terça-feira, 13 de outubro de 2015

É do borogodó: O pequeno Harvey


Lembro bem quando me meti no morrão com meus amigos de bairro: Lili, Ricardinho, Sugus, Luci, Fabi, Dadinho… Será que tinha mais gente? Será que eles se lembram disso? Eu lembro bem, fui eu quem tentou pular o muro como os outros faziam, fui eu a desajeitada nas ações de força e impulso, fui eu a espatifada no chão.
Lili voltou pra casa comigo. Lili era mais forte do que eu em tudo. Ela me defendia nas brigas e me levantava nos tombos. Foi ela quem levou a bicicleta ao lado. Não dava para pedalar com aquele joelho ensanguentado.
Meu sobrado era quase pegado na casa da Lili. Ela só fazia perguntar se estava doendo e eu dizia que sim, muito, até ver minha mãe.
Tive medo da minha mãe. Ela não não ficou brava. Mas disse que aquilo tinha sido feio. Foi buscar a caixa de medicamentos. Lavou minha perna no quintal com água e sabão, depois despejou o vidro de merthiolate, nem deu tempo de pedir:
– Mãe, esse não, põe o mercúrio…
Ardeu meu pedido não atendido. Minha mãe disse que o outro era ardido porque sarava melhor.
Naquele dia eu não entendi porque precisamos sarar com dores piores quando já estamos partidos.
Acho que nunca contei isso pra minha mãe. Nem agradeci minha amiga Lili.
No entanto, a vida foi passando e outros dias partidos vieram em que eu daria tudo por ter a cura num vidrinho ardido de merthiolate.
Harvey, também gostaria de um vidrinho desses…
O pequeno Harvey vê sua vida virar de cabeça para baixo quando toma conhecimento da morte do pai. Invadido por um sentimento desconhecido e desolador, Harvey tenta proteger-se da dor, refugiando-se em seu rico mundo de fantasia.
Numa sensível e realista narrativa sobre a perda de um ente querido e a necessidade de encontrar recursos pessoais para superar a dor do luto, a editora Pulo do gato convida os leitores a conhecer a história de Hervé Bouchard e Janice Nadeau, com tradução de Luciano Vieira Machado.
Texto e imagem se complementam de forma indissociável na construção dos sentidos da narrativa. As duas linguagens não se sustentam sem essa parceria: são as ilustrações que traduzem as sensações, revelam os sentimentos e as percepções da personagem.
O livro “HARVEY – Como me tornei invisível” é uma obra sobre perda, dor, sofrimento. Assim como o vidrinho de remédio que faz arder, a narrativa de Harvey nos aproxima dos sentimentos que precisamos revisitar para ter coragem de superar.
* As imagens publicadas aqui foram encontradas na internet e compõem o livro.
*escolhido por Penélope Martins, nossa ponte até ao Brasil

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