sexta-feira, 21 de outubro de 2011

In Bufo & Spallanzani

Apanhei na minha estante, aleatoriamente, alguns livros de escritores universalmente famosos e li as frases iniciais de cada um.

Como sabe todo colegial nesta era científica, há uma relação química muito estreita entre carvão e diamantes.

Nosso presídio estava encravado no recinto da fortaleza, ao fundo, rente aos taludes.

Não havia possibilidade de dar um passeio naquele dia.

O portão do pátio de uma estalagem da sede do distrito deu passagem franca a uma pequena carruagem de molas, uma dessas seges usadas pelos solteirões.

Sentada junto ao caminho, contemplando o carro que sobe em direção a casa, Lena pensa:

Hoje a mãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem.

Nunc et in hora mortis nostrae. Amen.

Aqui estamos de novo sós. Tudo tão lento, tão pesado, tão triste.

Sou o médico de quem às vezes se fala neste romance com palavras pouco lisonjeiras.

Então, príncipe, Gênova e Lucca são agora propriedades da família Bonaparte.

Durante muito tempo costumava deitar-me cedo.

Era a tarde do meu octogésimo quinto aniversário e eu estava na cama com o meu catamito quando Ali informou que o arcebispo havia chegado para me ver.[1]

Por coincidência até que essas frases fazem certo sentido, o que comprova a teoria (se ainda não existe estou inventando-a neste instante) de que palavras juntas, seja de que maneira for, sempre têm um certo nexo (ver Burroughs).
Um romance, pois, pode começar como o autor quiser. Um livro que começa “Durante muito tempo costumava deitar-me cedo” pode interessar ab initio, ao leitor?


[1] Livros e autores, pela ordem dos parágrafos:
Vitória, Conrad; Recordações da casa dos mortos, Dostoievski; Jane Eyre, Bronte; Almas mortas, Gogol; Luz em agosto, Faulkner; O estrangeiro, Camus; O leopardo, Lampedusa; Morte a crédito, Céline; Consciência de Zeno, Svevo; Guerra e paz, Tolstoi; O caminho de Swann, Proust; Earthly Powers, Burgess. São todos estrangeiros e mortos (com exceção de Burgess). Alguns não são autores da minha predilecção. Não estão incluídos autores de língua portuguesa de propósito, conquanto a literatura de língua portuguesa nada deva à dos autores referidos, isto é, inglesa, russa francesa e italiana. Repito, após a preliminar exclusão, a selecção foi aleatória, livros apanhados na estante ao acaso. Para mim não existem nem as dez, nem as cem, nem as mil obras-primas da literatura universal.

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