domingo, 9 de junho de 2013

Clarice Lispector em Junho

Ali em pé na semiescuridão do terraço, de repente mais suave, veio-lhe outra revelação que durou pois era o resultado intuitivo de coisas que ela pensara antes racionalmente. O que lhe veio foi a levemente assustadora certeza de que os nossos sentimentos e pensamentos são tão sobrenaturais como uma história passada depois da morte. E ela não compreendeu o que queria dizer com isso. Ela o deixou ficar, ao pensamento, porque sabia que ele encobria outro, mais profundo e mais compreensível. Simplesmente, com o copo de água na mão, descobria que pensar não lhe era natural. Depois refletiu um pouco, com a cabeça inclinada para um lado, que não tinha um dia a dia. Era uma vida a vida. E que a vida era sobrenatural.
Naquela hora da noite conhecia esse grande susto de estar viva, tendo como único amparo apenas o desamparo de estar viva. A vida era tão forte que se amparava no próprio desamparo.


Clarice Lispector está na minha agenda de leituras. Conheço-lhe pensamentos, frases poderosas, poemas... Fui ver a exposição dela a Lisboa - na Gulbenkian. Sei muitos pormenores da sua vida, apaixonei-me pela sua história. Mas o acaso não me pôs um livro à frente para o ler. São coisas que não se explicam... Simplesmente são como são.

Fui ao quarto ver o que tenho de Clarice. E felizmente tenho muito por onde escolher. Peguei em Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres e descubro que mora aqui em casa há quatro anos. É a altura dele. Melhor ainda por saber que vai ser partilhado neste blog.

Leio a nota inicial. E é com ela que vos deixo. Espero que partam nesta aventura pelo mundo de Clarice. Vai valer a pena.

ESTE LIVRO se pediu uma liberdade
maior que tive medo de dar. Ele está
muito acima de mim. Humildemente
tentei escrevê-lo. Eu sou mais forte
do que eu.

C.L.

*Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres é uma edição da Relógio D'Água. 

1 comentário:

  1. Tenho alguns livros da Clarice e, gosto do seu "imprevisivel" e "inquietante".

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