sábado, 15 de dezembro de 2012

Poema à noitinha... Walter Benjamim

Se ao Mundo Predissesses teu Morrer 

«Se ao mundo predissesses teu morrer
na morte a natureza ir-te-ia à frente
volvendo com mandado intransigente
no eterno esquecimento o próprio ser

O céu se rosaria docemente
por do teu corpo a roupa enfim descer
florestas tingiria o teu sofrer
de negro e a noite o mar barca silente

Luto sem nome com estrelas mede
a estela ao teu olhar no arco celeste
e a escuridão de espesso muro impede

que a luz da nova primavera preste
A estação vê nos astros que pararam
as cisternas que a morte te espelharam.

*Walter Benjamin, in "Os Sonetos De Walter Benjamin" - Campo das Letras 
Tradução de Vasco Graça Moura

 

"Walter Benjamin escreveu um ciclo de 73 sonetos entre 1915 e 1925, isto é, entre os seus vinte e três e trinta e três anos. Os poemas são dedicados ao seu amigo Friedrich C. Heinle, um poeta de dezanove anos, e à companheira deste, Rika Seligson, que se tinha suicidado em 1914, pouco depois de começar a primeira guerra mundial. (…) Os textos foram descobertos na Bibliothèque Nationale de Paris, em 1981, com outros manuscritos que Benjamin confiara a George Bataille, em 1940, pouco antes de, por sua vez, se suicidar, e que ali tinham sido depositados. (…) Nesta sequência sobre a morte, em grande parte escrita durante os anos da guerra, depara-se-nos como que uma rejeição da violência, levando à integração da morte no acto poético, "como normalidade". (…) O patético desta obra não está apenas em o autor não ter chegado a revê-la e a organizá-la definitivamente, porventura reduzindo-a em extensão e aumentando-lhe desse modo a eficácia estética, pois há toda uma série de sonetos muito belos. Está também em ela ter ficado por mais de sessenta anos sem ser conhecida, e portanto sem ter podido gerar qualquer espécie de influência ou discussão na produção literária do seu tempo. É nesse sentido que lhe chamo opus in absentia e para ela procurei, mais do que as traduções, as «aproximações» que se seguem."

Vasco Graça Moura

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