Há uma canção antiguinha que diz: “passarinho na gaiola fez um buraquinho, voou, voou, voou, voou, e a menina que gostava tanto do bichinho, chorou, chorou, chorou, chorou…”. Minha vovó cantava isso um bocadinho diferente, mas o que importa mesmo é que eu cresci com esse sentimento conflitante de menina na cidade: adorava estar perto dos pássaros, não suportava a ideia das gaiolinhas tão pequenas, sem vida.
Parece que o homem quer tudo engaiolar.
Parece que o homem tem se engaiolado.
Meu pai tinha um pássaro-preto que foi trazido para casa no meu primeiro aniversário. Viveu muitos anos, dentro e fora da gaiola. Dormia lá, saía, subia no ombro do meu pai e quando a gente se aproximava, dizendo “carinho, nego, carinho”, ele reclinava a cabeça e esperava nosso afago.
Talvez a gente não tenha dado uma vida tão feliz para o pássaro que já foi comprado em cativeiro, mas o contrário é certo. Nosso nego foi meu assum preto de Gonzaga e meu Black Bird de Poe, acalentou meus dias na sua sina de gaiola.
A morte do nego foi uma espécie de morte de mim. Crescíamos juntos e eu só estava começando a adolescer… Ficou vazia a gaiola, do jeito que ela deveria ter ficado desde sempre. O pássaro-preto voou para as nuvens, foi cantar lá em cima.
Não restou mais gaiola em casa.
“Passarinho
Não pode viver preso.
Passarinho
É bom de se ver
Voando.
Passarinho
É bom de se ouvir
Cantando.
Passarinho
Não tem defeito.
Para ser
O enfeito do mundo
É que passarinho
Foi feito.” *
Canta coruja, beija-flor, tiziu, canários, quero-quero (e eu quero) quero tanto o joão-de-barro, até mesmo urubu, que pode parecer sinistro, não está na Terra por engano. Voam gaivotas, pardais e o curió pequenino. A passarada toda.
Penélope Martins
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