terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Rui Zink em entrevista

A propósito do seu último livro
A Instalação do Medo



RSM: A instalação do medo, o quanto há de metáfora e de literalidade neste título, neste livro?
R: A pergunta deve ser feita à dona realidade, não a mim. Eu apenas transcrevo.

RSM: “Bom dia, minha senhora, viemos para instalar o medo. E, vai ver, é uma categoria.
In A instalação do medo
Já bateram à sua porta para instalar o medo?
R: Já. Ultimamente é todos os dias.


RSM: “Ela sabe o que a espera, sabe também que não sabe o que a espera”.
In A instalação do medo
O inesperado “mete” medo?
R: O medo instala-se, seja em que situação for, nas fímbrias da imaginação. Como um polícia que (aconteceu-me há 30 anos) mal chegamos à esquadra-coito fica calmo e pergunta por que motivo não estou eu também calmo.

RSM: “Tempos desalmados pedem gente desalmada.
In A instalação do medo
Concorda?
R: Não. Transcrevi-o e (prontos transcrevi-o) mas acho uma monstruosidade.

RSM: “- O medo é a pragmática da metafísica. / - Ou a metafísica tornada pragmática.
In A instalação do medo
O que é o medo?
R: O medo é um desequilíbrio artificial provocado voluntariamente ou involuntariamente no íntimo de um indivíduo ou de um colectivo. Quando vivíamos em grutas era um utensílio, hoje o mais das vezes é uma filhadaputice.

RSM: De que é que tem medo?
R: De que algo aconteça aos meus filhos. What else?

RSM: Qual a sua personagem preferida e porquê?
R: Gosto da mulher. Tem tomates. Até hoje não conheci uma mulher que não os tivesse. Até hoje, infelizmente, conheci muito poucos homens que os tivessem.


RSM: Os instaladores do medo são previsíveis?
R: Eles bem julgam que não são, mas...

RSM: Estava muito curiosa pelo final do livro. Não revelando pitada, digo apenas que me surpreendeu e que o final sustenta perfeitamente toda a narrativa.
Posto isto, uma pergunta mais comezinha, no final, o medo perde ou ganha?
R: Boa pergunta. A minha tentação (juro) é responder, mas já passei dos 50 anos e virei sábio.

RSM: Como foi o processo de concepção do livro, antes da palavra no papel já tem estruturadas as linhas de efabulação ou tudo acontece de forma mais livre e solta a posteriori, ou seja, enquanto escreve?
R: Quando escrevo para publicar, e obviamente nem sempre o faço, tento pensar no "leitor ideal". Ou seja, estou a contar uma história, não a baptizar uma alforreca. Penso em mil hipóteses e depois, que remédio, escolho um caminho. Sabendo sempre que, depois, vou poder rever mas que rever nunca é escrever.

RSM: Depois do último ponto final, o trabalho de revisão dá-lhe prazer, mete-lhe medo ou entedia-o?
R: Gosto muito, muito mesmo, de rever. É a única parte pela qual mereço mérito - e que me orgulha enquanto ser pensante.

RSM: Uma coisa que este livro não conseguiu fazer foi o permitir-me abstrair do tempo em que vivo, das horas do quotidiano. Nesse sentido o livro “incomodou-me”?
Quer com este livro “incomodar” os leitores?
R: Esse é o drama do escritor que tenta ser honesto. Um livro é um livro, certo? Um livro é um livro. A sua função primeira é entreter. Mas, por vezes, uma pessoa descobre que, complicando a vida ao leitor, serve melhor o leitor. Com o risco de o leitor ir buscar autores mais amáveis. Mais amáveis serão... mas não o amam tanto. Mal comparado, é como com os filhos: fazer as vontadezinhas faz de nós melhores pais? (Eu sei que parece arrogante dizer que sei mais que os leitores, mas por acaso, desculpem qualquer coisinha, sei: sou mais velho, mais experiente, mais lido, trabalhei mais que vocês... Não vos chega o meu amor? Querem também que minta e diga que vos acho o máximo, infelizes?)

RSM: São os livros capazes de incomodar e no limite de mudar vidas?
R: Sim. Raramente, mas sim. Essa é a fé.

RSM: É paralelamente professor, leccionar e escrever são trabalhos que convivem bem juntos ou “um” “devora” o “outro”?
R: Nadamos no mesmo mar. Para mim (pelo menos para mim) é o mesmo mar. Recuso-me a dar aulas que não sejam uma #$% aventura. Despeçam-me quando quiserem, be my guest, burrocratas.

RSM: Quais os três escritores que mais gosta neste momento?
Inês Pedrosa, Alberto Pimenta, António Carlos Cortez. São os que estão à minha frente e não os trocava por nada deste mundo. Cada momento é um vodca absoluto, e esta publicidade é grátis.

RSM: Quais os últimos três livros que gostou de ler?
R: Isto é para ver se me apanham em contradição, é? Mas não há contradição, há dialética. Um livro é um livro, uma unidade. Uma unidade em movimento. De nada, Alberto Pimenta (Boca). Dentro de ti ver o mar, Inês Pedrosa (D. Quixote). O coleccionador de Mundos, Ilja Torjanow (Arkheion).

Obrigada.

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