sábado, 4 de abril de 2015

ERA UMA VEZ UM MUNDO PRETO


-Mas meu pai, será este nosso mundo assim tão pior que o tal outro que meu pai visitou?
-Dizer-te se é este pior ou o outro melhor não devo eu meu filho. Asseguro-te, com nenhuma dúvida, que decerto diferentes são.
-Diga-me então o meu pai que diferenças notou.
-Pois te diz o teu pai que este aqui em que nossos pés assentam bem mais colorido é que o outro.
-Continue meu pai que tão interessado estou eu.
-Vês tu aquela árvore acolá? Atenta-lhe nas cores. Castanho é o tronco, verdes as folhas e brancas as flores. Quando vier o fruto, que pouco tardará, pois também vermelha será. No outro mundo em que estive eu aquela mesma árvore existe naquele exato sítio, só que toda de cor preta.
-Está meu pai a reinar comigo? Árvores pretas não existem. Além disso, se toda preta era, como sabe meu pai que de uma árvore se tratava?
-Uma árvore era por certo porque dela vi passarinhos a voar. Queres tu saber mais coisas do outro mundo?
-Conte-me meu pai.
-No outro mundo de cor preta é a água dos rios. De cor preta são as estrelas e de cor preta são todos os dias que passam.
-Meu pai, essoutro mundo que me conta, todo ele preto é?
-Todo ele preto é.
-Que infelizes serão essas pessoas meu pai, que triste será a vida que levam. Que pena delas tenho eu.
-Tanto te enganas tu, meu filho. Todas elas mais felizes que nós são, bem vi eu com estes olhos que te olham agora.
-Mas como mais felizes são elas que nós se todo o mundo em que vivem preto é e o nosso tantas cores tem?
-Meu filho, são-no porque durante toda a vida só o preto conheceram. Mais nenhum mundo conheceram, mais cores não viram. Como mais nada conhecem, acham que tudo têm. Já nós conhecemos o nosso mundo, tantas cores que ele tem, tão belo que ele é, tantos paraísos temos nós, mas conhecemos também essoutro, essoutro que não podemos ter, essoutra cor que nunca havemos de ver neste mundo. Somos nós infelizes por nos faltar um nada que conhecemos. São eles felizes por terem o único nada que conhecem.

Gonçalo Naves

Foto tirada daqui: http://mariafotografiablog.com/2012/02/13/entre-um-clique-e-outro-between-clicks/

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