafos novos


* para saber mais sobre a pintora Monique de Roux
siga o link www.moniquederoux.com

terça-feira, 11 de junho de 2013

É do borogodó: Machado de Assis e a mosca azul

Na minha adolescência não gostei muito de Machado de Assis, com exceção das "Memórias Póstumas de Brás Cubas", obra para a qual qualquer mente se rende, quer pela imaginação absurdamente fantástica do autor, quer pelo morto que é mesmo muito vivo na história. Redescobri Machado de Assis bem crescida. Nos contos de “O Medalhão”, encontrei uma ironia perspicaz na revelação do comportamento humano.

Costumo dizer que não importa a capacidade de ler dez, cem ou mil livros, se (e eu digo SE “maiscularmente”, perdoem aqui o neologismo necessário) o leitor não conversa com as linhas, não diz palavras em voz alta, não traz para si, não sente fundo, não torna viva aquela reflexão. Basta ler um verso para desabar um mundo. Um poema pode fazer nascer um novo universo.

Parece que Machado de Assis é um caso típico de alguém que se deixou envolver seriamente com as palavras. De família pobre, o carioca nascido aos 21 de junho de 1839, mal frequentou a escola pública, mas desenvolveu uma literatura com todos os géneros: poesia, conto, crónica, ensaio, romance, dramaturgia, Machado de Assis passou por ministérios, fundou a Academia Brasileira de Letras e foi seu primeiro presidente, eleito por unanimidade.

No meu caso, desde que o poema “A Mosca Azul” zuniu aos meus ouvidos sou toda amorosa pelo legado de Machado de Assis. O poema que, antes é fantasia, alcança maravilhamento e também disseca a natureza humana.

Quem de nós já não se viu como poleá deslumbrado com a beleza, o mistério, a raridade, o valor, o esplendor. Instrumentos de graça aguçam a paixão, mas terminam por se transformar em desejo de posse que fatalmente deságua em brutalidade.

O poema de Machado de Assis vê o mundo e também vê por dentro da gente; já o amor não carece de deslumbramento, nem quem ama se investe com ganas de possuidor. Viver a maravilha de deixar viver.

Pequena observação talvez pertinente para alguns: poleá é o homem sem origem nobre, o plebeu, o João ninguém. Ironicamente no poema o poleá vira Rei e, investido de nobreza, pode tudo possuir. Aconselho leitura minuciosa, lendo e relendo, em voz alta para que as paredes possam guardar um pouco do som e a mosca azul, esteja onde estiver, possa perdoar nossa ganância.

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=ElIORPS4vFA

"Era uma mosca azul, asas de ouro e granada,
Filha da China ou do Indostão.
Que entre as folhas brotou de uma rosa encarnada.
Em certa noite de verão.

E zumbia, e voava, e voava, e zumbia,
Refulgindo ao clarão do sol
E da lua — melhor do que refulgiria
Um brilhante do Grão-Mogol.

Um poleá que a viu, espantado e tristonho,
Um poleá lhe perguntou:
— “Mosca, esse refulgir, que mais parece um sonho,
Dize, quem foi que te ensinou?”

Então ela, voando e revoando, disse:
— “Eu sou a vida, eu sou a flor
Das graças, o padrão da eterna meninice,
E mais a glória, e mais o amor”.

E ele deixou-se estar a contemplá-la, mudo
E tranqüilo, como um faquir,
Como alguém que ficou deslembrado de tudo,
Sem comparar, nem refletir.

Entre as asas do inseto a voltear no espaço,
Uma coisa me pareceu
Que surdia, com todo o resplendor de um paço,
Eu vi um rosto que era o seu.

Era ele, era um rei, o rei de Cachemira,
Que tinha sobre o colo nu
Um imenso colar de opala, e uma safira
Tirada ao corpo de Vixnu.

Cem mulheres em flor, cem nairas superfinas,
Aos pés dele, no liso chão,
Espreguiçam sorrindo as suas graças finas,
E todo o amor que têm lhe dão.

Mudos, graves, de pé, cem etíopes feios,
Com grandes leques de avestruz,
Refrescam-lhes de manso os aromados seios.
Voluptuosamente nus.

Vinha a glória depois; — quatorze reis vencidos,
E enfim as páreas triunfais
De trezentas nações, e os parabéns unidos
Das coroas ocidentais.

Mas o melhor de tudo é que no rosto aberto
Das mulheres e dos varões,
Como em água que deixa o fundo descoberto,
Via limpos os corações.

Então ele, estendendo a mão calosa e tosca.
Afeita a só carpintejar,
Com um gesto pegou na fulgurante mosca,
Curioso de a examinar.

Quis vê-la, quis saber a causa do mistério.
E, fechando-a na mão, sorriu
De contente, ao pensar que ali tinha um império,
E para casa se partiu.

