quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A sonata de Kreutzer, Lev Tolstoi

A colecção BI - Biblioteca de editores independentes - presta um verdadeiro serviço público na arte de fazer chegar ao leitor grandes obras por preços bastante convidativos. Por que razão temos que pagar um balúrdio por um livro quando o formato de bolso serve perfeitamente o mesmo propósito?


Normalmente não escrevo sobre livros que li recentemente, mas este absorveu-me por completo. Fiquei convencido que Lev Tolstói é dos maiores escritores de sempre. Tenho vários livros dele, mas só li este e A morte de Ivan Ilitch. Há muito ainda para descobrir.

Nesta história acompanhamos o diálogo entre dois homens, travada numa viagem de comboio. O narrador relata a sua vida trágica. Triste ao ponto de ter morto a mulher por ciume.

Apetecia-me contar tudo, explicar-vos porque dá Tolstói  este título - uma sonata de Beethoven, escrita a pensar em Kreutzer - violinista francês que o maestro conheceu em Viena...

Mas não conto!


Deixo-vos apenas algumas citações que sublinhei. Geniais, por certo. Julgo que trariam horas e horas de discussão...

"Na vida, a preferência por uma pessoa única dura alguns anos, mas raramente, a maioria das vezes persiste apenas uns meses, ou semanas, ou dias, ou horas (...)"

"Todo o luxo da vida é exigido e fomentado pelas mulheres. Milhões de pessoas, gerações inteiras de escravos perecem nos trabalhos forçados das fábricas apenas em prol dos caprichos femininos. As mulheres, como rainhas, mantêm na escravidão do trabalho duríssimo noventa por cento da humanidade. E tudo porque foram humilhadas, privadas de direitos iguais aos homens. Então, vingam-se influenciando a nossa sensualidade, apanhando-nos nas suas redes. Sim, é tudo por causa disto. As mulheres fizeram de si próprias um instrumento tão forte de influenciar a sensualidade que o homem não pode comunicar tranquilamente com a mulher. Basta-lhe aproximar-se de uma mulher para ficar enfeitiçado e perder a cabeça."

"Pressupõe-se teoricamente que o amor é qualquer coisa ideal, elevada, mas na prática o amor é qualquer coisa repugnante, suína, até dá nojo e vergonha falar dele, lembrá-lo. Como é nojento e vergonhoso, deveríamos entendê-lo como tal. Mas não, faz-se de conta que o nojento e o vergonhoso é o belo e o elevado."

"Uma galinha não tem medo do que pode acontecer ao seu pintainho, não conhece as doenças que podem atingi-lo, não conhece os remédios que, imaginam as pessoas, podem salvar o pintainho das doenças e da morte. Então, para a galinha, os filhos não são uma tortura. Faz pelos seus pintainhos o que lhe é inerente e que é a alegria dela; os filhos, para ela, são a felicidade. E, quando um pintainho adoece, os cuidados dela são determinados: aquece-o, alimenta-o. E, ao fazê-lo, sabe que está a fazer tudo o que é necessário. Se o pintainho morre, a galinha não pergunta porque morreu nem para onde foi, cacareja um pouco, depois deixa o assunto de lado e continua a viver como antes. Tal não acontece com as nossas desgraçadas mulheres (...)"

3 comentários:

  1. Pois eu concordo. Leão Tolstoi é um nome imenso da literatura russa e universal, um pensador de excepção que muito influenciou diversos movimentos políticos e sociais, herdeiros do chamado "Tolstoismo", ou "Tolstoianismo". Em Portugal relevam dois nomes maiores, como herdeiros do Tolstoi defensor do vegetarianismo, do pacifismo e da vida simples: o conservador Jaime Magalhães de Lima e o anarquista António Gonçalves Correia.

    Aconselho, como obra seguinte, e antes de se lançar nos imensos "Guerra e Paz" e "Anna Karenina", uma obra pequena: "Hadji Murat".

    Um abraço

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  2. Não se põe em causa o facto de Leão Tolstoi ter sido um grande escritor, este conto é prova disso. A forma como está escrito, a capacidade de nos agarrar do princípio ao fim, de nos alhear da realidade que nos rodeia enquanto mergulhamos na sua leituira. É brilhante a argumentação de Podzdnischev, agora as conclusões a que chega...
    São retrato de uma mente fraca que cospe toda a espécie de culpas no que o rodeia para justificar a sua incapacidade em lidar com as adversidades da vida, a incapacidade de viver e de usufruir de paixões.
    Sexo é bom!
    Estar apaixonado é óptimo!
    Amar é ainda melhor.

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  3. “Voces [homens] só nos consideram [nós, mulheres] como objecto de sensualidade? Pois bem, será pela sensualidade que vos dominaremos.”

    De Tolstoi só tinha lido Anna Karénina (que tem aquela fabulosa frase introdutória!). Mais uma vez gostei muito e dá que pensar...
    Recomendo!

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