quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Ler «Gente independente», de Halldór Laxness


"Não quero saber de tamanhos disparates, disse o pai. Não quero ouvir nada sobre um maldito mundo qualquer, pensas que estás a falar de algum mundo? O que é o mundo? Este é o mundo, o mundo está aqui, Casas de Verão, as minhas terras, é o mundo. E ainda que queiras engolir o Sol num momentâneo acesso de loucura porque estás a ver notas azuis da América, que evidentemente são falsas como toda e qualquer grande soma de dinheiro que cai nas mãos de um indivíduo sem que ele tenha trabalhado para tal, tu irás comprová-lo mais cedo ou mais tarde: Casas de Verão é o mundo, e nessa altura eu sei que irás pensar nas minhas palavras".

Andei com este livro alguns anos, li-o em três actos, densamente e com calma. Mas custou-me deixar Bjartur de Casas de Verão, o herói islandês que tantos sorrisos me tirou.

Laxness, mestre na arte de emprestar magia aos seus livros, conta a história de um homem duro, rude e trabalhador, aparentemente distante e de sentimentos sólidos e indestrutíveis. 

A história do início do século, fala-nos de uma Islândia de agricultores pobres. E Bjartur, homem independente, resiste como pode, sozinho, sobrevivendo a duas das suas mulheres e à perda de filhos. Casas de Verão, lugar idílico isolado do mundo, assiste a um amor mais que supremo do agricultor pelas suas ovelhas. 

O homem critica os que desistem e fogem para a América, assiste à grande guerra nos países lá fora, à entrada do capitalismo num país pobre, de um sistema bancário e político que empresta dinheiro em condições enganosas, acabando por sugar o pouco que existe.

Ele resiste. Ele luta. Ele mantém-se fiel aos seus princípios. Um homem independente, contra tudo e todos. 

No meio de uma história eloquente, vamos sendo levados pelas tradições islandesas, pelas crenças num diabo à solta, pela poesia. Laxness vai enchendo-nos de imagens poderosas, metáforas e descrições de arrebatar.

É assim que se faz um dos livros desta vida. Sorte que a minha vontade decidiu abrir estas páginas.

*Rodrigo Ferrão, in: https://www.goodreads.com/review/show/1385659292

1 comentário:

  1. Eis um dos livros da minha vida, curiosamente li-o no início da crise do último resgate e marcou-me fortemente a descrição da resistência do protagonista ao crédito bancário para se manter independente.
    Um livro com momentos muito duros, onde o herói também é casmurro mas muitas vezes cheio de razão. Um obra-prima cheia de solidão, poesia, tristeza e também vitórias da razão.

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