quinta-feira, 24 de novembro de 2011

a-ver-livros: A leitora descalça

Oberlin, no estado norte-americano do Ohio, ali para a zona de Cleveland e Detroit, é uma cidadezinha com 11 quilómetros quadrados.

Sensivelmente o mesmo que a nossa cidade do Cacém, ali para os lados de Sintra. Com a diferença de que eles têm 8.000 e poucos habitantes e, por cá, na mesma área, somam-se 120 mil e mais uns trocos. Enfim.

Contra os nossos prédios e mais prédios e a IC19, eles avançam com uma zona mais verde do que urbana rodeando um pólo universitário essencialmente virado para as artes, famoso entre outros aspectos por ter sido a primeira instituição de ensino superior nos EUA a aceitar regularmente mulheres e negros.

Sim, aquela comunidade tem qualidade de vida. E tem outra coisa que me chamou a atenção: sentido de humor.

Junto ao balcão principal da Biblioteca Mudd, no coração do campus, a escultura “The Reading Girl” lá está, umas vezes envergando peças de roupa, outras vezes acessórios, na maior parte do tempo calçado, marcando as memórias de geração atrás de geração de estudantes que a embelezaram. Ao que foi possível apurar, nesta altura do campeonato – e na maior parte do tempo – a rapariga que lê tem no pezinho delicado uma sapatilha Converse azul, tamanho 38.

Arrancada da pedra pelo escultor novecentista John Adams Jackson – muitos anos depois dele ter deixado de ser um jovem aprendiz de maquinista e poucos antes de regressar à italiana Florença que o cativou na juventude para viver o resto dos seus dias – “The Reading Girl” tem data de nascimento em 1869.

Na sua tez pálida, ela é a testemunha impávida do passar do tempo numa biblioteca que vibra com a rápida evolução das tecnologias. O mundo pula e avança e ela continua ali, perdida no encanto da leitura.

Quero acreditar que, de vez em quando, levanta os olhos do livro que tem nas mãos e pisca o olho a alguém.

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