sábado, 7 de março de 2015

Correndo o Brasil: atravessar o Atlântico rumo ao Rio

Porto, Lisboa, Atlântico e Rio de Janeiro
7 de Agosto de 2014


Não arranjo posição na cama. Tenho um avião para apanhar dentro de 4 horas e não prego olho. O sono vem, mas a sensação de descanso é nula.

Pego nas malas, nos documentos, no bilhete e saio. Desço a rua até à estação de táxis mais próxima e cumprimento o homem. Ainda é escuro, madrugada de cristal. No aeroporto procuro no placard onde mora o meu voo para Lisboa e aproximo-me da porta. Dormito mais um pouco antes de entrar.

O comandante arranca, fecho os olhos. Sonho com o que vou ver, os amigos que vou encontrar. Um arrepio de alegria corre o meu corpo. Para trás fica um ano duro, é tempo de esquecer e celebrar a vida. No Brasil vejo a esperança, vejo o esquecimento das rotinas e o fim dos dias iguais.

Avisto o Tejo, a ponte, o aqueduto, uma extensa mancha de edifícios e pouso. No aeroporto tenho que fazer horas. Passo na livraria sem desejo nenhum de comprar o que seja. Procuro novamente a porta que me vai fazer atravessar o atlântico e sigo para lá. Encontro finalmente amigos e com eles discuto planos, expectativas e quem vamos achar no outro lado.

Partimos.

As horas começam a destruir a paciência das minhas pernas. O avião vai tranquilo, correndo sempre perto as ilhas do atlântico. E depois é o esticão entre Cabo Verde e o norte do Brasil. E por ali descemos até ao Rio.

Chegados e cansados vamos esperar a mala. A minha demora mais de uma hora a aparecer, um suplício para quem esteve longas horas a voar. Nada a fazer.

Cá fora espera um amigo meu. Ali desfaço o grupo que viajou comigo e apanho um autocarro rumo a Flamengo.

O meu primeiro Brasil é o das favelas que acompanham a autoestrada. E fico estupefacto. Tijolos e chapa, cobertos com o que vem à mão. As paredes forradas de candidatos às eleições. Quilómetro sobre quilómetro até que, sem dar conta, entro no centro. E logo ali tenho a sensação de atravessar a fronteira entre um país muito pobre e um país muito rico - dou entrada numa zona de grandes edifícios.

O ônibus (deixo o termo do meu país) dá voltas inexplicáveis e vai ao fim do mundo antes de me deixar em Flamengo. Vou anotando o que vejo, com a precisão de turista inexperiente. Muitos coqueiros, Cristo redentor ao alto, prédios enormes e muita gente nas ruas. Trânsito infernal, um caos de buzinas estala no meu ouvido. Quase todas as casas e apartamentos são guardadas por grades e porteiros. Paro no boteco preferido dos meus amigos. E é lá que bebo o primeiro chopinho.

Começo a absorver tudo o que me rodeia, escuto os primeiros cariocas. A conversa rola - a viagem que aí vem e o que devo ver nos sítios por onde vou passar. Apercebo-me que o meu amigo está doente e que corre uma brisa fria. Saímos para comer um delicioso caldo de feijão e levámos o que sobrou para casa.

No prédio onde fico subo vários andares. O sofá espera ansioso para me dar descanso. E eu cedo ali, ao som da novela. As minhas costas pedem clemência, os meus olhos parecem um poço fundo de água, sinto o sangue das veias dos pés. E durmo com os sonhos do que ainda está por vir.

Rodrigo Ferrão 

2 comentários:

  1. Sou brasileira e na primeira vez em que vi o Cristo, estava num ônibus, no Rio de Janeiro. Não consegui segurar as lágrimas!

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