Carta de Atenas
Meu querido José
Escrevo-lhe de Atenas,
com Oxy nos lábios que é como quem
diz não aos credores que não têm credo.
Lembro-me, enquanto
assisto a estas longas, triunfantes e patrióticas manifestações que se espraiam
pela mátria da Democracia e da Filosofia, daquela música tão linda, de meu
primo António Carlos, Insensatez.
Vontade é a minha de gritar por estas ruas como grego, como português e como
europeu. (Como um Almada!) Credores sem credo. Quem nunca foi pobre não deve governar.
É tal a minha vontade,
jovem das esquerdices para fora. Mas gritar em plena Atenas, de panamá, bastão
e copo de Ouzo na mão talvez não fosse a melhor das ideias. Até porque me deixei
das manifestações públicas e políticas há muitos Julhos atrás. Lembrei-me agora
de Nicosia e de um caso que ocorreu por conta de um esquecimento diplomático,
mas isso fica para outra altura. As minhas manifestações são agora para dentro,
e para as palavras. Mas basta desta exploração aos povos, co’a breca! Nós,
europeus, supostamente superiormente civilizados, jamais aprendemos com o
passado. E logo a Grécia, ironia das ironias, tergiversando Cohelet, o da
Bíblia, que tanto sofreu ao longo dos séculos, fossem macedónios, persas,
romanos, otomanos, alemães ou “europeus”. Se Byron morreu pela Grécia, nos Idos
de Oitocentos, quem se atreve, hoje, quase dois séculos depois, a morrer pela Grécia?
Os economistas? Os políticos? Os analistas? Os jornalistas? Os historiadores?
Não, meu caro José, é o povo, são as pessoas, que são as mesmas de há dois mil
anos atrás. É o povo que se une, que luta, que se manifesta, que sai à rua
gritando Oxy. Que Portugal, tão
nobre noutros tempos, ponha os olhos nos patrícios helénicos e deixe de ser um
“país-centavos”, um país a prestações e a juros!
E o que pensa o nosso
jovem? Acredita que a Grécia está a fazer bluff ou está, deveras, dando voz,
mão e poder à Democracia?
Escreva-me nervosa e
rapidamente sobre este tema, pois quero saber tudo antes do próximo Domingo. Vivemos um momento histórico, meu caro! Histórico!
Escrevo-lhe mais cedo,
pois como sabe, todo Julho é para mim sagrado, seja em Atenas, em Nicosia ou em
Paris.
Efraim preocupa-se com
os bancos que não abrem e com as ATM sempre lotadas. (Como se o formidável
semita fosse alguma vez cair na miséria!). Já nos zangámos por várias vezes a
propósito disto. Mas não vou enveredar por esse caminho, pois essas conversas
são feitas para a carne e não para o papel, ainda que neste haja a sensação e a
pulsação do sangue e da tinta.
Despeço-me ao som de
meu primo, intervalo pelo famoso Sirtaki.
Um abraço poeirento,
diafanamente revolucionário e com este travo de liberdade do
Seu
Gonçalo V. de Sousa
Αθήνα, 1
de Julho de 2015
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