quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Arundhati Roy: E um segundo livro?

O essencial da biografia de Arundhati Roy leiam na Wikipedia. É para isso que serve. Por mim vou tentar apanhar-lhe a pulsação por aí nas entrelinhas. Quem sabe seja um contributo para conhecer melhor a autora de “O Deus das Pequenas Coisas”. Quem sabe não passe de um exercício de escrita para mim, de leitura para alguns. Não se perde nada, pronto.

There's so much noise in the world, so why add to it? In my case, I only write when I can't not", afirmou Arundhati numa entrevista dada em Janeiro deste ano a Ian Jack, do ‘The Guardian’. Qualquer coisa como: “Já existe tanto ruído no mundo, porquê criar ainda mais? Por mim, só escrevo quando não posso mesmo deixar de o fazer”.

Aos 50 anos, 18 depois de ter agarrado leitores em todo o mundo com o seu livro de estreia, a senhora Roy respondia sobre um eventual segundo livro de ficção, que assumia já ter começado. Em Junho seguinte era Stephen Moss, também do ‘The Guardian’, que queria saber dos eventuais progressos nesse sentido. “Tenho trabalhado no segundo livro, sim”, respondeu – “com uma gargalhada”, precisa o jornalista. “Mas não tenho muito tempo para isso. Sou uma pessoa muito pouco ambiciosa. Que interessa se há ou não outro livro a caminho? Não vejo as coisas nessa perspectiva. Para mim, nada valeria não ter ido àquela floresta.”

Arundhati referia-se às três semanas que passou com a guerrilha do movimento maoista na floresta de Dantewada, no coração da Índia, onde acontece a luta da população indígena que resiste contra as tentativas governamentais de deixar passar o “desenvolvimento” corporativo, assente nos recursos minerais da região. Noutra entrevista revelaria como recebeu um bilhetinho dactilografado por baixo da porta principal de casa, em Deli, a convidá-la para esta aventura. Nesta fala das noites passadas no “hotel de mil estrelas”, elogia “a ferocidade e a grandeza daquela pobre gente que resiste” e garante que viver na floresta a fez sentir “como se tivesse espaço suficiente no seu corpo para todos os órgãos”, o que quer que isso queira dizer.

O seu entusiasmo com esta nova causa – e o desafogo de ter vendido seis milhões de cópias de “O Deus das Pequenas Coisas” em todo o mundo, o que a deixou rica, mesmo dando imenso dinheiro para várias causas – torna a perspectiva de um segundo romance cada vez mais longínqua. Mas não apenas por isso. Se calhar, dá-se que Arundhati é, na verdade, tudo menos uma escritora de ficção. Afinal, “O Deus das Pequenas Coisas” sugou tanto do que foi a sua realidade – da mãe carismática mas dominadora ao pai cultivador de chá e alcoólico, que saiu de cena quando era ainda miúda; passando pela adolescência em que saiu de casa para viver a vida. Quem sabe anda a coleccionar temas para esse tal segundo livro. “Eu não tenho temas. A ficção é demasiado bela para ser apenas sobre um assunto. Deve ser sobre tudo”, disse a Moss. Desculpa para esconder a pressão de estar à altura do que já foi um Booker Prize? “Não somos crianças para sentirmos necessidade de sermos sempre os melhores e ganhar prémios. Trata-se apenas do prazer de fazer algo. Eu não sei se vou escrever um bom livro, mas estou curiosa sobre como e o que escreverei depois de todo este percurso. Os meus editores sempre souberam que não ia surgir aqui uma fábrica de livros. Fui muito clara nessa questão. Eu fiz algo. Deu-me prazer. Agora estou a fazer outra coisa.”

Há coisa de seis ou sete dias, mais uma peça no ‘The Guardian’, desta vez assinada por Arun Gupta que fala com Arundhati a propósito do movimento Occupy Wall Street. E lá surge a pergunta da praxe. Então e quando aparece o raio do novo livro de que, segundo foi revelado algures, só o seu octogenário amigo John Berger, escritor e crítico literário, já leu algumas linhas? “Não tenho uma resposta para essa pergunta. Realmente não sei”, resumiu a escritora. A Anderson Tepper, do ‘The Paris Review’, também há muito pouco tempo, Arundhati seria mais explícita. “A ficção é algo tão amorfo, nunca podemos ter a certeza de que estamos a fazer algo importante ou maravilhoso antes de termos terminado. A ficção é algo que envolve tanta gentileza, tanto carinho, que acaba por ser continuamente esmagada sob o peso de tudo o resto. Ainda não consegui entender bem isto. – mas vou conseguir, vou conseguir.” Se ela o diz...

[*] Tradução livre dos vários depoimentos.

4 comentários:

  1. Por estranho que pareça, li este. Agora, que andam a discutir barragens, ganha um interesse especial: THE GREATER COMMON GOOD
    http://www.narmada.org/gcg/gcg.html

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  2. Uma vida intensa e uma visão muito serena e realista do que é a escrita e a sua função...
    Excelente!

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  3. " O Deus das pequenas coisas" foi dos livros que mais me marcou pelo realismo terrível de uma sociedade peculiar... Não me importaria nada de ler um 2º livro dela.

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  4. Vamos esperar para ver se, do meio da comoção que é a vida de Arundhati, ela consegue arrancar um novo romance. Cedo ou tarde, a existir, será certamente algo que valerá a pena ler.
    aa

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