sábado, 26 de janeiro de 2013

Prémio do Público do Porto Cartoon de 2012 fala português


Entre 40 cartoons à escolha, onde estavam vários trabalhos internacionais, os internautas preferiram atribuir o "prémio do público" a Fernando Camarneiro Costa.

A votação para o "prémio do público" estava aberta a todos os internautas do mundo. Desta votação resulta o veredicto do público, que acabou por escolher o cartoon "E tudo o rico parou!", do artista português Fernando Camarneiro Costa, de entre 40 trabalhos, grande parte deles internacionais, como o vencedor.

O próprio "La Scalla", de Gatto, que tinha vencido o "Grande Prémio PortoCartoon", ficou apenas no terceiro lugar.

Com este prémio, o artista português vai ter direito a uma exposição antológica individual da sua arte, no próximo Porto Cartoon, em Junho, no Museu Nacional da Imprensa, que vai ter como tema "Liberdade, Igualdade e Fraternidade".



Os livros com os participantes e vencedores do Porto Cartoon em edições anteriores estão publicados pelas Edições Afrontamento e o título remete sempre para o tema da respectiva edição.



Catálogo da XI Edição do Porto Cartoon World Festival subordinada ao tema da Crise. Pelos cartoons reunidos neste livro percebe-se que não há crise no humor. Pelo contrário, a crise é o fermento do humor. Ela excita o humor e dá-lhe rédea solta. Faz parte da sua natureza viver das falhas, dos fracassos dos sistemas, dos seus abalos, das contradições, dos destroços... As crises sempre foram propulsores do humor. Além dos grandes nomes do humor internacional, este Porto Cartoon apresenta muitos jovens, mostra uma forte presença de desenhadores iranianos e constitui-se como uma revelação de mulheres cartoonistas. Aqui se publicam cerca de 300 cartoons, vindos de cerca de 70 países.

«Poemacto II: Minha cabeça estremece com todo o esquecimento». Rodrigo Leão e Herberto Hélder

Desta vez partilho esta união entre Rodrigo Leão e Gabriel Gomes neste belíssimo poema de Herberto Helder. Para escutar muito atentamente: seis minutos de pura magia!


Do álbum "Os Poetas": Entre Nós e as Palavras, 1997
Rodrigo Leão & Gabriel Gomes

«Harpas ao Luar» - fechamos com chave e ouro esta semana com Emílio Miranda

Foto: Cláudia Miranda

Harpas ao luar

Avistam-se ao longe as luzes da cidade
Afogadas em sombras e neblinas
E dentro de ti a ansiedade
É a mais pequena das tuas sinas

Sobre as nuvens há campos de cerejeiras
Bebendo o sol que te corre nas veias
Frutos rubros sorvem-te a alma,
Acesos em desejos e despidos de toda a calma…

Os prédios respiram embalados pelos sonhos
De todas as criaturas que os habitam
Mas todos eles são ilusão, todos gravitam
Entre a noite e a ausência de chão

Um dia – acreditas – as noites darão lugar aos dias
E os prédios deixarão de gritar a aflição
(de todas as almas…)
O silêncio será então a melhor das melodias,
E as cerejeiras harpas tocadas pelo luar…


Emílio Miranda
*O Clube de Leitores quer deixar um agradecimento especial ao Emílio Miranda por ter colaborado esta semana connosco. Acreditamos que demos a conhecer o seu trabalho e também ajudamos a divulgar o nosso projecto. Uma palavra especial para a Cláudia Miranda: que tão bem soube acompanhar os poemas do escritor com as suas fotos. Até sempre! 

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Haja descaramento!


Convite: s. m. acto de convidar; carta ou cartão por meio do qual se convida; dádiva; favor; (ant.) festim
In Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, 8ª Edição

Pois, gosto de definições, gosto de sinónimos.
Gosto de dicionários.


E onde é que se vota?


