terça-feira, 25 de setembro de 2012

1º Parágrafo: A Alma das Ruas


Eu amo a rua. Esse sentimento de natureza toda íntima não vos seria revelado por mim se não julgasse, e razões não tivesse para julgar, que este amor assim absoluto e assim exagerado é partilhado por todos vós. Nós somos irmãos, nós nos sentimos parecidos e iguais; nas cidades, nas aldeias, nos povoados, não porque soframos, com a dor e os desprazeres, a lei e a polícia, mas porque nos une, nivela e agremia o amor da rua. É este mesmo o sentimento imperturbável e indissolúvel, o único que, como a própria vida, resiste às idades e às épocas. Tudo se transforma, tudo varia — o amor, o ódio, o egoísmo. Hoje é mais amargo o riso, mais dolorosa a ironia, Os séculos passam, deslizam, levando as coisas fúteis e os acontecimentos notáveis. Só persiste e fica, legado das gerações cada vez maior, o amor da rua.


* João do Rio, pseudónimo de João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto, (Rio de Janeiro, 5 de Agosto de 1881 — 23 de Junho de 1921), jornalista, cronista, tradutor, como jornalista contribuiu para mudar a forma de fazer jornalismo, como repórter profissional constitui um novo tipo de jornalista, numa actividade então considerada menor e secundária, feita por pessoas com tempo livre disponível.

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