quinta-feira, 3 de julho de 2014

Eu poético: «Bullying»

Bullying

continua a chamar-me gordo,
prometo que um dia fecho a boca e não volto a comer.
aproveito para nunca mais dirigir palavra que seja.
tudo o que me forçares engolir, farei por deitar fora -
dois dedos bem fundo goela abaixo,
até que o vómito chegue, enfim.

continua a dizer que não valho nada,
pago igual se o acaso te levar às ruas.
em vez de moeda, deixo seringa -
tens garantida a próxima dose.
se quiseres, levo-te uma malga de vinho.
dizem que a mistura ajuda a aliviar a dor.
tenho
esperança
que
te
alivie
todas,

de vez.

sim, aos teus olhos sou preguiça.
então espera o dia em que bato a porta com um bilhete de avião:
embarque sai às treze,
n-o-v-a
z-e-l-â-n-d-i-a,
sem promessa de regresso.
aí chorarás com saudade os dias em que me deixei dormir até tarde,
as discussões parvas de quem põe a mesa
ou lava os pratos.

quando souber da tua morte,
regresso lá de onde estou e
prometo pagar o teu enterro
para que o teu cheiro
desapareça
depressa
debaixo
da
terra.
...
das ist das ende.

Rodrigo Ferrão


Foto: Rodrigo Ferrão

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