Quadradinho a quadradinho, por ORDEM ALFABÉTICA, procuram a categoria Livros, Literatura, Poesia e encontram o CLUBE DE LEITORES.

Bem-hajam e, se vos fiz sorrir, gostei!

Guardo a minha vida em livros de poemas: o mote dado por Emílio Miranda

(Este poema faz parte de um conjunto que denominei Ciclo Maria Azenha, em que o Mote é um verso da poetisa, que desenvolvo no poema a seguir. Este é o Mote VIII)



Foto: Cláudia Miranda

Mote: … guardo a minha vida em livros de poemas...

Guardo a minha vida
Em poemas, cujos livros
Aguardam ser escritos…
Guardo a minha alma
Em pétalas de açucenas
Que lanço ao vento
Quando o vento silencia todos os gritos…
Talvez um dia a natureza dite
Que os frutos nasçam não de sementes
Mas de lembranças…
E as crianças
Do olhar de quem as deseja…
Talvez um dia
As palavras
Signifiquem
Não o que dizem
Mas o que esperamos delas…
E as estrelas
Brilhem
Não fora
Mas dentro de nós!
Talvez então
A voz
Seja o que deve ser
Uma luz ao anoitecer
Uma noz
De desejo
Irrompendo
Sem dor
E talvez, por fim,
O Amor
Sejamos nós…


Emílio Miranda
*esta semana em destaque no Clube de Leitores. 

1º Parágrafo: A Zona de Desconforto


Naquela noite tinha havido uma tempestade em St. Louis. A água quedava-se em negros charcos fumegantes na calçada fronteira ao aeroporto, e, do banco traseiro do táxi, eu via a agitação dos ramos dos carvalhos sobre um fundo de nuvens citadinas baixas. Era sábado e as estradas estavam saturadas de uma sensação de extemporaneidade, de atraso, de atraso – a chuva não caía, já tinha caído.


* Tradução de Francisco Agarez.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Uns excertos do "O Suave e o Negro" para abrir o apetite


"Desde cedo, algo muito forte dentro de mim me levou a acreditar que poderia mudar o  mundo e salvar todos os infelizes que se cruzassem comigo. Para conseguir mudar o mundo enveredei pela política, montando casa na esquerda. Porquê a esquerda?"

"filho-de-puta-pá-cabrão-do-caralho-pá-foda-se-pá-como-é-que-é-possível-meu-não-se-faz-pá-não-se-faz-pá-filho-de-puta-pá-tou-tão-fodido-meu-aquele-cabrão-do-caralho-pá-imagens-sequenciais-da-cara-dele-a-ser-despedaçada-por-mim-murros-na-cara-murros-na-boca-pontapés-na-cara-pontapés-na-boca-cada-vez-que-tentares-falar-levas-mais-e-com-mais-força-(...)"

"Cada vez que te diminuem e te calas, engrossas o exército de operários da tua fábrica de rancor e amargura."

"Se torcia sempre pelo mais fraco, torcia só até aquele ponto em que o fraco não espancava o forte. Meus amigos, depois disso não contem comigo. É o risco na areia que não transponho. Nunca aprovarei presos políticos, tortura, pena de morte, linchamentos de fascistas, ,milionários ou patrões sem escrúpilos. Pensava que a universalidade da dignidade humana era mesmo... universal."

1º Parágrafo: O Conselho do Egipto


O beneditino passou um espanador de penas multicolores pelo exterior do livro; soprou, depois de encher a bochechas, arredondando-as, como o deus do vento nas cartas náuticas, o pó negro que o cobria; abriu-o por fim, com uma relutância que, dadas as circunstâncias, parecia delicadeza, tremor. Graças à luz que se derramava oblíqua entrando pela janela, os caracteres ganharam relevo nas páginas cor de areia: um grotesco carreiro de formigas negras, nítido e seco. Sua Excelência Abdallah Mohamed ben Olman inclinou-se observando aqueles signos; os seus olhos habitualmente cansados, distantes e aborrecidos tinham-se tornado vivos e perspicazes. Voltou a endireitar-se após um momento, procurando com a mão direita na veste: e extraiu umas lunetas com armação de ouro e pedras verdes, imitando uma fina grinalda de flores ou frutos.


