sábado, 1 de outubro de 2011

Vida Incipiente

Por Ruben A.

"O facto real da vida é que estamos de novo todos juntos sem se saber como nem porquê, é o imponderável que liga os seres e os deixa andar á deriva como pedaço de cortiça em praia batida pelo norte - o resto, se se quiser analisar, é uma babugem de relações sem eira nem beira ao deslizar da corrente que tanto vem dos outros lados do Atlântico como da disposição em cada um de nós. Os dias foram andando dentro de cada um de nós e na marcha de pormenores domésticos gastámos horas preciosas de nós mesmos. Acerca de comédias fizemos considerações pessoais e quando se tratava de analisar uma tragédia usufruíamos um gozo espiritual de dever cumprido sexualmente.


Passaram-se anos, também não sei quantos. Houve uns que casaram, outros que ficaram para ornamento ímpar de jantares familiares e ainda outros que se ambulanteiam pelas esquinas do vício à procura de óleo para uma máquina donde se desprendeu já a mola real do entendimento.

Afinal também não importa que o ritmo das coisas tenha sido o mesmo, se todas as coisas existem para um ritmo que lhes é íntimo à sua própria expressão de coisas. Houve sábados e domingos sextas e quintas segundas e terças e sempre uma quarta-feira a comandar no equilíbrio do princípio e do fim. Com os dedos mataram-se formigas que estavam fáceis ao alcance de um piparote e através das mãos fizemos a construção de novos dias. Cada um de nós teve uma história mais ou menos grande e mais ou menos importante para contar no seu íntimo. Às vezes eu lá encontrava um de nós para logo ter a impressão que se apoderava de todos uma moléstia sentimental de visão acabrunhada e de história em história ou de pieguice para pieguice caminhávamos inúteis no amorfo de abatjours contemplativos."

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

ALA regressa às livrarias...

António Lobo Antunes, a chegar às livrarias com novo livro.


"«Um doloroso canto de uma mulher torturada» foi o ponto de partida para Comissão das Lágrimas,o novo livro de António Lobo Antunes. A mulher torturada foi Elvira (conhecida por Virinha), comandante do batalhão feminino do MPLA presa, torturada e morta na sequência dos terríveis acontecimentos de Maio de 1977 em Angola.
Mas este é apenas um episódio num livro denso e sombrio sobre Angola depois da independência. António Lobo Antunes não quis fazer um livro documental ou uma reportagem «verídica» sobre o que se passou em Angola, antes usou a sua sensibilidade e o espantoso poder evocativo da sua escrita para falar sobre a culpa, a vingança, a inocência perdida."

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Fotografia: o 'actor' principal é um livro!!!



Agradecimento a Alexandre Lemos, pela partilha no grupo "Livros no facebook".

Louvor do Revolucionário

Por Bertold Brecht.

"Quando a opressão aumenta
Muitos se desencorajam
Mas a coragem dele cresce.
Ele organiza a luta
Pelo tostão do salário, pela água do chá
E pelo poder no Estado.
Pergunta à propriedade:
Donde vens tu?
Pergunta às opiniões:
A quem aproveitais?


Onde quer que todos calem
Ali falará ele
E onde reina a opressão e se fala do Destino
Ele nomeará os nomes.

Onde se senta à mesa
Senta-se a insatisfação à mesa
A comida estraga-se
E reconhece-se que o quarto é acanhado.

Pra onde quer que o expulsem, para lá
Vai a revolta, e donde é escorraçado
Fica ainda lá o desassossego."

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Diamantes de Sangue, Rafael Marques

Livro polémico, Diamantes de Sangue explica o negócio dos diamantes de Angola.

Uma novidade publicada pela Tinta da China.


"O trabalho de investigação de Rafael Marques é já bem conhecido, sobretudo através dos canais de comunicação on-line. É ele um dos principais responsáveis por denunciar e divulgar os esquemas de corrupção que envolvem as mais altas esferas do poder em Angola, bem como as empresas e entidades estrangeiras que com ele negoceiam.
Na região do Cuango, a situação é trágica.
Para benefício dos que exploram os diamantes, as populações são mantidas em condições de quase escravatura, sendo torturadas, assassinadas, roubadas e impedidas de manter quaisquer actividades de auto-subsistência.
As autoridades e o governo ignoram os crimes, as forças armadas e policiais são não só coniventes como também protagonistas desses crimes."

Poemas que dão música - António Gedeão

Pedra Filosofal - Canta Manuel Freire



"Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,

Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança."

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A Minha Ausência de Ti

William Shakespeare


"Foi tal e qual o inverno a minha ausência
de ti, prazer dum ano fugitivo:
dias nocturnos, gelos, inclemência;
que nudez de dezembro o frio vivo.
E esse tempo de exílio era o do verão;
era a excessiva gravidez do outono
com a volúpia de maio em cada grão:
um seio viúvo, sem senhor nem dono.
Essa posteridade em seu esplendor
uma esperança de órfãos me parecia:
contigo ausente, o verão teu servidor
emudeceu as aves todo o dia.
Ou tanto as deprimiu, que a folha arfava
e no temor do inverno desmaiava."

Um abraço de José Luís Peixoto

Para já, pouco se sabe sobre o novo livro de José Luís Peixoto. Vai chamar-se 'Abraço' e esta é a sua capa:

domingo, 25 de setembro de 2011

Sofrer Para Nada Serve

Texto de Cesare Pavese.

"Porque esquecemos os mortos? Porque já não têm préstimo.
Esquecemos, repudiamos uma pessoa triste ou doente, em virtude da sua inutilidade psíquica ou física.
Ninguém se abandonará a ti, se não vir nisso algum proveito.
E tu? Creio ter-me abandonado uma vez, desinteressadamente. Não devo, portanto, chorar por ter perdido o objecto daquele abandono. Já não seria desinteressado, nesse caso.
No entanto, vendo quanto se sofre, o sacrifício é antinatural. Ou superior às minhas forças. E chorar é ceder ao mundo, é reconhecer que se procurava algum proveito.
Há alguém que renuncie, podendo ter? A caridade não é outra coisa que o ideal da impotência.


Basta de virtuosa indignação! Se tivesse tido dentes e habilidade, teria apanhado a presa.
Mas isto não impede que a cruz do desiludido, do falido, do sacrificado - eu - seja atroz de suportar. Afinal de contas, o mais famoso dos crucificados era Deus: nem desiludido, nem falido, nem vencido. No entanto, apesar de todo o seu poder, gritou "Eli!", mas depois dominou-se e triunfou, e já o sabia de antemão. A esse preço, quem não queria ser crucificado?
Há tantos que morreram desesperados. E esses sofreram mais do que Cristo.
Mas a grande, a tremenda verdade é esta: sofrer, para nada serve."

A Surpresa de Handa, Eileen Browne

A Surpresa de Handa de Eileen Browne é muito educativo. Fica o meu conselho para uma boa prenda. Apesar de recomendado para o 2.º ano de escolaridade (para leitura orientada), pode ser um bom livro para os pais lerem ao canto da cama dos filhos.



"A Handa mete no cesto sete frutas deliciosas para fazer uma surpresa à sua amiga Akeyo. Mas no caminho a Handa passa por muitos animais, e as frutas têm um ar muito convidativo… Quando chega junto da amiga e poisa o cesto, quem tem uma grande surpresa é a Handa!"

A Surpresa de Handa é publicado pela Caminho.