quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O remorso de Baltazar Serapião, Valter Hugo Mãe

Devia anunciar este autor com minúsculas. É assim que prefere ver escrito o seu pseudónimo. Conheci-o na sessão de apresentação deste livro, há uns dois anos, na loja onde trabalhava.

A capa convidou-me a lê-lo. Os colegas puxaram uns pelos outros. Fomos conhecendo a história e aconselhando o nosso público. Estava ali um valor que era desconhecido para muita gente, mas que tinha ganho o prémio literário José Saramago em 2007.

Saramago escreveu: 'Este livro é um tsunami, não no sentido destrutivo, mas de força. Foi a primeira imagem que me veio à cabeça quando o li. [...] Quando foi publicado? E os sismógrafos não deram por nada? Oh, que terra insensível: este livro é uma revolução. Tem de ser lido, porque traz muito de novo e fertilizará a literatura.'


A linguagem de Valter é muito diferente daquilo que estamos habituados a ver. Ele vai buscar expressões muito próprias da nossa língua, alguns vocábulos esquecidos pelo tempo ou por quem os usa. Arcaica e rude, dirão alguns.

Organiza uma história notável e muito violenta acerca da condição feminina na sociedade medieval. Da mulher de Baltazar, dividida por ele e pelo senhor Feudal. Um romance sobre a violência doméstica, mas da pior que se consegue imaginar. Nas longas porradas de Baltazar à sua mulher, como forma de a educar e deter poder sobre ela. Da disputa com o seu Senhor pela posse dela, da infidelidade. Tudo servido com toques de bruxaria, da partilha da casa com uma vaca Sarga, dotada de linguagem e pensamento próprio.

Destaco a opinião de Maria Augusta Silva que sintetiza toda esta nova experiência de escrita: 'Aquilo com que valter hugo mãe nos arrebata […] não se liga a sintagmas de pernas para o ar ou à escrita sem maiúsculas. Aí, nada de novo. […] Então por que merece ser destacado o novo romance de valter hugo mãe? Porque estamos perante uma obra de invulgar plasticidade literária sem ofuscar a crueza do enredo nem o imaginoso remorso do protagonista. Porque, sem moralismos, as grandes metáforas da violência e do sexo, das tiranias, das solidões, dos medos e silêncios, estão neste livro, mostrando-nos que todos os tempos, do passado ao futuro, têm as suas idades médias. E as suas bestas.'

Vai valer a pena ler este livro.

2 comentários:

  1. Li-o este ano, pois queria conhecer a escrita de valter hugo mãe e fiquei rendida. A história é um murro no estômago, mas está tão bem escrito, que o leitor não consegue deixar o livro de lado. Gostei imenso e o autor passou a fazer parte daqueles que quero continuar a seguir e a ler.

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  2. Sem dúvida. Uma grande surpresa. Este livro não nos deixa indiferente, apesar de gostar mais do seu primeiro, 'o nosso reino'. Em breve escrevo sobre este.

    Queria dizer a todos os que acompanham este blogue que ler valter hugo mãe é um investimento seguro.

    O meu escritor preferido desta nova geração que agora começa.

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