* Tradução de Ana Luísa Faria e Miguel Serras Pereira

A fusão de Rodrigo Leão com Mário Cesariny

Poema: Queria de ti um país, Mário Cesariny  
Álbum: Rodrigo Leão e Gabriel Gomes - «Os Poetas: entre nós e as palavras»



quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Poema à noitinha... Bertolt Brecht

Prazeres

O primeiro olhar da janela de manhã
O velho livro de novo encontrado
Rostos animados
Neve, o mudar das estações
O jornal
O cão
A dialéctica
Tomar duche, nadar
Velha música
Sapatos cómodos
Compreender
Música nova
Escrever, plantar
Viajar, cantar
Ser amável.

*Bertolt Brecht


Ressuscitei por ti

Foto: Cláudia Miranda

Ressuscitei por ti


Morri há mil anos e fui sepultado
Os vermes devoraram-me a carne
Mas não me corromperam a alma
As estações generosas, tenebrosas e assim-assim
Sopraram o pó que me cobria
Lançando-o pelos confins do mundo
E o esquecimento pareceu chegar
Cobrir tudo com o véu das suas sombras
Até ao dia em que um camponês distraído
Cavando a leira onde semearia o trigo
Com que haveria de alimentar a família
[Se as estações se permitissem ser generosas]
Me achou dormindo no leito pedregoso dos campos
[por lavrar]
Entre o rio bravio e os bosques alvos
Enregelado pela tua ausência
Pela saudade do teu sorriso…

E
Não estranhou que ao abrir os olhos
Proferisse apenas o teu nome…

Emílio Miranda
*esta semana em destaque no Clube de Leitores. Sempre acompanhado pelas fotografias de Cláudia Miranda.

1º Parágrafo: A Máscara de África


Passei oito a nove meses na África Oriental em 1966, um mês na Tanzânia; mais ou menos seis semanas nas terras altas do Quénia; o resto do tempo no Uganda. Alguns anos mais tarde até usei uma versão do Uganda numa peça de ficção; só se pode fazer isso se acharmos que temos uma boa ideia do lugar, ou uma ideia suficiente para as nossas necessidades. Quarenta e dois anos depois dessa primeira visita voltei ao Uganda. Esperava iniciar lá este livro acerca da natureza da crença africana e pensei que seria melhor ambientar-me ao meu tema num país que conhecia ou semiconhecia. Mas encontrei um lugar que me iludiu.


* Tradução de Freitas da Silva
* V.S. Naipaul foi galardoado com o Booker Prize em 1971 e, em 2001, com o Prémio Nobel da Literatura.

Por haver livros - e Vodka

Se há duas coisas que amo na vida são livros e a Vodka. Os livros têm todas as pernas do mundo, levam-me por caminhos que não suspeito, oferecem-me um mundo. A Vodka tem quatro patas, obriga-me a ir à rua duas vezes por dia, dá-me o amor incondicional que só um animal sabe dar. E, apesar de não parecer, tem um nome bem literário.

Estrela já da fotografia cá de casa, aceitou arriscar-se na representação e participar na muito-curta-metragem que podem ver a seguir. Claro que fala da eleição dos Blogs do Ano. Ela sabe o quanto é importante vencer.

Não por mim, nem pelo Rodrigo, pelo Pedro, pela Raquel. Não trabalhamos para prémios. Trabalhamos em troca apenas de chegar a mais e mais gente, espalhando a beleza que tem o livro e a literatura e a poesia - mesmo quando se estende na mais densa escuridão.

Deixo-me de arabescos. Deixem-se inebriar pela Vodka. É lindinha, não é?


