terça-feira, 26 de março de 2013

a-ver-outros-livros no Metro: Lobo Antunes

Vejo-o ali, no mármore, e fico à espera que diga algo naquela voz meio rouca, naquele tom meio romântico-desdenhoso que lhe conheço desde sempre. Fico à espera que deixe de olhar para mim com aquele olhar de quem vê o que não sei que sou e siga caminho. Pode ser que esteja à espera da carruagem seguinte. Afinal, é - de todos os escritores que o cartoonista António retrata nas paredes da estação do Aeroporto do Metropolitano de Lisboa - o único ainda vivo.

 António também, mas Lobo Antunes de apelido, (Lisboa, 1 setembro 1942), médico psiquiatra de formação, escritor de veias e tripas e tudo. Burguês marcado pela Guerra Colonial, homem marcado pela vida de todos os dias, sarcástico e impiedoso. A Penélope do Nobel que não chega tecendo ainda a tela que nunca está feita, de forma obssessiva e, como alguém disse, labiríntica.

Não pensem que me vou esticar hoje. De Lobo Antunes lembro-me do primeiro volume comprado ao senhor que trazia o Círculo de Leitores à minha porta - e me olhava sempre como se partilhássemos um segredo -, chamava-se "Memória de Elefante" e nem tinha direito a capa dura. Lembro-me que o li de um fôlego e, logo em seguida, comprei "Os Cus de Judas". E rendi-me. Quando "Explicação dos Pássaros" me chegou à mão eu já o esperava como a um bom amigo que andara por aí.

A modos que me perde no final dos anos 90, nem sei bem porquê. Mas faço as pazes todas as semanas ou, hoje em dia, de quinze em dias, com as crónicas que publica na revista Visão.

E é isso mesmo que vos ofereço: o link para as crónicas de Lobo Antunes.
Isso e este apontamento, que absolutamente adoro:

"Conto até cem e, se não chegares antes dos cem, vou-me embora. Não chegaste antes dos cem. Conto de cem a um e, se não chegares antes do um, vou-me embora. Não chegaste antes do um. Conto dez automóveis pretos e, se não chegares antes dos dez automóveis pretos, vou-me embora. Não chegaste antes dos dez automóveis pretos. Nem antes dos quinze táxis vazios. Nem antes dos sete homens carecas. Nem antes das nove mulheres loiras. Nem antes das quatro ambulâncias. Nem sequer antes dos três corcundas e, entretanto, começou a chover."

António Lobo Antunes

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