por vezes penso que sou peixe
e tenho memória curta.
1,2,3.
um, dois, três.
I,
II,
III.
.
..
...
gastei uma vida!
o passado é a recordação do momento imediatamente anterior
e assim não há espaço para remorsos,
mágoas, tragédias ou fúrias.
já não assisto à loucura do telejornal,
enterro a tragédia da notícia.
deixo de perceber o significado de tudo ter um fim
ou do para sempre...
sempre acabar.
não sei nada sobre o joelho magoado,
não me importa o cigarro a queimar à minha porta.
desprezo por completo as dores crónicas do coração.
no presente sacio a fome,
mas logo a seguir já não sei o que é.
na presença de uma angústia,
respondo com euforia.
switch on,
switch off.
para quê preocupar-me com explicações se já não domino o que vivi?
o futuro não vem na gramática.
muito menos nas instruções
de -- como
conduzir -- a
----------------
----- existência -----
------
---
-
mas depois penso que se fosse um peixe
já não podia viver um amor para sempre,
recordar quem fui e o que sou,
aprender a contemplar a vista do topo de uma montanha,
fazer do sonho um caminho.
jamais compreenderia o significado
(e a metáfora que é)
o facto de haver flores que nascem
por
entre
as
fendas
das
pedras.
Rodrigo Ferrão
Foto: Rodrigo Ferrão
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