é natal e eu cumpro as obrigações
do
meu
tempo.
faço os votos,
compro prendas,
rasgo o papel,
visto a roupa,
como,
bebo,
como mais,
bebo mais.
tiro a roupa,
verifico o talão de troca,
agradeço,
sorrio,
relaxo
e sinto o conforto da lareira.
desfaço as entradas,
o peru,
a sobremesa,
tomo o café,
vejo o filme,
arrumo os papéis,
despeço-me
e vou para casa.
é natal e os pobres cumprem as solidões
do
meu
tempo.
acordam,
atiram a manta para trás,
dão um trago na água,
passam na padaria
e mendigam um pão.
depois vão às portas da igreja
- missa do meio-dia -
estendem a mão
e sentem o peso dos tostões a cair.
mais tarde encostam a cabeça ao sol,
recordam infâncias
e passados que jamais serão futuro.
consta que salivam
quando pensam na comida que sobra
nos lares
e na família
que
não
têm.
é natal e as crianças famintas cumprem a sobrevivência
do
meu
tempo.
não sabem o que é neve,
árvores com bolas
e luzes.
e o que são brinquedos?
não compreendem quem foi jesus,
nem muito menos sabem quem é
o inexistente
pai natal.
no seu mundo não cabem bacalhaus, filós
e sonhos:
nem os doces
nem o amanhã.
só querem que a mãe
lhes possa dar calor mais um pouco,
só querem que a papa de farinha
chegue para o dia,
só querem que as moscas
lhes deem descanso,
só querem que a morte
não os venha buscar
tão
cedo.
feliz natal.
merry christmas.
feliz navidad.
joyeux noël.
Rodrigo Ferrão
Foto: Rodrigo Ferrão
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