segunda-feira, 13 de junho de 2011

Bastaria um poema para nos fazer felizes antes de morrer


"Gosto de pensar que trato a editora como quem trata uma vinha"

"Às vezes, tenho a sensação de que a edição é outra forma de escrita, é uma maneira de escrevermos um livro maior"


"Precisávamos de ter várias vidas, não é?, para acertar com uma. Esta é muito pequena. Mesmo que a tenha vivido intensamente"


Manuel Hermínio Monteiro, um nome que marca a literatura portuguesa. Do amor aos livros e à escrita associado a uma enorme capacidade de descoberta e redescobertas das coisas fez da Assírio & Alvim uma marca de qualidade na edição em Portugal. Mais que uma editora um pólo cultural de referência. Excelência na selecção de um catálogo que consegue abranger tantas áreas. A coragem de publicar o que ninguém sonhava publicar pouco depois da Revolução de Abril. Pôr nas ruas artes, poesia, cinema num país onde a maior parte da população era analfabeta ou quase analfabeta... o cenário hoje ainda é desolador.

O último gesto deste senhor foi provavelmente um culminar que mesmo para ele era já esperado. Uma antologia de poesia de todo o mundo. Um objecto único nas literaturas de topo. Tem tudo e de todo lado. "Rosa do Mundo – 2001 poemas para o futuro", publicado em parceria com a Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura. Monumental colectânea de escrita da poesia de todos os tempos e lugares dos homens, esse, na sua humildade, não reconheceria grande valor à sua escrita (nunca tendo publicado nada para além de colectâneas e pequenos textos). E contudo era senhor de uma prosa cristalina e serena. Escrevia num português suave, ocultamente culto, discreto e perfumado, onde as muitas leituras, o convívio assíduo com o processo de escrita dos outros, que sabiam descobrir com tanta perfeição. As raízes transmontanas que se sentem, mas nunca se impõem aos textos que, aqui e ali, publicava.


Em 2004, o “Independente”, na colecção Horas Extraordinárias, edita "Urzes", colectânea de textos do editor, onde é manifesta a intervenção de Vasco Rosa e de Manuela Correia, sua companheira até ao fim. Tudo tem um fim: a vida de um grande homem, o projecto de um jornal que (para o bem e para o mal) era diferente; um projecto editorial que conheceu uma vitalidade de que agora apenas podemos começar a sentir nostalgia.

Hoje no dia em que se comemora o aniversário de Fernando Pessoa a homenagem é para aqueles, este em particular que são também responsáveis por aqueles que escrevem. A maior homenagem ao Hermínio só poderia vir em forma de poesia. Com as palavras de Luíza Neto Jorge: “O poema ensina a cair/sobre os vários solos/desde perder o chão repentino sobre os pés como se perde os sentidos numa queda de amor…”.

Bastaria o poema ensinar a cair e estaria o dia completo.

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