O prémio de Pedro Guilherme-Moreira

Gosto do Pedro Guilherme-Moreira. Assunto arrumado. O que nele me chamou a atenção foram uns poemas que surgiam glosando o mês que chegava e que fui coleccionando religiosamente, ansiosa pelos dias primeiros, chegando mesmo a bater-lhe ao mail quando se atrasava na publicação.

Estive lá quando lançou em Lisboa "A Manhã do Mundo", o seu romance de estreia. E dei por mim a pensar, confesso-o hoje, que a sua poesia me toca mais do que a sua prosa.
Por isso, surpreende-me pouco saber que é o vencedor do Concurso de Textos de Amor 2012 do Museu Nacional da Imprensa, com o poema "Plátano", escolhido entre os mais de 500 submetidos. Mas orgulha-me muito. Como me orgulha a sua amizade.

Pedro Guilherme-Moreira, Setembro 2012
Jardins do Palácio de Cristal, Porto - Foto Ana Almeida
Jornalista que sou, tive que perguntar. Que tal a sensação do prémio? A resposta - privada - foi tão sincera que não resisto a torná-la pública. Sei que me perdoará.
- "Chorei sozinho encostado à porta do armário durante uns segundos, no escuro do meu quarto, e a minha mulher veio ter comigo assim. Expliquei-lhe que ter feito e fazer tudo sozinho na vida dava nisto, a gente emociona-se quando alguém repara e dá coisas :) . Cinco minutos depois já me tratavam outra vez como marido e pai banal, o que é bom, sempre foi e será assim:).
E eu não me sinto mais nem menos por causa disto. Apenas alguma responsabilidade e um certo desassossego, porque a minha poesia nunca foi muito pública, mas foi só o que fiz toda a vida. Lutei para publicar a prosa, nunca a poesia. Não sei se algo muda, mas não muda a minha determinação de ter de vir do editor a vontade de a publicar. Eu não farei nada. Repara que em 2008 eu ainda era um miúdo sem vontade de aparecer, com vontade de fazer e escrever o que tinha de escrever e morrer e só muito depois dar ao mundo as palavras. Foi a certeza de que ser atropelado pelo mundo literário me traria humildade e refocagem que me fez sair."

No seu Facebook explicava esta tarde como surgiu a participação neste prémio.

"Apenas por causa do Pina
Nunca mais, desde a escola - portanto, desde os meus quinze anos - submetera poemas a concurso.
O ano passado vi o nome do Manuel António Pina, entretanto falecido, associado ao Concurso Nacional de Textos de Amor do Museu Nacional da Imprensa - tinha feito parte do júri durante vários anos. Eu teria sempre um profundo pudor em enviar ao próprio Manel qualquer texto, apesar de saber como ele era simples, humilde, acolhedor. Por isso enviei alguns poemas a este concurso, organizado de forma abnegada e apaixonada pelo Museu Nacional da Imprensa, esperando que o Manel os lesse. O estado de saúde não o permitiu, mas o prémio ganhou este ano o nome dele, e o próprio Museu quer que a nova edição e a entrega dos prémios desta fique indelevelmente associado a este concurso.
Tive a sorte de ganhar o primeiro prémio com uma poema sobre o outono dos corpos e a forma como o amor é comunicado a quem fica e por quem fica ou nos sobrevive. O meu egoísmo e mediocridade estão bem patentes nesta prova de amor em quem pede, quase todos os dias, para ir primeiro. Mas eu admito que o estado do mundo se adoça no nosso peito quanto temos alguém a quem dizer:
"(...) só os teus lábios me abrandam
só os teus beijos me calam.
(...)"
Que sirva a muitos amores - e mesmo a algumas tempestades - em qualquer estádio ou idade."

Eis o poema.

