domingo, 12 de dezembro de 2010

Excerto do livro do mês... Novembro!

Enquanto se aguardam análises mais profundas ao livro do mês de Novembro, vou dando mais umas pistas ao público.

Tenho marcada uma página para partilhar convosco.

'Eu preferiria não o ajudar a ferir outras pessoas, meu amigo, ou a causar a si próprio outras feridas para além daquela que considerar ser o seu paraíso. O rato vive numa toca. É extremamente difícil viver numa toca; pelo menos, os pássaros considerariam que seria um mau paraíso. Por outro lado, a águia sentes-se em casa nos picos das montanhas e considera-se a rainha de todos os ventos. Ah, como isso é completamente absurdo, meu amigo! E os nossos pobres pássaros das charnecas voltam todas as Primaveras à Islândia e partem todos os Outonos voando com aquelas asinhas inúteis sobre o temível oceano. Mas não se pense que o fazem acidentalmente ou à sorte. Não, têm a sua filosofia própria, embora possam ser citadas autoridades para provar que se trata de um acto de loucura. Eu nunca faria isso. Eu defendo que se deveria ajudar todas as criaturas a viver conforme o seu desejo. Mesmo que um rato me dissesse que gostaria de viajar sobre o oceano e que uma águia afirmasse que estava a pensar escavar um buraco no chão, eu diria: Força nisso. No mínimo deveríamos permitir que os outros vivessem como cada um de nós pretende viver, desde que não os impedíssemos de viver como quisessem viver. Eu sei que é possível provar que tudo correria melhor se fôssemos todos minhocas e se vivêssemos todos no mesmo quintal, mas a águia pura e simplesmente não acredita na verdade, nem o rato. Eu estou tanto do lado da águia que adere a uma doutrina manifestamente falsa, como do lado do rato, que é tão humilde na sua maneira de pensar que escava para si um buraco no chão. Eu sou amigo das aves migratórias, embora, para ser simpático, elas adiram a filosofias dúbias, talvez até mesmo erróneas.'


in 'Os peixes também sabem cantar'. Capítulo 16, pág. 114/115.

1 comentário:

  1. ... Tínhamos algumas galinhas, cujos ovos sabiam a peixe.

    ... Qualquer pedra da nossa pequena casa cintilava devido às escamas do peixe, e o mesmo se passa com as estacas do abrigo de pesca e com o monte de turfa a norte deste último.

    ... Mas quando chegámos a meio do adro da igreja, no caminho de regresso a casa, a minha avó disse-me:
    - Existe uma coisa que nunca deves fazer, pequenote, porque é malvadez.
    - E o que é avó? – perguntei.
    - Nunca mates moscas na casa de outras pessoas – respondeu a minha avó.
    - A tia Kristín é assim tão amiga das moscas dela? – perguntei.
    - Não – replicou a minha avó. – Mas é ela que vive em Hríngjarabaer.

    ... Na Islândia, desde tempos imemoriais, as fossas encontravam-se a céu aberto e desprotegidas à porta das casas das pessoas, como ainda hoje acontece nas quintas em França, e, por essa razão, morreram afogados nessas fossas a céu aberto mais islandeses do que em qualquer outro mar, exceptuando o oceano, ...

    ... e se uma pessoa estivesse mais morta que viva, dizia-se “Oh, está um bocado em baixo”. Se alguém estivesse a morrer devido à idade avançada, empregava-se a seguinte frase: “Sim, tem comido menos nestes últimos dias.” Acerca de alguém que estivesse no leito da morte, dizia-se: “Sim, está a fazer as malas, o desgraçado.” De um jovem mortalmente doente, dizia-se que não parecia que viesse a ter alguma vez cabelos grisalhos para pentear. Quando um casal se separava, usava-se a seguinte frase: “Sim, acho que se passa algo de errado por ali”.

    ... A minha avó disse-me que tinha aprendido a reconhecer as letras do alfabeto com um velhote que as gravava no gelo para ela, quando tivera que tomar conta de ovelhas no Inverno.

    In Os Peixes Também Sabem Cantar de Halldór Laxness

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