Alvoroçado chega, examina, e parece
Que se houve nessa ocupação
Miudamente, como um homem que quisesse
Dissecar a sua ilusão.

Dissecou-a, a tal ponto, e com tal arte, que ela,
Rota, baça, nojenta, vil
Sucumbiu; e com isto esvaiu-se-lhe aquela
Visão fantástica e sutil.

Hoje quando ele aí cai, de áloe e cardamomo
Na cabeça, com ar taful
Dizem que ensandeceu e que não sabe como
Perdeu a sua mosca azul.
"

de Machado de Assis

Um site do Governo Brasileiro disponibiliza informações e a obra completa de Machado de Assis. O link é http://machado.mec.gov.br/.

Penélope Martins

1º Parágrafo: Fala-lhes de Batalhas de Reis e de Elefantes


A noite não comunica com o dia. Arde nele. Levam-na para a fogueira ao alvorecer. E, juntamente com ela, a sua gente, os beberrões, os poetas, os amantes. Nós somos um povo de degredados, de condenados à morte. A ti não te conheço. Conheço o teu amigo turco; é um dos nossos. A pouco e pouco desaparece do mundo, engolido pela sombra e pelas miragens; somos irmãos. Não sei que dor ou que prazer o empurrou para nós, para o pó de estrela, talvez o ópio, talvez o vinho, talvez o amor; talvez alguma obscura ferida na alma, bem escondida nos recessos da memória.


* Tradução de Pedro Tamen
* Revisão Clara Boléo
* Edição Cecília Andrade

a-ver-livros: finitude e Mihail Aleksandrov

Apanha-me do chão
ou varre apenas os cacos
dos meus sonhos
para baixo do relvado
mais próximo

Entrega-me para compostagem
sou restos das carnes
que por mim passaram
resto de mim que passei
por onde não quis ficar

Resíduo de dias sem peso
e sem a clareza da finitude

* para saber mais sobre o pintor lituano naturalizado americano
Mihail Aleksandrov siga o link aleksandrov.com

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Poema à noitinha... o regresso de Valter Hugo Mãe

poema sobre o amor eterno

inventaram um amor eterno. trouxeram-no em braços para o meio das pessoas e ali ficou, à espera que lhe falassem. mas ninguém entendeu a necessidade de sedução. pouco a pouco, as pessoas voltaram a casa convictas de que seria falso alarme, e o amor eterno tombou no chão. não estava desesperado, nada do que é eterno tem pressa, estava só surpreso. um dia, do outro lado da vida, trouxeram um animal de duzentos metros e mil bocas e, por ocupar muito espaço, o amor eterno deslizou para fora da praça. ficou muito discreto, algo sujo. foi como um louco o viu e acreditou nas suas intenções. carregou-o para dentro do seu coração, fugindo no exacto momento em que o animal de duzentos metros e mil bocas se preparava para o devorar

*valter hugo mãe, in contabilidade.

Prémio Mingote para Pinto & Chinto

Os ilustradores David Pintor y Carlos López (Pinto & Chinto) ganharam um importante prémio. Como sabem, o Clube de Leitores acompanha de perto o trabalho de David. Já falámos por cá de muitos livros infantis, mas também da fabulosa série de caricaturas de escritores conhecidos.

Parabéns David. Um grande abraço.

El Premio Mingote ha sido otorgado, por mayoría, a los dibujantes Pinto & Chinto (David Pintor y Carlos López) por una viñeta publicada en «La Voz de Galicia» el 23 de junio de 2012. En ella se ve a la canciller alemana, Angela Merkel, activando un potro de tortura en el que se halla, atada de pies y manos con grilletes, una mujer que representa a España. Es su particular visión del Plan de Crecimiento de la Unión Europea. David Pintor (La Coruña, 1975) es ilustrador, humorista gráfico y caricaturista. Su carrera arranca en 1993, momento en que empieza a trabajar con el guionista Carlos López Carlos López (Boimorto, La Coruña, 1967) bajo el pseudónimo de Pinto & Chinto. Juntos lograron convertirse en pocos años en unareferencia del humor político en prensa gracias a sus tiras diarias. Actualmente, estos trabajos gráficos se publican a diario en las páginas del diario «La Voz de Galicia». Pinto & Chinto llevan quince años de fructífera colaboración artística, durante los cuales han desarrollado una sólida carrera profesional, que abarca, además del humor gráfico, campos como la literatura infantil. Han cosechado numerosos premios tanto de forma individual como conjunta: el Merlín, el Frei Martin Sarmiento... Fueron seleccionados para participar en la Feria Internacional de Bolonia.

Notícia do jornal ABC.


Acompanhe Pinto & Chinto em lavozdegalicia. 