"Plátano

que nem o teu desespero
nas tardes frias de chuva
nem essas mãos a tremer
sobre as cartas que escrevi
nem os plátanos
que te deixam no outono
nem a vigília do inferno
nem a indolência do céu
nem a dor da madrugada
nem dúvidas
sobre o que nasce
certezas
sobre o que morre
nem memórias, por mais doces,
nem absolutamente nada

meu amor te dê a dúvida
de que te pertenço e fico
para lá do fim da noite
e que até no tempo infindo

só os teus lábios me abrandam
só os teus beijos me calam
"

PG-M 2012

Factos: o segundo lugar foi para Alberto Pereira, com "Memória até Adamastor", e o terceiro para João Albuquerque, com "Soneto". O júri atribuiu ainda sete menções honrosas: “O nosso pequeno nada...” (Alexandra Abreu Lopes), “Poderia desbloquear a máquina, pf “? (Ana Rita da Silva Freitas Rocha), “A tia Gena” (Deolinda Maria Galvão Rodrigues), “Despimo-nos do corpóreo e incorpóreo” (Isabel Sofia Medeiros), “Episódios de uma rádio Local” (Pedro Ventura), ”Sinto o esmagar de tudo” (Susana Costa) e, imagine-se! também “Rascunho de cena de sexo de um romancista incompetente ou prosa irregular ou poema limiar”, igualmente do Pedro Guilherme-Moreira.

"É um dos meus poemas mais antigos", revelou-me o escritor. "Estava antes em prosa e foi a primeira de todas as prosas que a Maria do Rosário Pedreira [nota: como editora] leu de mim - tendo dito, na altura, 'não é grande coisa'. Tinha razão. E eu que pensava que só assim se devia descrever um acto sexual, e que a literatura precisava de aprender :) . Quando virou poema ficou bem melhor, porque talvez fosse um poema na raiz."

Para podermos avaliar desta possibilidade, deixo-vos este “Rascunho de cena de sexo de um romancista incompetente ou prosa irregular ou poema limiar”. Parabéns, Pedro. Mereces.

"era uma cama de hotel, e como todas as camas de hotel tinha essencialmente lençóis,
serás o desenho da anarquia no linho da manhã
quando os sulcos da cama são tantos quantos os trilhos dos sonhos
e guardarás esses desenhos noite dentro. Só a cortina clara está corrida e a luz apagada e tem de estar lua cheia, é prateado o aluvião do quarto,
víamos os corpos, o teu vestido disseste ao jantar ser musselina,
levantei-o nos braços passando a linha das ancas e as mãos nas costelas e o beijo na boca e tu arquejavas profundamente,
trunquei a poesia ao libertar o gancho do soutien, sabes o que fez as cortinas esvoaçar momentaneamente?
Aconteceu aí o meu primeiro contacto com a tua nudez,
aquela parte maternal do sexo em que nos debatemos com complexos freudianos, os teus seios tinham uma maneira de se insinuar que enlouquecia, toquei-te no mamilo esquerdo com o lábio inferior, deixei a língua percorrer-lhe a superfície,
o teu sabor dentro do meu sangue dentro do meu cérebro
dentro do meu peito,
fechei a boca em sucções caladas, os meus olhos marejados em culpa clamando o deleite, estavas pênsil na fusão dos sentidos,
cabeça para trás, pálpebras fechadas, respiração ausente,
tombaram-me as mãos para as nádegas, a boca para o ventre,
tiraste o vestido pelo topo, vieram os cabelos desalinhar-se nos ombros,
fiz a língua percorrer-te todo o peito, as mãos libertar-te a última peça de roupa, ficaste nua prateada os pêlos púbicos uniformes os olhos claros
(eras um corpo de silêncios)
deixei os dedos passar tangentes à tua pele, primeiro a testa o nariz os lábios o queixo o colo os mamilos, a curva inferior dos seios, o ventre a púbis o verso das pernas que me franqueaste, a linha das nádegas que segui daqui, rasgaste a camisa colaste-me a pele,
a roupa espalhada e nós velejando a volúpia
nas vagas do linho, partiam os barcos, gemiam ao longe os longos avisos,
não há tempestade nem choro plangente mas cantos diferentes por cada caminho, afinal o vento entrou-nos no quarto, a espuma das ondas, o canto da noite, o voo dos pássaros,
o embalo das árvores, a dança do trigo,
parece-me até que o mundo essa noite
se moveu por nós
(Obviamente fizeram amor.
Ela demasiado entregue, ele vazio ao libertar-se da curiosidade da textura dela e do orgasmo na temperatura das suas coxas, ao lembrar que no amor, no verdadeiro amor, não é preciso arrebatar, acabou deitado com a memória de outra mulher na erva acetinada de um pomar sob uma maravilhosa-de-inverno esperando o primeiro fruto em queda.
Ele, deitado ao lado dela, fingia dormir no plácido movimento da estação.)
"


