sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

a-ver-livros: Barão por um dia

Há estórias que a História engole na voragem do tempo. Cruzamo-nos com elas sem querer, por exemplo quando se fica fascinado com a luz e a cor num quadro de um pintor que só descobrimos porque também incluiu livros nas suas telas.

Foi assim que me aconteceu com o britânico Frederic Leighton. As primeiras informações explicavam algo simples: foi um homem riquíssimo, filho único de uma família importante ligada à medicina e à importação e exportação, que andando pelo mundo lhe deu uma educação de topo, incluindo a oportunidade de estudar e viver nas grandes capitais europeias. Só em 1860, já com 30 anos, voltaria a viver em Londres – onde se deu com os melhores da Bretanha vitoriana, incluindo a rainha Vitória, que lhe comprou algumas obras.

A história deste artista torna-se curiosa quando se descobre que, um ano depois, é escolhido por Robert Browning – amizade que fez quando viveu em Roma – para desenhar o túmulo que, em Florença, Itália, acolheria Elizabeth Barrett Browning, sua mulher. Sim, a poetisa que escreveu os “Sonetos dos Portugueses” – vejam lá se não é verdade que isto anda tudo ligado... [*]

Pela sua personalidade cosmopolita e exuberante, que os alunos elogiavam com intensidade, e pela pintura assente em cores luminosas e figuras deliciosamente bem desenhadas, capturando a nostalgia vitoriana e as ‘saudades’ da era helénica, Leighton depressa se tornou uma eminência nas artes britânicas. Ascenderia em 1878 a presidente da Real Academia. Aprecie-se que sobe a tal ponto que se torna o primeiro pintor do Reino Unido a receber um título nobiliárquico – apesar até dos rumores que o davam como homossexual, nunca confirmados devido à forma secretiva como geria a sua vida privada. Ainda assim, o barão Frederic Leighton só veria o seu baronato constituído oficialmente a 24 de Janeiro de 1896, incluindo a propriedade de Holland Park, em Londres, onde é hoje o Leighton House Museum.

Mas a vida tem voltas que não lembram ao amnésico – e, apesar de toda a sua pujança artística e social, Frederic morre no dia seguinte, solteiro e sem descendência, vencido por uma angina de peito. Do primeiro e único barão de Leighton, detentor do mais curto baronato da história britânica, ficou a pintura. E caramba, se há para ver.
--------------------------------------&&&------------------------------------
(*) E só porque ela entra nesta história e tinha os portugueses no coração, termino este post com um soneto de Elizabeth Barrett Browning, o 43, talvez o mais conhecido. Escolho a versão da tradutora brasileira Thereza Christina Rocque da Motta.
“De quantas formas eu te amo? Deixa-me contá-las.
Amo-te profunda e largamente, e tão alto quanto
Alcança a minha alma, quando perco de vista
Os propósitos do Ser e os ideais da Graça.
Amo-te tanto quanto às menores necessidades
Do dia-a-dia, seja à luz do sol ou à luz de velas.
Amo-te livremente, como os homens lutam pelo Direito;
Amo-te puramente, como rejeitam o Elogio.
Amo-te com a paixão que tenho pelas
Minhas tristezas mais antigas, e com minha fé infantil.
Amo-te com um amor que pensei ter perdido

Com os santos que perdi… Amo-te com o alento,
Sorrisos e lágrimas de toda a minha vida! – e, se Deus quiser,
Irei amar-te ainda mais depois de morrer.
----&&----
[How do I love thee? Let me count the ways.
I love thee to the depth and breadth and height
My soul can reach, when feeling out of sight
For the ends of Being and ideal Grace.
I love thee to the level of everyday's
Most quiet need, by sun and candlelight.
I love thee freely, as men strive for Right;
I love thee purely, as they turn from Praise.
I love thee with the passion put to use
In my old griefs, and with my childhood's faith.
I love thee with a love I seemed to lose
With my lost saints, - I love thee with the breath,
Smiles, tears, of all my life! - and, if God choose,
I shall but love thee better after death.]

3 comentários:

  1. Sonnets from the Portuguese was written by Elizabeth Barrett Browning between 1845 and 1846 and was published in 1850. It is a collection of forty-four love sonnets written for her, then, future husband Robert Browning. The content and tone of the sonnets change as her relationship with Browning relationship progressed. In the earlier sonnets she expresses her doubt and fear about beginning a relationship with Browning. As the relationship progressed Barrett Browning was able to overcome her anxieties, and eventually, they took a more accepting and passionate tone. Originally, she did not plan to publish the collection due to their extremely personal content, but changed her mind after Robert Browning insisted, saying they were perhaps the best sequence of English-written sonnets since Shakespeare's time. In order to maintain some privacy, Browning disguised the title in hopes people would believe they were translations from foreign sonnets. According to Wikipedia, the collection was originally called Sonnets from the Bosnian, but was changed to Portuguese after Robert's suggestion, perhaps stemming from his nick-name for Elizabeth: "my little Portuguese."

    ResponderEliminar