1º Parágrafo: A Praia


Há bastante tempo que havia combinado com o meu amigo Doro que seria seu hóspede. Tinha pelo Doro uma grande estima , e quando ele, para se casar, foi viver para Génova, fiquei transtornado. Quando lhe escrevi, recusando assistir ao casamento, recebi uma resposta seca e atrevida, na qual me explicava que, se o dinheiro não servisse sequer para se estabelecer na cidade que agrada à mulher, então não se compreende para que servia. Depois, um belo dia, de passagem por Génova, apresentei-me em sua casa e fizémos as pazes. A sua mulher acabou por me parecer muito simpática, uma rapariga travessa que me pediu graciosamente para a tratar por Clelia e que nos deixou sós apenas o tempo que era necessário; quando à noite, reapareceu para sair connosco, transformara-se numa senhora encantadora, a quem, se eu fosse outro, teria beijado a mão.


* Tradução do italiano por Ana Tomás

Fado Português, José Régio

Fado Português

O Fado nasceu um dia,
quando o vento mal bulia
e o céu o mar prolongava,
na amurada dum veleiro,
no peito dum marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.

Ai, que lindeza tamanha,
meu chão , meu monte, meu vale,
de folhas, flores, frutas de oiro,
vê se vês terras de Espanha,
areias de Portugal,
olhar ceguinho de choro.

Na boca dum marinheiro
do frágil barco veleiro,
morrendo a canção magoada,
diz o pungir dos desejos
do lábio a queimar de beijos
que beija o ar, e mais nada,
que beija o ar, e mais nada.

Mãe, adeus. Adeus, Maria.
Guarda bem no teu sentido
que aqui te faço uma jura:
que ou te levo à sacristia,
ou foi Deus que foi servido
dar-me no mar sepultura.

Ora eis que embora outro dia,
quando o vento nem bulia
e o céu o mar prolongava,
à proa de outro velero
velava outro marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.


*José Régio, in Poemas de Deus e do Diabo

domingo, 9 de junho de 2013

Poema à noitinha... Cesário Verde

Heroísmos

Eu temo muito o mar, o mar enorme,
Solene, enraivecido, turbulento,
Erguido em vagalhões, rugindo ao vento;
O mar sublime, o mar que nunca dorme.

Eu temo o largo mar, rebelde, informe,
De vítimas famélico, sedento,
E creio ouvir em cada seu lamento
Os ruídos dum túmulo disforme.

Contudo, num barquinho transparente,
No seu dorso feroz vou blasonar,
Tufada a vela e n'água quase assente,

E ouvindo muito ao perto o seu bramar,
Eu rindo, sem cuidados, simplesmente,
Escarro, com desdém, no grande mar!



*Cesário Verde, in O Livro de Cesário Verde.

Handwritten Manuscript Pages From Classic Novels: Gustave Flaubert

Já alguma vez pensou ver Madame Bovary desta forma? Então fique com uma das suas páginas, escritas à mão por Gustave Flaubert.

Visite o site http://flavorwire.com para encontrar mais. 
Siga o link directo.

Clarice Lispector em Junho

Ali em pé na semiescuridão do terraço, de repente mais suave, veio-lhe outra revelação que durou pois era o resultado intuitivo de coisas que ela pensara antes racionalmente. O que lhe veio foi a levemente assustadora certeza de que os nossos sentimentos e pensamentos são tão sobrenaturais como uma história passada depois da morte. E ela não compreendeu o que queria dizer com isso. Ela o deixou ficar, ao pensamento, porque sabia que ele encobria outro, mais profundo e mais compreensível. Simplesmente, com o copo de água na mão, descobria que pensar não lhe era natural. Depois refletiu um pouco, com a cabeça inclinada para um lado, que não tinha um dia a dia. Era uma vida a vida. E que a vida era sobrenatural.
Naquela hora da noite conhecia esse grande susto de estar viva, tendo como único amparo apenas o desamparo de estar viva. A vida era tão forte que se amparava no próprio desamparo.


Clarice Lispector está na minha agenda de leituras. Conheço-lhe pensamentos, frases poderosas, poemas... Fui ver a exposição dela a Lisboa - na Gulbenkian. Sei muitos pormenores da sua vida, apaixonei-me pela sua história. Mas o acaso não me pôs um livro à frente para o ler. São coisas que não se explicam... Simplesmente são como são.

Fui ao quarto ver o que tenho de Clarice. E felizmente tenho muito por onde escolher. Peguei em Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres e descubro que mora aqui em casa há quatro anos. É a altura dele. Melhor ainda por saber que vai ser partilhado neste blog.

Leio a nota inicial. E é com ela que vos deixo. Espero que partam nesta aventura pelo mundo de Clarice. Vai valer a pena.

ESTE LIVRO se pediu uma liberdade
maior que tive medo de dar. Ele está
muito acima de mim. Humildemente
tentei escrevê-lo. Eu sou mais forte
do que eu.

C.L.

*Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres é uma edição da Relógio D'Água. 

Jack Kerouac lê «On The Road»

Vale a pena ouvir o pai de «On the Road».