PG-M 2006
in http://ignorancia.blogspot.pt/2010/11/rascunho-de-cena-de-sexo-de-um.html



terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Hoje Emílio Miranda traz o poema «Enquanto te for permitido…»

Enquanto te for permitido…

Cruzas os dilemas com que povoas os teus dias
Ignorante das respostas que eles encerram
Obcecado apenas com as questões pendentes…

Mas não há vida sem morte, nem alegria sem tristeza
Não há fome sem fartura, mesmo que seja a de um desejo
Permanente… Nada te sobra, porque nada te pertence

Nada te alimenta verdadeiramente, porque te é estranha
A sofreguidão que te atormenta… O sonho sonhas distraído
Das consequências; porque nenhum sonho é apenas

O brilho que deixa no olhar; todo o sonho tem o seu
Lado de pesadelo, quanto mais não seja o do receio
De perdê-lo. Por isso, por que buscas mais do que a água

Mais do que a brisa que passa? O amor é uma palavra
Tantas vezes atirada fora, como lixo, pela calçada da rua…
A felicidade deixa de sê-lo, mal se alcança… pois é cansaço

O que se possui… Por isso, não queiras, respira apenas o desejo
Como respiras o ar que te mantém vivo… Apenas esse
Te faz falta para prosseguires o teu sonho… Enquanto te for permitido!

Emílio Miranda

Foto: Cláudia Miranda

1º Parágrafo: Sem Destino


Hoje, não fui à escola. Isto é, fui, mas só para pedir ao director de turma que me deixasse voltar para casa. Entreguei-lhe a carta do meu pai, na qual solicitava a minha dispensa, alegando “razões familiares”. Perguntou que razões familiares eram essas. Disse-lhe que o meu pai tinha sido convocado para um campo de trabalho; e não levantou mais questões.


* Tradução do Húngaro de Ernesto Rodrigues
* Prémio Nobel da Literatura 2002

O Clube de Leitores somos nós...



Queremos dar rostos ao blogue. Um voto é só mais um voto quando sabemos que desse lado estão sempre vocês. Para nos lerem, comentarem, criticarem. Sorrisos, tristezas e melancolias às vezes, alegrias e risos. Há espaço para tudo. Há espaço para o tu, o eu, o nós, o vós, elas e eles, todos e todas.

Aqui, porque aqui é também o nosso lugar. Aí ou em qualquer lugar. É assim que queremos ser, é assim que queremos estar. Mostrar o rosto, mostrar os nossos livros é mais um passo para reforçarmos o laço com quem nos segue e lê. 

Este é o meu apelo ao voto e não preciso de o dizer de outra forma. Ganhar, já ganhamos, desde o momento em que assumimos o projecto e decidimos continuar a ousar mais e mais. Arriscar e chegar mais longe. Vamos errar com certeza mas sabemos que nunca estaremos sós!

