segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Uma parte de mim que fecha


Há uma parte de mim que ainda não quer acreditar que a Leitura do centro comercial cidade do Porto fechou. Do dia para a noite, assim. E assim desaparece uma casa, a minha primeira casa. Palco de tantas alegrias, muito trabalho, verdadeiros amigos e clientes que não esqueço.

A história da livraria começa a ser montada num grande armazém da Maia. Ali conheci os primeiros livreiros dos muitos com que me cruzei mais tarde noutras paragens. Uns com experiência, outros sem nenhuma. Mas um grupo com um sentimento generalizado - fazer nascer uma boa livraria, um espaço de referência na cidade.

O peso da responsabilidade era grande - herdar um nome com tamanha tradição no Porto e na Europa, uma referência de tantos e tantos apaixonados por livros. Acho que a equipa correspondeu, verdadeiramente. Na simpatia, no primor com que embrulhavam um livro, no atendimento sem "regras de supermercado". A Leitura do shopping criou uma relação com muitos clientes. E são eles que ficam mais pobres. Pessoas que iam lá diariamente, que voltavam para perguntar o que é feito dos que já haviam partido - como eu e muitos, fomos saindo a conta-gotas.

Aprendi com os melhores e ainda hoje reconheço o gozo de ter aberto aquele espaço. De organizar determinada secção ou de destruir involuntariamente o trabalho de um colega... Levar na cabeça por não conseguir montar direito uma montanha de livros ou ordenar com lógica uma montra. As pequenas guerras feitas por querer as coisas de uma maneira... e vir outro e pensar de outra.

Foi tudo feito com amor, nada em vão. O espaço viveu e conviveu com as manias de todos, procurando realçar o bom que havia em cada um.

E de repente... ali ao fundo chegava mais uma consignação para dar entrada. Criar ficha de produto, inserir o ISBN, conferir factura, etiquetar. Depois dividir por secção e arrumar. Um gesto tantas vezes repetido. Um gesto que hoje termina.

Há uma parte de mim que fecha. Uma parte que leva tantas memórias. Tantos e tantos momentos que guardo com as pessoas que comigo se cruzaram. E que ficaram para sempre.

Rodrigo

1 comentário:

  1. É uma pena quando a cultura é pouco valorizada... As Livrarias são pequenas casas emprestadas. Gosto de me perder lá dentro durante umas horas e depois voltar revigorada.

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