sábado, 26 de maio de 2012

Livro do mês: a questão da crença ou descrença na vida após a morte

Várias são as questões levantadas na leitura do mês - «Somos o Esquecimento que Seremos». Héctor Abad Faciolince vai abordando temáticas que vão aumentando de interesse, página a página. Nesta passagem escreve sobre a sua visão da crença e da descrença. Respeitando as duas e tentando explicar a sua origem.


"Às vezes, algumas pessoas, ébrias de racionalidade, quando crescem pensam melhor e, durante alguns anos, adoptaram o ponto de vista da descrença, mesmo que tenham recebido uma educação confessional. Porém, basta uma qualquer fragilidade da vida, a velhice ou a doença para os tornar tremendamente susceptíveis a procurar o apoio da fé, encarnada nalguma potência espiritual. Apenas os que forem expostos, desde muito cedo na vida, à semente da dúvida poderão questionar de uma ou outra das suas crenças. Contudo, para aqueles que desconhecem a vida espiritual (no sentido de seres e lugares que sobrevivem à morte ou que são preexistentes à nossa própria vida) haverá sempre uma dificuldade adicional, que consiste em que, provavelmente, devido a uma certa agonia existencial do homem e à nossa torturante e tremenda consciência da morte, o consolo proporcionado pela crença noutra vida e numa alma imortal capaz de chegar ao Céu ou de transmigrar será sempre mais atraente e dará mais coesão social e sentimento de irmandade entre pessoas afastadas que a fria e desencantada visão na qual se exclui a existência do sobrenatural. Nós, os homens, sentimos uma profunda paixão natural que nos atrai para o mistério, e é uma tarefa dura e quotidiana evitar a armadilha e a tentação permanente de acreditar numa indemonstrável dimensão metafísica, no sentido de seres sem princípio nem fim que são a origem de tudo, e em impalpáveis substâncias espirituais ou almas que sobrevivem à morte física. Porque, se a alma equivale à mente, ou à inteligência, é fácil demonstrar (basta um acidente cerebral ou os obscuros abismos da doença de Alzheimer) que a alma, como disse um filósofo, não só não é imortal, como é muito mais mortal que o corpo."

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