Até breve!


segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

O Inverno desceu devagar, por Emílio Miranda

Foto: Cláudia Miranda

O Inverno desceu devagar

O Inverno desceu devagar na poalha baça
Das estrelas. Houve quem dissesse que geava
E que o frio fazia tremer a solitária sentinela

Que vigiava o caminho, entre os sombrios bosques
Por onde havia de passar. Mas quando passei, percebi
Que tremia com o receio de que eu fosse o demónio anunciado

Na voz das árvores. Fiz-lhe um sinal apaziguador;
O seu sorriso não foi mais do que um esgar contraído
De quem desconfia da própria sombra…

Quem não confia em si, não confia na alma que o habita…
– pensei –, mas depois refiz o meu juízo, pois sempre
É legítimo o receio de quem è consciente
Da sua mortalidade. Sorri. E a sentinela deixou-me passar
Confiante. E confiante segui ao lugar onde as horas
Me aguardavam à beira-rio, entre o lugar dos sonhos
E das consciências libertas de amarras…

Beleza havia no silêncio das ervas a sonharem
Na clareira onde reunidos os poetas ensaiavam
A solidão. Para que os versos nascessem libertos de outras mãos…
Porque irmãos são prisões e poemas aves desgarradas
Que partem em busca de corações onde lançar
O seu encanto… Enquanto a geada se forma
Dentro dos olhos, cansados de sonharem a primavera…

Emílio Miranda
*autor em destaque esta semana

1º Parágrafo: O Bosque da Noite


Em princípios de 1880, apesar da bem fundada dúvida que tinha sobre a sensatez de perpetuar esta raça que tem o consentimento do Senhor e a desaprovação dos homens, Hedvig Volkbein – mulher vienense de grande energia e beleza marcial, estendida numa cama de dossel de um sumptuoso e espectacular carmesim, o lambrequim marcado com as asas bifurcadas da Casa dos Habsburgo e a capa de cetim da colcha com as armas de Volkbein desenhadas em fios de desbotado outro maciço – deu à luz, aos quarenta e cinco anos, um filho único, um rapaz, sete dias depois da data prevista pelo médico.


* Tradução e notas de Francisco Vale e Paula Castro

a-ver-livros: escombros e Marta Shmatava

Não tenho poesia
só raiva como
árvores caídas 
raiva cega surda
e cheia de palavras
sem rima e sem 
música talvez pedras
escombros de mim
ruínas e sombras
ecos de ventos
decassilábicos

* para conhecer mais sobre a pintora bielorussa Marta Shmatava
siga os links www.art-ra.com/marta-shmatava e www.facebook.com/marta.shmatava

Como votar no concurso? O vídeo "caseiro" que explica como é fácil...

Conjuguem o verbo votar! Vamos tentar renovar o título do ano passado. 

Basta seguir o link, encontrar a categoria (ordem alfabética), clicar em 'Clube de Leitores' e depois em 'Vote'. Podem fazê-lo todos os dias, de 24 em 24 horas. Ou através de IP's diferentes.


Partilhem o vídeo e o link do concurso. Ponham um lembrete no telemóvel para não se esquecerem! E passem a palavra: o melhor que puderem e conseguirem. Queremos ganhar novamente.

Boa sorte ao Clube de Leitores. Obrigado a todas e a todos. 
Rodrigo


domingo, 20 de janeiro de 2013

4 visões de Portugal pela mão de 4 autores portugueses


 "4" é uma mini-série de quatro telefilmes independentes entre si, mas ligados pelo tema comum “Portugal Hoje”. Quatro dos escritores mais representativos da nova geração aceitaram o desafio e escreveram livremente, cada um, uma história que representa a sua visão de autor sobre o Portugal contemporâneo.

José Luís Peixoto escreveu “Entre as Mulheres”, Pedro Mexia “Bloqueio”, João Tordo “Crónica de uma Revolução Anunciada” e Valter Hugo Mãe “A Morte dos Tolos”.

Quatro escritores contemporâneos. Com quatro visões de Portugal. Escrevem quatro telefilmes.

A realização está a cargo de Henrique Oliveira (“Claxon”, “Major Alvega” e recentemente “O Segredo de Miguel Zuzarte”, telefilme nomeado para melhor ficção europeia de 2011 nos festivais de ficção televisiva de La Rochelle e Prix Europe em Berlim). A produção é da RTP a cumprir o verdadeiro sentido de serviço público.

