sexta-feira, 24 de julho de 2015

Maria Carla voltei a falhar

Prometi-te aqui há uns meses que havias de deixar de ser a mulher mais feia mais infeliz e mais ignorante do mundo, prometi-te que te havia de levar ao teatro e ao cinema e a ver os monumentos e prometi que te havia de levar às compras e ter paciência e elogiar-te o vestido e os sapatos, prometi que passaria todos os Sábados e todos os Domingos acompanhando-te nas compras. Falhei em tudo, mais me preocupei com os livros mas afinal nenhum livro tão complexo como tu, mais me preocupei com contos da carochinha mas afinal agora não tenho nada que contar

Maria Carla voltei a falhar, afinal de contas nunca nada fiz que não falhar

Por ti continuo a guardar a admiração de sempre, do teu jeito curtinho e amoroso, da leveza com que te via assentar os pés no chão que pensei ser nosso e das vezes em que partilhámos as mesmas palavras que espero não deites fora. Sempre esteve presente essa admiração em tudo o que escrevi, porque, como sabes, várias vezes te disse que é necessário ler o que as palavras não dizem e escutar o que da voz não se ouve, só assim se pode chegar a algum lugar. Poucas coisas sobre ti escrevi, não tenho jeito para escrever sobre pessoas, ainda assim tudo o que em mim teve origem e passou para o papel, teve, também, origem em ti

Maria Carla a razão de ter falhado é a de que para mim sempre o tempo foi infinito

Maria Carla a cada dia te eternizas mais um pouco. Receio que deixe de saber escrever a partir de agora (aliás o que já se nota neste textozito demasiado básico) que já não tenho ninguém com quem partilhe isto, isto que nome não tem, isto que durante todo este tempo teve origem em ti. Todos os elogios que aos meus escritos fizeram reencaminho-os para ti, a outro lugar não pertencem. Sei que não são o bastante para que fiques de coração cheio, nem eu próprio fui, mas é como te digo, mais vale tarde que nunca e mais vale pouco que nada

Maria Carla sempre fiz pontaria ao céu e às estrelas, à Lua e a tudo o que não podia tocar

E tu sempre apontaste à vida, à Terra, às pessoas de todos os dias, bastava-te um dia frio mas de Sol brilhando, bastava-te o que tinhas e o pouco que te dava e eu sempre preocupado com o que não tinha e com o pouco que não me davas. Continuo a ser muito mais pequeno que tu, sempre saberás mais que eu e sempre continuarás sem o querer revelar. Agora entendo que nunca precisaste que fizesse de ti a mulher mais bonita e mais inteligente do mundo, sempre o foste sempre o serás, e eu hei de para aqui ficar, recordando-me dos tempos em que construímos o mesmo silêncio e em que corremos juntos mais rápido que o mundo e por isso quase nos tornámos infinitos

Gonçalo Naves


Foto tirada daqui: http://activa.sapo.pt/vida/lazer/2014-06-09-A-Bela-e-o-Monstro-vai-ter-versao-com-atores-de-carne-e-osso

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