terça-feira, 10 de maio de 2011

Happy hour, sad ideas!

 Hora H ou Happy hour como também é conhecida. Na verdade parece ser algo muito atractivo para quem compra livros e de alguma forma até para quem os vende.
Analisando a fundo a questão constatamos que de todas as áreas dos ditos produtos culturais os livros são os que menos apoio têm por parte das entidades públicas, compare-se com os poucos mas existentes apoios ao teatro ou ao cinema. Em segundo esta iniciativa é injusta logo à partida e logo pela organização que a promove. A APEL representa livreiros e editores. Os editores negoceiam com os livreiros com uma determinada margem e estando na mesma associação uns passam a ter privilégios de concorrência que são à partida injustos e desleais. Para além disso mina uma relação que existe para além das feiras e que sustenta comercialmente as editoras e livrarias o resto do ano. Não é justo negociar a 30% ou a 40% com os livreiros e depois estar ao lado deles a fazer 50%. Aliás é de tal forma caricato que estas Happy Hours têm sido altamente frequentadas por responsáveis de livrarias que têm aproveitado para se fornecer. Para além disso esta medida só favorece os grandes grupos e grandes editoras que têm fundos editoriais que podem desbaratar até porque em alguns casos seriam livros para guilhotinar... isso sim uma prática condenável!
Para os clientes é também injusto porque obriga as pessoas a jogarem com esse horário, impossibilitando, por exemplo, quem tem problemas em se deslocar à noite ou quem só pode frequentar a Feira noutros horários de aproveitar também esta iniciativa que devia ter como fim promover a leitura e não o lucro fácil. Coragem não é fazer uns dias de livros muito baratos, coragem é manter preços acessíveis e ajustados durante todo o ano. Coragem é publicar com qualidade como critério e não com rentabilidade ou rapidez de sucesso como critério principal e essencial.
Apostar em novos autores e em matérias editoriais com valor tem custos que se tem de sustentar todo o ano e não com foguetes promocionais de aparente rentabilidade.
Querem fazer promoções, assumam e mantenham-nas durante todo o dia ou durante toda a feira, seleccionando títulos. Façam cumprir verdadeiramente a lei do preço fixo. Retirem o IVA do preço dos livros. Promovam o livro enquanto objecto e enquanto mais valia cultural.
Não andem é a atirar areia para os olhos das pessoas e a engana-las com estratégias de marketing for dummies!
A APEL tem o dever de proteger os interesses de todos: livreiros, editores e também dos leitores e já se devia ter apercebido que a promoção desta iniciativa em nada ajuda quem mais dificuldades tem. Cria guetos na própria feira, espaços isolados e desiguais com regras próprias e com o tempo afastará não só as pessoas como as próprias editoras com menos capacidade de implantação financeira.


Não restam dúvidas de que é também um problema socio-económico, o de acesso ao livro, quer pelo preço que tem no mercado completamente desfasado do preço de produção e edição quer pela acessibilidade à rede nacional de bibliotecas. A ainda baixa escolaridade e iliteracia e a má qualidade da educação faz com que para muitos a leitura seja um estorvo, um desafio para uma elite cultural. A aquisição de um livro continua a não ser uma prioridade nas escolhas de uma família. Para além do dinheiro, há também a questão do tempo. Crianças, jovens e adultos perdem uma boa parte do seu tempo a deslocarem-se entre local de trabalho e casa. Os jovens restringem ao obrigatório as suas leituras, os mais adultos procuram leituras mais rápidas nas revistas e nos jornais. Nas políticas de promoção da cultura voltam a falhar as interacções com outros sectores e aspectos das vidas das pessoas. Falta o tempo para viver, falta o tempo para o lazer.
A cultura envolve duas vertentes, uma mais activa e a outra mais passiva, a criação e a fruição cultural. Na verdade, sendo um direito consagrado na Constituição, nem por isso significa que todos têm acesso à criação e à fruição. Sendo que, mais facilmente fruímos um bem cultural, do que o criamos. Nem todos podemos ser pintores, ou escritores. No entanto, todos podemos observar um quadro, ler um livro. A escrita é, de facto, a primeira grande revolução de ordem intelectual e de uma importância que é inegável, não seria possível imaginarmos a nossa realidade sem a escrita, ainda que pensemos nos avanços tecnológicos, ela lá está, nos telemóveis, nos computadores, na Internet, enquanto meio de comunicação e enquanto suporte de transmissão e aquisição de informação.
A leitura é um hábito como outro qualquer: cria-se. E cria-se mais facilmente quando se é mais novo. E cria-se mais facilmente quando o contexto envolvente o propicia. Contexto é um país onde a cultura seja um aposta a sério e não um aparato de figuras, eventos e inaugurações para aparecer na televisão e nos jornais. Poderemos distinguir educação e cultura?

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