Pode aceder a todos os episódio no site da RTP, a partir daqui.

«À passagem das Aves» - o poema escrito à mão por Eugénio de Andrade

Querem melhor sensação que descobrir a caligrafia do Poeta? Nesta belíssima nota de 1977. Fiquem com À passagem das Aves, desse grande génio chamado Eugénio.



Emílio Miranda regressa esta semana ao Clube de Leitores

O escritor Emílio Miranda regressa a um espaço que bem conhece e onde já participou diversas vezes. Esta semana vai mostrar-nos o seu lado poético. Além do material que nos disponibilizará, vamos acompanhar o trabalho fotográfico da sua filha Cláudia. Fiquem connosco! Esta semana o Clube de Leitores COM_vida Emílio Miranda.

Descobri que Fernando Pessoa não morreu

Descobri que Fernando Pessoa não morreu
E continua a escrever poemas,
De pé,
Compulsivamente
Como quem tosse palavras
Ou sonha estados de espírito inexistentes
Todos os seus poemas são loucos
Desde que se tornou centenário
Todos os poemas de poetas centenários
São loucos
Mas os do Fernando são-no por natureza
Mistura cigarros e chocolates
Como se tudo fosse um vício
E a vida uma fatalidade.
Se não quiseres morrer
Inventa o absurdo
E depois faz dele o teu quotidiano.
Bebe calicezinhos de bagaço
Na esplanada de uma cidade louca
E escreve poemas com palavras inventadas.
As palavras são o alimento dos fartos.
Aos esfomeados apenas interessam as mais banais
Como pão água e um pouco de nada
Com que enganar a fome
Discursos litúrgicos são fraco alimento
E os políticos são indigestos

Fartos do absurdo
Beberriquemos poemas
De Pessoa
Que os escreveu como ninguém
E
Jaz vivo em palavras.


Emílio Miranda

Foto: Cláudia Miranda

A final é uma realidade... Pela 2.ª vez em 2 concursos

Estamos na final. Mais uma vez. Não ficamos em 1.º por 14 votos. Os meus parabéns à Sofia Teixeira - que já anda nisto dos blogs literários há mais tempo que o Clube de Leitores. Ao blog BranMorrighan fica o meu respeito pelo trabalho que tem em nome da divulgação do livro e da escrita.

Foi uma luta interessante. Discutida com outros fortes candidatos. Muito mais preparados este ano. Só para terem ideia, no concurso de 2011 (que ganhámos) o Clube de Leitores só precisou de 246 votos para ir à final. Este ano somou 561. E, mesmo assim, não passou em 1.º lugar.

Como tal, temos que nos unir como nunca. A final arranca na Segunda. Mas preparem-se no Domingo... Pois, mal passe da meia noite, já podem começar a votar. O concurso termina na meia noite de sábado.

Não vou atribuir favoritismo a nenhum dos blogs. Partimos do zero. De dezenas deles, o Clube de Leitores foi um dos 5 escolhidos. Claro está, isso enche-me de orgulho. Comando este projecto desde o início e por este espaço já chegou e partiu muita gente.

Há quem me pergunte o que ganho com este concurso... A minha resposta é simples: neste sábado tivemos 832 visitas ao blog. 561 votos pode parecer pouco para os números que o blog mexe, mas, quem anda nisto há algum tempo, sabe que convencer pessoas a votar por nós não é fácil. Assim como é difícil explicar como se faz para votar... Mais 28 pessoas puseram um like na página do Clube - no Facebook. E 116 novos membros fazem parte do grupo Livros no Facebook - uma das maiores comunidades de literatura e livros do país.

Está explicado o porquê de "valer a pena"?

A todos os que se interessaram e aos muitos que vão estar na final connosco... o meu super obrigado! Continuamos juntos e fortes.

Rodrigo Ferrão