Sonhei muitas vezes escrever um livro sobre Paris que fosse como que um
grande passeio sem fim, daqueles em que nunca se encontra nada daquilo que se
procura, mas sim aquilo que não se procurava. Esta é mesmo a única forma
através da qual me sinto capaz de abordar um assunto que me desencoraja tanto
quanto me atrai. E, acima de tudo, creio que não direi uma palavra a respeito
dos grandes monumentos e de todos os lugares acerca dos quais se esperaria uma
descrição como deve ser. Talvez porque tenho olhado para elas demasiadas vezes,
já não vejo as glórias arquitectónicas de Paris com toda a necessária liberdade
de espírito. Prevenido contra ou a favor de cada uma delas, tomei partido, sou
injusto. Mil vezes desejei ver a Torre Eiffel submersa, agradar-me-ia tomar
conhecimento de que os dois Palácios, o grande e o pequeno, que desonram o
Cours-la-Reine, tinham desaparecido a meio da noite. As minhas preferências vão
para as velhas pedras, não o escondo, mas choraria de enfado se tivesse de
escrever uma página a respeito do Hôtel des Invalides, porque amando-o como o
amo não saberia na verdade o que dizer dele. Tal como ficaria mudo perante
Notre-Dame, incapaz de falar, sem dúvida, pela vergonha do que ouviria da minha
própria boca, eu que admiro sem a invejar a coragem daqueles a quem a auto-suficiência
ou o génio lançam sobre um monstro assim: pela minha parte, prefiro ficar
calado e Notre-Dame continua a ser para mim Notre-Dame, um ponto, nada mais.
* Tradução de Carlos Vaz Marques
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