terça-feira, 19 de outubro de 2010

Como Deus Manda, Niccolò Ammaniti

Esta é história de um assalto a um banco.

Tem como narrador um menino de treze anos, Cristiano Zena, sendo os assaltantes o seu pai e dois amigos seus, as únicas pessoas que também Cristiano vê como amigas.

Mas este livro é tudo menos a história de um assalto a um banco, e não porque essa empresa tenha tido uma falência atroz e relativamente cómica, porque por paradoxo, é possível encontrar comicidade no limite da desgraça, mas porque são as personagens que nos deixam perplexos e mesmo impotentes.

O pai, Rino Zena “tinha todo o género de dificuldades na vida menos o de encontrar com quem foder e com quem andar à pancada”.

E no entanto pai e filho funcionam, encontramos cumplicidades, mas principalmente encontramos amor, um amor tão completamente pragmático, um amor capaz de com um tiro matar o cão do vizinho, um amor capaz de livrar-se do corpo sem vida de uma menina de 13 anos.

Qual o momento exacto em que tudo muda numa vida?

Quando o amor se perde... a mulher de Rino, a mãe de Cristiano deixou-os.

Quando não conseguimos arranjar trabalho... “Tem calma... Isso mesmo, tinha de ficar calmo. Tranquilo. Sereno. Mas como é que se consegue ficar sereno quando, com a regularidade de um pêndulo, te enfiam um limão pelo cu acima?

Quando nunca somos chamados pelo nome, mas pela alcunha ganha à custa da nossa pizza preferida: Quattro Formaggi.

Quando somos capazes de matar... “Rino sabia que o mito que se contava acerca de Quattro Formaggi de que ele jamais faria mal a uma mosca era um disparate tão grande como dizer que os impostos iam baixar. Não passava um único dia sem que alguém, por um motivo ou por outro gozasse com ele, o imitasse, lhe desse menos sopa na cantina dos pobres, o fizesse sentir-se um idiota, e ele não levava a mal, sorria, e toda a gente a dizer que Quattro Formaggi era um tipo superior a isso tudo. Superior o caralho! Aquele sorriso a meia boca, que lhe saía depois de alguém o ter imitado e chamado epiléptico, não era sinal de que Quattro Formaggi era um santo, mas que o insulto o atingira em cheio, penetrara numa parte sensível e que a dor ia engrossar uma parte do seu cérebro onde pulsava algo de infectado, de desviante. E num dia ou noutro, mais cedo ou mais tarde, aquela coisa má viria ao de cima. Rino pensara nisso um milhão de vezes, e um milhão de vezes dissera que tinha esperança de se enganar.

Quando a filha nos morre no banco de trás do carro sufocada pela tampa de uma embalagem de champô maçãs verdes anti-caspa, presa à cadeirinha porque “... a maldita fivela não se abria, tinha dois botões enormes, cor de laranja, em que era suficiente carregar ao mesmo tempo, coisa que ele fizera cem vezes, abrindo-se sempre perfeitamente, uma fivela alemã estudada pelos melhores engenheiros do mundo...”.

Quando se tem 13 anos e “...vontade de chorar, mas mais do que chorar queria era arrancar os olhos das órbitas.”

E encontramos mais personagens, tantas!... mas todas as histórias são tristes, e no entanto, comovidos, lemos o que nos conta este menino e entra-nos na alma uma estranha esperança.

Deve ser por causa das pequenas ternuras... tão facilmente entranháveis, como as húmidades e as águas, numa história que se desenrola num tremendo dia de tempestade.


3 comentários:

  1. Li este livro no Verão, e gostei de todo o desenrolar da história. Há partes que nos tocam e que nos comovem

    boas leituras

    http://bookslovers.blogs.sapo.pt/

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  2. Acho esse livro deprimente, os personagens além dos problemas sociais tem sérios problemas psicológicos.
    Minha relação é de amor/ ódio principalmente por Cristiano por saber de como a referência da família nos influência totalmente

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