sexta-feira, 2 de maio de 2014

Gonçalo Viana de Sousa - O Flâneur das Sensações

Poesia. Por que não?

Não enlacemos as mãos outra vez, meu amor,
Pois o ódio consome o nosso silêncio,
E nem o céu é capaz de rasgar
O que o tempo escreveu.

Somos Literatura,
E por não existirmos
Sofremos e amamos como se fôssemos
Capazes de viver para sempre.

Sim, um resto de pó e de água
Nesse teu rosto filho de peregrinos
Que caminham em busca da luz.

Como se fosse possível o teu rosto ser a perfeição.

Por querermos a perfeição e a imortalidade, falhamos.
Por querermos a fama e a glória eternas, falhamos.
Por querermos a riqueza e um altar, falhamos.

E falhamos porque não sabemos quem somos, nem
Queremos sabê-lo. A imortalidade não reside no mármore
De uma estátua ou numa estante de biblioteca.

Falhamos redondamente. Falhamos miseravelmente,
Como pó e esquecimento que somos.
Por existir nas palavras sofro enquanto verbo
Transitivo ou metáfora, nada mais. Langue et Parole.

Ser escrita é ser esquecimento. Tudo o resto existe.
Tudo o resto não existe.

Escrever é mentir com as mãos.
Amar é enganar com a vida.

Viver é escrever e mentir e amar, e no fim da linha,
Deixar de amar, deixar de ser.

Enfastio-me com as gradações progressivas e com a simbologia dos números.
Por ter tantas ideias e sistemas e histórias e textos e
Músicas e paisagens e medo e silêncio em mim, não consigo escrever
Prodigiosamente, como os clássicos.

Para filósofo falta-me o sol e o mar gregos.




                                 Imagem tirada daqui: http://www.thelemming.com/lemming/dissertation-web/images/flaneur.jpg                             

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